O Congresso está de volta, com uma agenda de arrepiar

O Congresso está de volta, com uma agenda de arrepiar

Por: Observatório do

Deputados retornam das férias trazendo na mala uma série de projetos contra o meio ambiente, os povos tradicionais e os direitos coletivos – e com um presidente disposto a dar o que eles quiserem em troca de votos

Nesta semana os deputados e senadores voltam a Brasília e o retoma suas atividades. Para o meio ambiente, melhor seria se eles permanecessem de férias: a agenda parlamentar de 2018 promete retrocessos socioambientais em série. Há uma dúzia de projetos em diferentes fases de tramitação que podem avançar neste ano, ameaçando áreas protegidas, povos indígenas, agricultores familiares e os .deputados

As pautas-bomba vão da tentativa de sustar a de terras indígenas até a proposta de “descriar” unidades de , passando por uma surreal liberação do plantio de cana na Amazônia, hoje proibido.

Essas proposições, em sua maior parte articuladas pela bancada ruralista, encontram terreno fértil para vingar em 2018, por dois motivos: primeiro, é ano eleitoral. Segundo, é um ano eleitoral de governo Temer, no qual o Poder Executivo é, ele próprio, oriundo da Câmara – e fará qualquer negócio em troca de votos dos ruralistas para aprovar projetos como a reforma da Previdência.

“Prevemos um semestre intenso no Congresso. As principais ameaças aos direitos socioambientais poderão avançar como moeda de troca por apoios eleitorais e pautas prioritárias para o governo”, disse Maurício Guetta, do ISA (Instituto Socioambiental).

“Nós vamos ter um balcão de negócios concentrado nos primeiros meses”, disse Marcio Astrini, coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace. Com as restrições que ocorrem a partir de junho na atuação do poder público, devido à lei eleitoral, o toma-lá-dá-cá ocorrerá no primeiro semestre. “Tudo o que os ruralistas não tiveram a oportunidade de negociar em quatro anos eles negociarão nestes quatro meses”, afirmou Astrini.

Na marca do pênalti, pronta para ser chutada a gol, está a pedra angular da proteção ambiental no : a Lei Geral de Licenciamento. Após mais de um ano e meio de negociação entre o Ministério do Meio Ambiente e ruralistas no Congresso e no Executivo, o licenciamento pode ser votado ainda em fevereiro no plenário da Câmara. O presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), declarou em três ocasiões durante o recesso parlamentar que “há acordo com os ambientalistas” e que o projeto será pautado.

O em discussão é um substitutivo relatado pelo deputado ruralista Mauro Pereira (MDB-RS), hoje em sua décima terceira versão. Embora tenha evoluído em relação ao projeto original de Pereira – chamado “Licenciamento Flex” –, que essencialmente destruía o licenciamento ambiental no país, ele ainda contém pontos críticos. O principal deles é a possibilidade de Estados e municípios decidirem sobre o rigor de cada licença, o que causaria aquilo que o ministro Sarney Filho (Meio Ambiente) chamou de “ ambiental entre os Estados”. O texto também impede a Funai e o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico) de vetar empreendimentos que afetem terras indígenas e sítios históricos e arqueológicos, e reduz o poder do Instituto Chico Mendes de fazer a mesma coisa no caso de empreendimentos que afetem unidades de conservação.

O licenciamento é pauta prioritária da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), já que ele isentará toda a atividade agropecuária extensiva da necessidade de licença ambiental. Ambientalistas temem que a bancada ruralista e deputados representando os interesses da indústria piorem o texto no plenário.

Também no alto da lista das preocupações dos ambientalistas está a própria . Está pronta para ser votada na Comissão Especial na Câmara o Projeto de lei de Proteção de Cultivares (827/2015), de autoria do deputado ruralista Dilceu Sperafico (PP-PA), que pode colocar nas mãos de grandes empresas o controle sobre o uso e a venda de sementes, mudas e plantas. Na prática, acaba com práticas tradicionais que evitam que o pequeno agricultor use fertilizantes sintéticos. O PL altera a lei que atualmente regulamenta a propriedade intelectual das cultivares (plantas que tiveram alguma modificação pela ação humana, como as híbridas, por exemplo).

As unidades de conservação estão sob ameaça em pelo menos seis projetos. Tramita na CFT (Comissão de Finanças e Tributação), por exemplo, um projeto do deputado Toninho Pinheiro (PP-MG) que prevê que áreas protegidas que não tenham seus ocupantes indenizados em cinco anos tenham sua criação anulada.  No Senado é analisado outro texto, de autoria do senador ruralista Flexa Ribeiro (PSDB-PA), que impede que qualquer unidade de conservação seja criada ou alterada sem anuência do governo do Estado no qual ela se situa. Falando em Flexa Ribeiro, também é dele o Projeto de Lei do Senado 626/2011, que está pronto para deliberação no plenário. A proposta permite o cultivo de cana na Amazônia – proibido desde 2009 – tendo como diretriz “o respeito à segurança alimentar e à nutrição adequada como direitos fundamentais do ser humano”.

Os índios evidentemente não saem nunca do radar dos ruralistas. Além da eterna PEC 215, que transfere ao Congresso a prerrogativa (hoje do Presidente da República) de demarcar terras indígenas, os ruralistas também desenterraram um projeto de lei de 2007 do deputado Homero Pereira (morto em 2013) para que terras indígenas sejam demarcadas apenas por projeto de lei. Dada a composição do Congresso, na prática isso impediria as demarcações. Na última segunda-feira (5), o blog Combate Racismo Ambiental divulgou uma nota informando que o PL teve relator designado neste mês na Comissão de Constituição e . Será o pepista gaúcho Jerônimo Goergen, o segundo deputado mais nocivo à agenda socioambiental na escala do Ruralômetro, ferramenta da Repórter Brasil para medir o grau de “febre” ruralista da Câmara.

Anote aí:

Fonte: OBSERVATÓRIO DO CLIMA

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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