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Busquemos a paz nas escolas!

Busquemos a paz nas escolas!

“Se queremos alcançar neste mundo a verdadeira paz e se temos de levar a cabo uma verdadeira guerra contra a guerra, teremos de começar pelas crianças; e não será necessário lutar se permitirmos que cresçam com a sua inocência natural; não teremos de transmitir resoluçõesinsubstanciais e infrutíferas, mas iremos do amor para o amor e da paz para a paz, até que finalmente todos os cantos do mundo fiquem cobertos por essa paz e por esse amor pelo qual, consciente ou inconscientemente, o mundo inteiro clama.” Mohandas Gandhi, em The Words of Gandhi.

Por Zezé Weiss

Foi-se o tempo em que, quando falávamos em paz, o que primeiro nos vinha à mente eram os conflitos internacionais com seu mundaréu de armas matando gente nas guerras do mundo.

Hoje, infelizmente, a violência abre outras frentes neste nosso combalido planeta e, especialmente no Brasil, a ausência de paz ganha terreno e nos assombra em formas diversas, todas elas exigindo ações imediatas, sobretudo do Estado, cujas instituições estiveram à deriva ou foram vítimas de mau uso nos últimos anos.

Os ataques às escolas constituem, por certo, uma das faces mais apavorantes e inaceitáveis da violência. Articulados e propagados nas redes sociais, hoje terra sem lei, crescentes ataques vitimam crianças inocentes e trabalhadores e trabalhadoras da Educação, ferindo, matando e gerando pânico justamente no ambiente escolar, que é onde a cidadania faz morada, numa construção contínua e duradoura.

Pode-se afirmar, sem dúvida, que a Educação contribui sobremaneira para que tenhamos um país mais consciente, menos desigual, menos injusto e mais solidário, onde a violência não se crie e não prolifere. Daí ser imprescindível a promoção da paz nas escolas, para que a violência comece a ser debelada a partir da raiz.

A questão, entretanto, é muito mais ampla. O Brasil de nossos dias enfrenta uma terrível escalada de casos de violência letal, sobretudo contra as pessoas pretas, indígenas, trabalhadores e trabalhadoras com pequenas propriedades rurais, assentados da reforma agrária ou sem-terra.

Também morrem ambientalistas, jornalistas, professores, professoras, jovens, adolescentes e crianças, agora com mais frequência assassinadas por “balas perdidas” ou massacres nas comunidades urbanas.

O risco de assassinato para uma mulher negra é 1,7 vezes maior e para uma jovem preta é 2,19 vezes maior do que para uma branca. A possibilidade de um jovem negro ser assassinado é 2,70 vezes maior do que a de um jovem branco. Ou seja, as pessoas jovens e negras são as mais vulneráveis. Os dados são do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, edição 2022.  

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) registra um acirramento dos conflitos agrários nos quatro anos do governo do Coiso (2019–2022). Em 2022, morreram 47 pessoas, um aumento de 30% em comparação com 2021, que teve 35 mortes, 18 delas (38%) de pessoas indígenas.

A principal causa das mortes foi a invasão dos territórios.  Durante a gestão do Coiso foram 1.185 invasões, 1.107 delas (quase 70%), na Amazônia Legal. Morre-se, sobretudo, pela violência da pistolagem, a serviço de fazendeiros (25%), grileiros (19%) e garimpeiros (15%). Isso sem contar os casos de trabalho escravo, que se multiplicam em indústrias e fazendas por todo o país.

Os casos de violência ficam cada vez mais próximos de nós: abusos da polícia, gente armada no trânsito, desmandos de traficantes; racismo, homofobia, misoginia, agressão contra mulheres, feminicídio; abuso sexual contra crianças, desrespeito contra pessoas com deficiência, maus tratos contra pessoas idosas; intolerância religiosa, sectarismo político; os agrotóxicos, a destruição das águas, as pessoas sem ter onde morar, vivendo nas ruas; e o penoso acesso à educação, à saúde e ao amparo legal são realidades constantes no decorrer do nosso cotidiano.

VIOLÊNCIA NAS ESCOLAS 

É doloroso ver o aumento de violência em nossas instituições de ensino. Desde 2011, 52 pessoas foram assassinadas em nossas escolas. Entre setembro de 2022 e abril de 2023, foram cinco ataques com mortes nas escolas brasileiras.

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil.

