Almir Sater: “Grandes lavouras estão chegando perto do Pantanal”
Nas redes sociais, cantor se une a movimento que busca proteger o bioma da soja. Manifestação ocorre após arquivamento de projeto que queria proibir avanço de monoculturas no Pantanal.
Por Michel Esquer/ O Eco
Intérprete do misterioso peão Xeréu Trindade, o “Cramulhão”, na primeira versão da novela Pantanal, e do sábio chalaneiro Eugênio, que levava turistas para conhecer o bioma, no remake da produção, o cantor Almir Sater utilizou as redes sociais para denunciar o avanço da agricultura sobre o Pantanal. A declaração do artista sul-mato-grossense, que levou a música sertaneja do bioma às telas do País, se soma à campanha que quer proteger a planície pantaneira do avanço de monoculturas, como a soja.
“Isso é realmente muito preocupante. Eu não sou contra a soja, nem grandes lavouras, mas não aqui no Pantanal. Eu sou um produtor rural também”, declarou Sater nesta quarta-feira (20). O cantor disse que recebeu neste mês a visita do governador de Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel (PSDB-MS), na região do Pantanal do Rio Negro, onde expôs o temor.
“Levamos até ele a preocupação em relação à fragilidade do nosso bioma, vendo que as grandes lavouras estão chegando perto do Pantanal, algumas já estão dentro do Pantanal, lavoura de soja no Pantanal”, acrescentou.
O músico disse que esteve recentemente em Miranda, uma das microrregiões do Pantanal, onde foi informado que técnicos teriam constatado a presença de “veneno” na água. “Se tem na água, tem no peixe, se tem no peixe, tem na gente”, declarou.
O Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul) esteve no rio Miranda em fevereiro deste ano, após o registro da morte de peixes no curso d’água. Como mostramos, uma perícia elaborada pelo órgão indicaria se o fenômeno era natural ou provocado por agrotóxicos. Esse documento não foi tornado público, e nem sabe-se se foi concluído, mesmo após solicitação de informação ao Imasul e à ouvidoria do estado.
“Eu peço a sensibilidade das nossas autoridades, a sensibilidade da nossa população: nos ajudem a defender esse Patrimônio da Humanidade, para que no futuro o Pantanal continue cada vez melhor”, concluiu o cantor.
Projeto arquivado
No mês passado, um projeto de lei (PL) quis proibir a expansão e a abertura de novas áreas para monocultura, sobretudo de soja, no Pantanal sul-mato-grossense. Protocolado na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (ALMS) pelo deputado estadual Pedro Kemp (PT-MS), a matéria foi arquivada neste mês após parecer contrário da Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR).
“O projeto em análise apresenta restrição indevida na propriedade privada, ao impor limitações que extrapolam as normas gerais já fixadas pela legislação federal”, disse o documento. “Desse modo, conclui-se que o Projeto de Lei apresentado apresenta vício de inconstitucionalidade material, o que impede sua regular tramitação”, completou o parecer da comissão, composta majoritariamente por parlamentares que integram a Frente Parlamentar em Defesa do Agronegócio.
O arquivamento da matéria provocou revolta em setores da sociedade civil, que nesta terça-feira (18) realizaram uma manifestação na Casa de Leis do estado. Participaram do ato ambientalistas, professores e pesquisadores, como noticiou a mídia local, além do Instituto SOS Pantanal, que em março tinha dito que o PL era importante para garantir a proteção e o desenvolvimento sustentável do bioma.
Monocultura no Pantanal
No Pantanal, o avanço das lavouras temporárias saltou de 4,1 mil hectares (ha) em 1985 para 17,3 mil ha em 2021, um número quatro vezes maior. Os números são do levantamento de Uso e Cobertura do MapBiomas. Desse total, 605 ha são de soja identificados visualmente em duas regiões ao leste do bioma, conforme informou a equipe da rede colaborativa que monitora o Pantanal.
Se monoculturas também fossem proibidas na porção sul-mato-grossense do Pantanal, o bioma como um todo teria o plantio de soja proibido. Isso porque em Mato Grosso, o plantio de culturas de larga escala, como a cana e soja, já está proibido conforme determina a Lei nº 8.830/2008 – também conhecida como a Lei do Pantanal do estado.
Michel Esquer- Jornalista. Fonte: O Eco. Foto: Colheita de grãos em produção rural- Charles Echer/Pixabay. Este artigo não representa a opinião da Revista e é de responsabilidade do autor.
Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.
Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.
Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.
Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.
Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.
Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.
Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.
Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.
Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.
Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.
Zezé Weiss
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