O Bolsa Família e a dança da cidadania enfraquecida

O Bolsa Família, a Quadrilha e o Bom Governante

Por Leticia Bartholo 

Cena 1 – Maio de 2016: Pré-golpe. “Dilma anuncia aumento do Bolsa Família em 9%.” Em consequência do cenário político turbulento, a presidenta saiu sem conceder esse aumento.

Cena 2 –  Junho de 2016: Pós-golpe. “Temer reajusta o Bolsa Família em 12%, aumento maior que o anunciado por Dilma.” O aumento foi concedido.

Cena 3 –  Maio de 2017: “Governo anuncia reajuste de cerca de 4% no Bolsa Família.”

Cena 4 –  Junho de 2017: “Governo cancela reajuste do Bolsa Família por falta de dinheiro.”

Cena 5 – Julho de 2017: “Bolsa Família sofre o maior corte da história.” No período, ainda que houvesse famílias na fila para entrar no Programa, o Governo optou por não lhes incluir e culpou o governo anterior. O número de famílias atendidas ficou cerca de 1 milhão e 300 mil abaixo do possível.

Cena 6 – Setembro de 2017: Governo apresenta de Lei Orçamentária para 2018. Como está no documento, o orçamento do Bolsa Família somente será capaz de atender 12 milhões de famílias – e sem reajuste. Implica um corte de praticamente 2 milhões de famílias, em relação à meta, justamente num contexto de aumento de .

Fim do ato. Fecham-se as cortinas. Nos bastidores, governantes seguem decidindo discricionariamente sobre critérios, valores e períodos de reajuste do Bolsa Família. Na plateia, 54 milhões de pessoas pobres dançam a quadrilha da subcidadania:

– Olha o aumento!!!

– ÊÊÊ!!!

– É mentira!!!

– Aaaaaahhhhhhhh…

– Olha o benefício novo no mês que vem!!!

-ÊEEEEE!

-É mentira!!!

– Ahhhhh…

Essa dança certamente fragiliza com mais perversidade a dos pobres, porque lhes subtrai a sensação de direito e a em relação à participação no Programa. Mas em realidade enfraquece a todos, porque nos diminui a capacidade de enxergá-lo como politica social tecnicamente exitosa.

A CLT foi construção de Getúlio, mas não é dele. O Bolsa Família foi construção de , mas não é dele. é conquista de uma sociedade e assim deve ser vista.

Sendo bem simples, como me cabe aqui: enquanto não estiverem definidos por Lei, ou quiçá estabelecidos constitucionalmente, qual será o princípio usado para definir o número de famílias atendidas pelo Bolsa Família e quais serão os critérios e a periodicidade de revisão das linhas de pobreza e dos valores dos benefícios, o Programa será visto pela população brasileira não como uma construção da nação em termos de proteção social não contributiva, mas como uma benesse ofertada com mais ou menos generosidade pelo governante de plantão.

E isso só é positivo para o governante de plantão, que fica com os louros de personalizar os ganhos do Programa. Mas, em contraposição,o mais generoso na distribuição dos aumentos no Programa não será exatamente um bom governante. O bom governante será aquele que, republicanamente e despindo-se de sua vaidade estratégica, fizer com que a manutenção do Programa independa de quem vier na próxima eleição. E tire o Bolsa Família da linha de tiro político-partidária.

Qualquer outra opção será só um novo passo para essa dancinha triste e ultrapassada. Só mais um refrão  na quadrilha indigna da cidadania retirada. Cantam os poderosos. Dançamos todos nós

ANOTE AÍ:

Texto: Leticia Bartholo – Ex-secretária nacional adjunta de renda de cidadania (2012 – 2016). Defensora do Bolsa Família.

: PXEIRA. Sociólogo e rabiscador. Não gosta de malas de dinheiro.


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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