Biodiversidade brasileira é desvendada por ferramentas genéticas

Ferramentas genéticas lançam luz sobre a biodiversidade brasileira

Por Tássia Biazon

Estudos com vermes, micos-leões, peixes e outros organismos podem ser beneficiados com aplicações genômicas

20180910 biodiversidade Genomica mico leao preto
O mico-leão é um dos alvos de estudos em genômica que podem ajudar na sua conservação. Há quatro espécies deste animal encontradas na brasileira, entre elas o mico-leão-preto desta foto – todas estão na Lista Vermelha da União Internacional para Conservação da (IUCN) – Foto: Alan Hill – Flickr via Wikimedia Commons / CC BY-SA 2.0

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Em constante evolução, a genética, cada vez mais, permite aos desvendarem o passado, conhecerem o presente e preverem o futuro de uma espécie. E se antes os estudos eram restritos a poucos organismos, hoje eles se estendem para muitas formas de . Um dos exemplos é a genética aplicada aos pequenos animais marinhos.

No Instituto de Biociências (IB) da USP, o Laboratório de Diversidade Genômica sedia pesquisas de genômica populacional de organismos como os vermes nemertinos, os gastrópodes (lesmas e caramujos) e os poliquetas (vermes aquáticos). Um dos objetivos é entender se os padrões de conectividade entre as populações podem ser descritos utilizando como base modelos de circulação oceânica. “Também estamos interessados em entender processos de adaptação local nessas espécies”, relata Sónia Andrade, coordenadora do Laboratório.

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Nemertino do gênero Evelineus – Foto: Cecili Barrozo Mendes

 

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Nereis succinea na forma epítoca – Foto: Hans Hillewaert via Wikimedia Commons / CC BY-SA 4.0

Segundo a professora, até o momento não há conhecimento de trabalho semelhante em populações que habitam o costão rochoso no Brasil. A identificação de regiões gênicas com diferentes perfis de expressão e sua função, seja no , comportamento de acasalamento, resposta a estresse, entre outros aspectos, será fundamental a curto prazo para entender quais mecanismos evolutivos moldam a distribuição da variabilidade nessas espécies. “A médio e longo prazo é essencial compreender como essas populações respondem às alterações ambientais, tais como o , para auxiliar na definição de estratégias de conservação de ”, conta.

Para desenvolver esse tipo de trabalho, as ferramentas ômicas entram em destaque. “Com as novas ferramentas analíticas e técnicas de sequenciamento, há possibilidade de fazer uma montagem ‘de novo’ do genoma/transcriptoma de diferentes organismos”, explica Sónia, referindo-se em especial ao sequenciamento de nova geração (NGS).

Segundo a pesquisadora, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) tem feito um grande investimento em parques de equipamentos do tipo, como o Centro de Genômica Funcional, sediado na USP em Piracicaba.

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Bancada – Fonte: LabBMC

Outro exemplo de aplicação da genômica se dá no Laboratório de Genética de Organismos Aquáticos e Aquicultura, coordenado pelo professor Alexandre Hilsdorf, da Universidade de Mogi das Cruzes. “Nosso grupo trabalha com marcadores moleculares aplicados à conservação e uso sustentável de peixes e outros organismos aquáticos de interesse para pesca e aquicultura, com o objetivo de caracterizar recursos genéticos tanto de populações selvagens quanto de cativeiro, de maneira a conhecer e preservar a variabilidade genética presente na natureza. Por outro lado, o uso dessas metodologias para o melhoramento genético de espécies impacta positivamente no aumento da produtividade de peixes em cativeiro, conservando populações selvagens pela diminuição da sua pesca”, pontua ele.

O pesquisador destaca ainda a colaboração com o Centro de Genômica Funcional, da Superior de Agricultura (Esalq) da USP, na produção de ciência de qualidade e publicação de artigos. “O rápido sequenciamento de genomas integrais, bem como o desenvolvimento de marcadores moleculares, permitem a rápida aplicação do conhecimento do genoma em programas de melhoramento genético”, pondera.Outro exemplo de aplicação da genômica se dá no Laboratório de Genética de Organismos Aquáticos e Aquicultura, coordenado pelo professor Alexandre Hilsdorf, da Universidade de Mogi das Cruzes. “Nosso grupo trabalha com marcadores moleculares aplicados à conservação e uso sustentável de peixes e outros organismos aquáticos de interesse para pesca e aquicultura, com o objetivo de caracterizar recursos genéticos tanto de populações selvagens quanto de cativeiro, de maneira a conhecer e preservar a variabilidade genética presente na natureza. Por outro lado, o uso dessas metodologias para o melhoramento genético de espécies impacta positivamente no aumento da produtividade de peixes em cativeiro, conservando populações selvagens pela diminuição da sua pesca”, pontua ele.

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Eletroforese – Fonte: LabBMC

Mico-leão

Outro grupo de pesquisa que também se dedica ao estudo de populações animais exploradas e/ou ameaçadas é do Laboratório de Biodiversidade Molecular e Conservação (LabBMC) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), coordenado pelos professores Galetti Junior e Patrícia de Freitas. O LabBMC sedia o Projeto Genoma do Mico-Leão-Preto (Black Lion Tamarin Genome Project, em inglês), que conta com vários colaboradores do Brasil e do exterior a fim de caracterizar o genoma completo do mico-leão-preto.

Há quatro espécies de mico-leão, que pertencem ao gênero Leontopithecus: mico-leão-dourado (L. rosalia), mico-leão-preto (L. chrysopygus), mico-leão-da-cara-dourada (L. chrysomelas) e mico-leão-da-cara-preta (L. caissara). Elas são encontradas na Mata Atlântica dos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia e Paraná, respectivamente, mas todas estão na Lista Vermelha da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em Inglês), sendo a destruição da Mata Atlântica uma das principais causas de ameaça a essas espécies.

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Mico-leão-preto – Foto: Miguelrangeljr via Wikimedia Commons / CC BY-SA 4.0

“A partir de dados genômicos podemos estudar a relação entre espécies, identificar híbridos e a biodiversidade oculta. Recentemente sequenciamos o genoma mitocondrial [herdado apenas da mãe] completo do mico-leão-preto, espécie símbolo do Estado de São Paulo, com a colaboração do Centro de Genômica Funcional da Esalq”, conta Patrícia. “Uma ampla análise foi realizada para 124 espécies que permitiu conhecer melhor as relações genéticas entre primatas do Novo Mundo, incluindo dois micos-leões. A identificação precisa de uma espécie é fundamental para planos de manejo conservacionistas e para auxiliar nas ”, enfatiza.

O LabBMC também realiza trabalhos de análise forense com a Polícia Ambiental do Estado de São Paulo e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), possibilitando a identificação de espécies provenientes de tráfico e caça ilegal de animais silvestres. “Muitas vezes recebemos amostras de filés processados e até mesmo de linguiça. Extraímos o DNA dessas amostras, sequenciamos genes espécie-específicos e indicamos a qual espécie silvestre pertence cada amostra”, finaliza Patrícia.

ANOTE AÍ

Fonte: Jornal da USP

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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