Em 5 de abril, um ataque ocorrido na Creche Bom Pastor, na cidade de Blumenau, no Vale do Itajaí, no estado de Santa Catarina, deixou quatro crianças mortas e pelo menos cinco feridas. Logo depois da tragédia, um homem de 25 anos se entregou à polícia, confessou o crime e foi preso. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Menos de um mês antes, em 27 de março, um adolescente de 13 anos invadiu e esfaqueou quatro professores e dois alunos na Escola Estadual Thomazia Montoro, na Vila Sonia, localizada na Zona Sul de São Paulo. Uma das professoras, Elisabeth Tenreiro, de 71 anos, não resistiu aos ferimentos.

Em 25/11/ 2022, na cidade de Aracruz, no Espírito Santo, um adolescente de 16 anos invadiu uma escola pública estadual e acertou duas professoras com tiros de pistola. Em seguida, o criminoso assassinou uma aluna em uma escola privada. Uma das professoras feridas faleceu dias depois.

Em 5/10/2022, um adolescente de 15 anos assassinou a tiros um estudante e deixou outros dois feridos em uma escola pública de Sobral, no Ceará. 

Em 26/09/2022, depois de anunciar o atentado nas redes sociais, um adolescente de 15 anos assassinou com o revólver do pai uma aluna cadeirante na escola cívico-militar que ambos frequentavam, na cidade de Barreiras, na Bahia.

O massacre mais letal ocorreu em 5 de abril de 2017, na cidade de Janaúba, Minas Gerais, quando o vigia de uma creche, de 50 anos, jogou gasolina e em seguida ateou fogo no corpo de várias crianças e no próprio corpo. Dez crianças e três pessoas adultas morreram em decorrência das queimaduras. Com 100% do corpo queimado, o próprio assassino morreu horas depois.

Foto: Divulgação

O segundo ataque mais letal ocorreu na Escola Municipal Tasso da Silveira, no bairro do Realengo, no Rio de Janeiro. Um ex-aluno da escola, de 23 anos, assassinou 12 alunos, com idades entre 13 e 16 anos, e deixou outras 12 pessoas feridas. Em seguida, o assassino se matou, com um tiro na cabeça.

ALVOS DA VIOLÊNCIA

Cada vez mais, nossa comunidade escolar – professores, professoras, funcionários, funcionárias e estudantes – vem sendo vítima de assédio moral, bullying, agressão verbal, agressão física, discriminação, furto, roubo, assalto à mão armada e assassinato.

Conforme levantamento da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil está entre os países com os mais altos índices no ranking global das agressões contra professores e professoras. Semanalmente, 10% das escolas brasileiras registram episódios de intimidação contra educadores e educadoras. A média internacional é de 3%.

Alunos e alunas também são vítimas de agressões verbais, psicológicas e físicas. Segundo a Secretaria da Educação de São Paulo, após a volta das aulas presenciais, somente nos dois primeiros meses de 2022 foram registrados 4.021 casos de agressões físicas contra estudantes nas unidades estaduais de ensino. Um aumento de 48,5% em comparação com o mesmo período de 2019, último ano de aulas presenciais antes da pandemia da Covid-19.

CAUSAS DA VIOLÊNCIA

“Essa violência nas escolas chegou no limite. A violência escolar sempre ocorreu, mas de uma maneira não sistêmica. O que a gente viu nesses últimos ataques foi uma violência estimulada, orquestrada, planejada, organizada, fruto da violência da própria sociedade”, declarou a Senadora Teresa Leitão (PT-PE), em entrevista exclusiva, concedida à Revista Xapuri, para esta matéria.

Para o Senador Paulo Paim (PT-RS), a desigualdade social, a falta de oportunidades e problemas psicológicos, sociais e econômicos são possíveis causas da violência.

Em entrevistas recentes para a mídia nacional, Marlova Noleto, diretora da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) no Brasil, vem afirmando que “as escolas estão mais violentas porque, nos últimos anos, o Brasil passou a permitir o aumento da população armada, o estímulo da violência e o ambiente de ódio nas redes sociais, sem controle, sem regulação e sem qualquer filtro”.

Desde o ano 2000, no marco do Ano Internacional para uma Cultura de Paz, a Representação da UNESCO no Brasil lançou o Programa Abrindo Espaços: educação e cultura para a paz, uma iniciativa que abre escolas públicas nos fins de semana para oferecer a jovens e suas comunidades atividades de esporte, arte, cultura, lazer e formação inicial para o trabalho.

