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A Política Indígena chegou

A Política Indígena chegou

Por Márcio Santilli

Uma novidade histórica do governo Lula é a política indígena, em vez de indigenista, que será implementada a partir de agora. Foi criado o Ministério dos Povos Indígenas, ao qual ficará subordinada a Funai, que passa a se chamar Fundação Nacional dos Povos Indígenas. Ambos, assim como a Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, serão dirigidos por lideranças indígenas. Sônia Guajajara, Joênia Wapichana e Weibe Tapeba, respectivamente, serão os seus dirigentes.

Esses nomes foram encaminhados ao presidente Lula pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), na forma de uma lista tríplice para a escolha d@ ministr@. Sônia coordenou a Apib nos últimos anos e foi eleita deputada federal por São Paulo; Joênia encerra o mandato como primeira deputada federal indígena, por Roraima, e Weibe é vereador em Caucaia (CE) há vários mandatos. Lula escolheu Sônia para acolher o PSOL no Ministério, mas aproveitou Joênia e Weibe em outras funções-chave.

O protagonismo indígena sobre as políticas públicas levará outros quadros oriundos do movimento para funções de governo, como o advogado Eloy Terena, que será secretário-executivo do ministério dos Povos Indígenas.

Ocorre, também, intensa movimentação nas comunidades e nas organizações indígenas locais para apresentar nomes para as coordenações regionais da Funai e da Sesai, contra as habituais indicações de partidos, reduzindo a influência de interesses de terceiros sobre os territórios indígenas e os seus recursos naturais.

O protagonismo político local, por sua vez, deve fortalecer a participação indígena nas próximas eleições municipais.

Em 1º de fevereiro, tomará posse o novo Congresso Nacional, onde atuará, além de Sônia Guajajara, que vai se licenciar do mandato para assumir o MPI, a deputada federal Célia Xakriabá, eleita por Minas Gerais, e que deverá coordenar a Frente Parlamentar dos Povos Indígenas, substituindo Joênia. E outr@s deputad@s e senador@s que também se identificam como indígenas, como Juliana Cardoso, do PT de São Paulo, e Silvia Waiãpi, do PL do Amapá. A ocupação de espaços políticos não se dá só a partir de partidos de esquerda, mas a forte simbologia política indígena também vem sendo capturada por forças de direita.

NADA SERÁ COMO ANTES

O protagonismo político indígena é crescente desde o final da ditadura militar, mas se fortaleceu de forma inédita no enfrentamento aos retrocessos promovidos pelo governo anterior. O Acampamento Terra Livre, realizado anualmente no mês de abril em Brasília, reuniu mais de seis mil representantes indígenas de todo o Brasil em sua última edição. A Apib foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como competente para ingressar com Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADINs). A expressiva votação alcançada por candidatos indígenas nas capitais é uma evidência do acolhimento desse protagonismo indígena por parcelas crescentes da sociedade.

A nomeação de indígenas para conduzir as políticas do seu interesse decorre da generosidade do presidente Lula, e também decorre da sua percepção de que o movimento indígena foi capaz de se fortalecer, mesmo sob as mais adversas condições políticas. São conquistas históricas, não apenas transitórias. Os interesses incidentes nos territórios e demais direitos indígenas terão que ser tratados diretamente, e não através de prepostos ou supostos tutores.

Não serão pequenas as dificuldades, mas essa nova geração de dirigentes indígenas está pronta para enfrentá-las. Ela não poderá subestimar a força objetiva dos interesses que serão contrariados, estará sujeita às vicissitudes próprias da atuação partidária e administrativa, mas aprenderá muito mais ainda sobre a própria natureza da política, com os seus prós e contras

Aqui não vai nenhum desprezo pelo indigenismo sério, historicamente praticado por pessoas e instituições que foram e continuam sendo fundamentais para a resistência dos povos indígenas à sanha colonial. Muitos sacrificaram as suas vidas nesse processo, e Bruno Pereira foi apenas o mais recente. Mas o momento, agora, é o da política indígena, e todos nós devemos nos orgulhar pelo privilégio de partilharmos esse novo tempo.

Márcio Santilli – Filósofo, sócio fundador do Instituto Socioambiental (ISA). Matéria publicada originalmente em midianinja.org. Imagem de Capa: Conexão Planeta

 
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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

 

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