A história do vento
O vento é chamado de Tãpiya. Os olhos humanos não podem vê-lo, somente Pawa (o Sol) consegue vê-lo. O vento está soprando o tempo todo para esfriar a terra. Se o vento não existisse, a terra já teria pegado fogo. É também o vento que traz a chuva para molhar a terra. Pawa transformou sua filha e a deixou aqui para sobrar os Ashaninka, a mata e para não deixar que a terra esquentasse muito, conforme diz o mito. (Mito Ashaninka)
Por Manuela Carneiro da Cunha e Mauro Almeida
História de antigamente, quando Pawa deixou o vento. Estava com os filhos dele e um não parava; andava para um lugar, andava para outro, não parava. Pawa falou para um de seus filhos:
– Meu filho, vá chamar sua irmã e diga a ela que venha até aqui.
– Está bom, vou chamá-la.
– Procure-a até encontrá-la. Se ela não quiser vir, pegue-a. Ela vai sumir, mas você não deve abrir sua mão. Abra só quando ela chegar aqui.
– Ele foi e a encontrou.
– Minha irmã, eu vim porque Pawa está chamando.
– Por que ele está chamando?
– Não sei, ele disse pra você ir logo, sem demora.
– Eu estou indo, não vou demorar.
– Não, ele quer que eu te leve agora, e pegou-a.
Ela desapareceu, e ele seguiu com a mão fechada, conforme Pawa havia falado. Quando ele chegou perto de onde Pawa estava, ele pensou: “O que vou mostrar a Pawa?” ele só sentia como o vento que nós sentimos agora. Ele disse:
– Eu acho que ela já foi na frente.
Abriu a mão e ela ficou de pé na frente dele. “Vamos chegar onde está Pawa!” e pegou-a de novo e ela sumiu. Ele chegou onde estava Pawa.
– Você chegou, meu filho? “Cheguei,” disse o filho.
– Onde está sua irmã? “Eu trouxe, ela está aqui,” respondeu. Ele só sentia o vento soprar, mas não enxergava, então ela apareceu como gente.
– Você escutou que eu estava te chamando, minha filha?
– Sim, eu escutei, Pawa.
– Eu chamei você aqui para dizer que você agora vai ficar aqui embaixo, na terra, e vai soprar os mortos e vai seguir os mortais. Você vai ficar soprando os outros, suas irmãs, como a macaxeira, para não esquentar muito quando eu (o Sol) estiver olhando lá do alto (do céu).
– Está bom, Pawa. Eu fico.
– Agora, minha filha, você vai virar o vento! Ninguém vai te ver.
Aí o vento saiu soprando. Foi daí que apareceu o vento. O vento não deixa as árvores morrerem quando estão nascendo, fica soprando para a terra não esquentar e matar todos nós. (Mito contado por Arissêmio, 1995).
Manuela Carneiro da Cunha –Antropóloga. Excertos de artigo publicado no livro Enciclopédia da Floresta – O Alto Juruá: Práticas e Conhecimentos da Populações, Companhia das Letras, 2002.
Mauro Almeida – Antropólogo. Excertos de artigo publicado no livro Enciclopédia da Floresta – O Alto Juruá: Práticas e Conhecimentos da Populações, Companhia das Letras, 2002.