O Programa Abrindo Espaços tem como base a cultura de paz e não violência, bem como a promoção da cidadania de adolescentes, jovens e da comunidade escolar, importante ação de inclusão social que incentiva a melhoria da qualidade das escolas, a participação cultural, a conscientização sobre a prevenção de infecções sexualmente transmissíveis (IST) e aids, assim como o cuidado com o meio ambiente.

É com base nessa trajetória que Marlova se posiciona: “Não podemos esquecer que o Brasil fez uma importante campanha pelo desarmamento, [a partir do Estatuto do Desarmamento, em 2003]. E, depois de décadas, de repente, o mesmo país volta com estímulo ao acesso às armas [nos últimos quatro anos]. São mensagens desconexas para a população.

A obrigação é entender, ter os dados, as estatísticas, conhecer o diagnóstico para aprofundar programas e projetos que possam dialogar com a realidade de maneira integral e integrada para prevenir todas as formas de violência nas escolas. Esse diálogo é amplo e não se restringe só à comunidade educacional”.

ARMAMENTO DAS ESCOLAS

Sobre o armamento das escolas, a Senadora Teresa Leitão se posiciona contra e explica porque: “Sou radicalmente contra o armamento das escolas. O território sagrado de cada escola precisa ser protegido. Mas já está comprovado que colocar armas dentro das escolas não as protege, ao contrário, fomenta mais violência.

Existe um setor mais conservador que está levantando a possibilidade do uso de catracas, de policial armado dentro da escola, do reconhecimento facial e detector de metais, estratégia importada de onde esse tipo de violência começou, dos Estados Unidos.

O que foi que os Estados Unidos fizeram, investiram nisso. Qual foi o resultado? Nenhum, nenhum, nenhum. Porque não é assim que se trata de uma questão de cunho tão complexo. É investir dinheiro em coisas que não dão resultado e trazer mais violência para o âmbito da escola.

Como é que que cada estudante vai se sentir? É como o presidente Lula diz: escola não é prisão e nem é quartel pra você colocar policial dentro dela. Quer botar um policial, faça como o governo está fazendo, invista nas rondas escolares, para proteger o prédio, o acesso, mas para por aí, porque polícia dentro da escola não vai resolver”.

Marlova Noleto argumenta ser natural que “quando ocorrem ataques, a primeira reação seja: vamos armar as escolas. Mas já aprendemos com outros países que colocar vigilância armada não resolve. Eu sempre pergunto: e vão fazer o quê com o refeitório? Vamos tirar todas as facas, os vidros, as cadeiras? Porque qualquer coisa pode virar uma arma. Claro que precisamos ter batalhões escolares, que atuem no entorno da escola, aliados com inteligência policial. Fora isso, o que temos é que fazer é investir na prevenção”.

Para o presidente Lula, “A gente não tem que satisfazer os terroristas que estão fazendo ameaças. A gente tem que dar as aulas, mas tem gente que acha que a solução é levantar os muros das creches. Nós precisamos utilizar a nossa inteligência para tentar recuperar neste país a compreensão de que ser bom é melhor do que ser ruim”.

Em vez das armas, especialistas propõem a implementação de políticas públicas de paz e inclusão social e a promoção de valores e comportamentos que conduzam ao diálogo, à solidariedade, à tolerância, à não violência e à amizade entre as pessoas.

No Distrito Federal, o Projeto Vozes da Paz, que faz parte do Programa Justiça Comunitária do TJDFT, desenvolve métodos de solução de conflitos e prevenção de violências nas escolas por meio da participação democrática e horizontal em toda a comunidade escolar.

A Senadora Teresa informa que, nos esforços de busca pela paz nas escolas, “como parte da Comissão Interministerial, sob a Coordenação do Ministério da Educação, o Ministério da Justiça trata do que tem que ver com fazer justiça, ou seja, se é crime tem que ser punido, mas também investe na execução de políticas públicas de segurança e bem-estar social.  

Por outro lado, o Ministério dos Direitos Humanos, por tratar muito do direito à vida, do direito à Educação, e nós da Educação, estamos trabalhando com a abordagem psicossocial, tanto de professores como de estudantes, pois o adoecimento mental hoje mais do que antes da pandemia, é um fato real.

Ao mesmo tempo, queremos cada vez mais abrir a escola para as famílias, para que elas também tenham aquele senso de pertencimento com a escola, para que elas vejam que a escola, além de segura, é um espaço capaz de oferecer um ambiente de acolhimento e proteção pra seus filhos e filhas”.  

