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Castro Alves: O poeta da liberdade

Castro Alves: O poeta da liberdade

Castro Alves: O poeta da liberdade

Mês de março, dedicado à poesia e ao poeta Castro Alves, o patrono da cadeira 7 da Academia Brasileira de Letras, um homem que muito amou e foi amado, e entre seus amores figurava como o maior de todos uma dama fugidia e indomável: a Liberdade!

Por Iêda Vilas-Bôas

De nome completo era Antônio Frederico de Castro Alves, entre a classe intelectual Poeta Castro Alves, entre os amigos, Castro, e na intimidade dos seus era Cecéu. Nasceu na Fazenda Cabaceiras, Distrito de Curralinho-BA (Hoje Castro Alves) em 14 de março de 1847.

Morreu precocemente, com apenas 24 anos de idade, vitimado pela tísica, em Salvador- BA, em 6 de julho de 1871. Desde 1947, centenário de seu nascimento, seus restos mortais repousam ao pé de sua estátua na Praça Castro Alves em Salvador.

Era um rapaz de beleza marcante, de porte esbelto, charmosa palidez, grandes e vivos olhos negros, negra e farta cabeleira, herança de seu sangue espanhol do lado materno. De voz possante, saía-se muito bem nas impostações vocais, quer seja em um comício, onde não havia o apoio das tecnologias de hoje, quer a declamar versos nos ouvidos das inúmeras mulheres que lhe distraíram as paixões carnais ou telúricas.

Possuía uma educação primorosa e tinha facilidade tal de comunicação que envolvia qualquer um que o ouvisse. Aos homens causava admiração e inveja; das mulheres, arrebatava o coração. Era um D. Juan romântico e cuidadoso com as causas do coração, mas quando o assunto era a República e a Liberdade, era muito mais que um amante apaixonado.

À abolição da escravatura e à Liberdade dedicou todo seu talento e seus dias. E é nessa linha que se faz conhecido como o mais inspirado poeta da Geração Condoreira, o poeta defensor dos Escravos.

Castro Alves trazia em seu sangue a paixão, a amor e a sensibilidade. Vinha de uma família onde o amor passional tomava todos os sentidos. Foi criado ouvindo os gritos e lamentos da tia louca – Pórcia –  que, desobedecendo às regras de sua sociedade, fugiu com Leorcino, homem casado. Uma mácula para a família Castro, para o velho Coronel Castro, o Periquitão, seu avô, um soldado sertanejo e rude.

A honra foi lavada quando o pai encontrou a fugitiva nas brenhas do sertão e a obrigou a deixar o amante. Para tentar dissuadir o pai, a moça correu ao quarto e buscou seu filhinho, beirando os dois anos. Sem dó nem piedade, o velho toma da espada e parte a criança ao meio. Pórcia enlouquece para sempre. A partir de então, seus lamentos passaram a povoar o imaginário e um quarto do casarão da família. Essa foi uma marcante e triste história de amor apresentada precocemente ao menino Cecéu.

O grande Jorge Amado em seu ABC de Castro Alves ressalta o caráter combativo e apaixonado de Castro Alves: foi um artista que encarou a vida de frente, que não teve medo de se envolver nos problemas dos homens.  A vida foi, muitas vezes, cruel com o menino Cecéu: perdeu sua mãe com apenas 12 anos e seu irmão, Antônio José, cometeu suicídio poucos anos após a morte da mãe.

Do pai herdou o gosto pelas artes, pela leitura, música, poesia e pela declamação de versos. Foi em seu lar que, primeiramente, os versos do poeta despertaram. O doutor Antônio, seu pai, era um valoroso médico que se dedicou ao sanitarismo e morreu enfrentando a “bexiga” que assolou a Bahia naqueles doloridos anos de 1800 e poucos.

Em 1863, o poeta tenta ingressar na Faculdade de Direito do Recife, mas só obtém êxito no ano seguinte. Entretanto, foi em Recife, nesse clima propício à liberdade e ao amor que Castro Alves publicou seu primeiro poema contra a escravidão: A canção do africano. Foi também nesse decisivo ano de 1863 que se manifestou a tuberculose, doença que o vitimou, e que conheceu a atriz portuguesa Eugênia Câmara, sua segunda maior paixão.

Eugênia serviu-lhe de inspiração e a partir do ano de 1866 viveram momentos de intenso amor, mesmo tendo o poeta enfrentando opiniões e comentários acerca da moral de sua musa, que era dez anos mais velha que ele, tinha sido casada, era separada do marido e levava a pecha de ser amante de um rico português chamado Veríssimo Chaves. Nada ofuscou o amor do poeta e a esse amor entregou-se perdidamente.

Outro importante momento de sua vida foi a fundação, juntamente com Rui Barbosa e outros amigos, de uma sociedade abolicionista. Continuou seus estudos em São Paulo, mas não concluiu o curso. Escreveu versos apaixonantes e apaixonados, contudo sua obra se caracteriza por uma produção literária marcada pela defesa da abolição da escravatura e pela aspiração do ideal de proclamação da República. Nessa linha escreveu uma peça de teatro, o drama Gonzaga ou a Revolução de Minas, encenada pelo seu grande amor, nos palcos de Salvador e de São Paulo.

Em setembro de 1868 declamou publicamente Tragédia no mar – O Navio Negreiro, que ainda hoje repercute como clamor à liberdade. Nesse mesmo ano, Eugênia Câmara compreende que não pode competir com as paixões sociais de seu amado. Deixa-o. Extremamente apaixonado, o poeta se ressente desse rompimento e sua doença se agrava, com recorrentes crises de hemoptises.

Durante uma caçada se feriu no pé com um tiro e teve de passar, sem anestesia, pela amputação de seu pé esquerdo na altura do tornozelo.  A tuberculose se agrava ainda mais, e ele parte de volta para sua terra natal e suas raízes familiares em busca de consolo ao seu coração e de saúde física.

Sem melhoras, o poeta retorna mutilado, deprimido e muito debilitado ao casarão da família em Salvador. Entre um acesso e outro de tosse, o incansável abolicionista implorava ao Senhor: Dai-me, meu Deus, mais dois anos para escrever tudo o que tenho na cabeça! Não foi ouvido. No meio de uma tarde, nos braços da irmã, o Poeta dos Escravos parte rumo à infinidade. Calou-se para sempre a voz do gênio. Permanecem seus versos como arautos da Liberdade!

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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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