PL DAS FAKE NEWS

Para a senadora Teresa Leitão, a aprovação do Projeto de Lei das Fake News (PL 2630/2020) em tramitação no Congresso Nacional, é fundamental para coibir a violência na sociedade e nas escolas, “porque muita coisa passa pela proliferação dos discursos de ódio nas redes sociais, sem nenhum filtro”.

Foto:Arnaldo Sete/MZ Conteúdo.

Os recentes ataques em escolas e a disseminação de ameaças, que levaram pânico às famílias, reforçam a necessidade de investir na construção de uma cultura de paz no ambiente escolar, o que passa pela regulamentação das plataformas digitais, segundo Marlova Noleto.  

“O Brasil passou a permitir o estímulo à violência e um ambiente de ódio nas redes sociais. O projeto PL 2630, das Fake News, tem tudo a ver com esse desafio. Porque a desinformação permite o crescimento de um ambiente de violência, e nos últimos anos vimos uma verdadeira infodemia”, afirma Marlova.

O PL das Fake News não é, portanto, segundo a Senadora Teresa, um projeto de censura. “Pelo contrário, é um projeto de liberdade para todos e para todas. Esperamos que ele seja aprovado e tenha sua incidência na paz que buscamos para as escolas do nosso país”, conclui a Senadora.

PLANO DE COMBATE À VIOLÊNCIA NAS ESCOLAS

A onda de recentes ataques às escolas, que nos apavorou nos últimos meses, levou o governo Lula a lançar uma campanha nacional – “Tamo junto pela paz nas escolas” – para unir esforços do governo federal, dos governos estaduais, do Governo do Distrito Federal (GDF) e dos governos municipais na promoção de um ambiente de paz para toda a comunidade escolar brasileira.

No último dia 18 de abril, por iniciativa do Ministério da Educação (MEC),

o governo criou um grupo interministerial para evitar novos ataques nas instituições públicas e privadas de ensino no país. De acordo com o ministro da Educação, Camilo Santana, o grupo trabalha para elaborar, com a participação dos municípios, dos estados e do Distrito Federal, um programa de combate à violência nas escolas.

A ação pretende, segundo o MEC, estimular a união de toda a sociedade com o envolvimento dos governos estaduais e municipais. Entre as ações integradas, destacam-se a Operação Escola Segura, o Programa Dinheiro Direto na Escola e a destinação de recursos para o combate à violência. A operação atua com ações preventivas e repressivas 24 horas por dia e não tem data para acabar.

No dia 19 de abril, o MEC lançou uma cartilha de recomendações para orientar toda a comunidade escolar, incluindo estudantes, profissionais da educação e familiares sobre a proteção e a segurança no ambiente escolar.

Para a deputada Ana Paula Lima (PT-SC), Secretária da Criança, do Adolescente e da Juventude da Câmara dos Deputados e vice-líder do governo Lula na Câmara, além de todo o apoio à segurança pública nas escolas, as ações afirmativas do governo abrem caminho “para que as todas as esferas da sociedade, incluindo o governo, a comunidade escolar e as famílias, trabalhem juntas para combater a violência nas escolas e creches brasileiras”.

Em audiência pública conjunta, promovida pelas Comissões de Constituição e Justiça (CCJ), de Educação (CE), de Segurança Pública (CSP) e de Direitos Humanos (CDH), realizada no dia 2 de maio, especialistas em educação frisaram que o combate à violência nas escolas é um problema complexo, que exige ação integrada entre Estado e sociedade e vai muito além de medidas de segurança.

Para tornar os ambientes mais seguros, o ministro Camilo informa que apoiará a saúde mental nas escolas, com incentivo à assistência psicossocial a estudantes e profissionais da educação. Camilo aposta também no controle sobre as ameaças a escolas nas plataformas digitais:

“Precisamos combater os crimes que estão sendo cometidos nas redes sociais, não só no Brasil, mas no mundo inteiro. Tem as redes chamadas de dark web, deep web, que estimulam os jovens para a violência, a morte e o crime”.

O que vemos, em contraponto com o que se viu nos últimos anos, são passos firmes e determinados na direção do enfrentamento da questão, na busca de soluções. É um bom começo, que nos permite antever dias melhores. Esperancemos, pois…

Zezé Weiss – Jornalista. Matéria construída a partir de entrevista com a Senadora Teresa Leitão, em 4 de maio último, e com base em dados coletados em: artigo “A Paz de Que o Mundo Precisa”, de Jaime Sautchuck, encantado em julho de 2021; Agência Senado; Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib); Comissão Pastoral da Terra (CPT); Folha de São Paulo; Anuário Nacional de Segurança Pública; e Unesco.  

Block

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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