Corpos de Dom e Bruno chegam a Brasília
Por Maristela Bernardo
Chegam hoje a Brasília os corpos de Bruno Pereira e Dom Phillips. Está impressa nesses corpos dilacerados boa parte da nossa tragédia. Esses corpos falam da guerra que hoje consome o país e da qual somos todos combatentes, mesmo que o silêncio trave nossos gritos e sigamos o dia-a-dia que nos é possível.
Mas uma guerra tem lados. Nada exige mais uma escolha radical do que uma guerra. Não há relativização possível.
O caso específico de Bruno Pereira é uma lição impressionantemente clara sobre essa guerra. Há poucos anos, esse indigenista, funcionário público no sentido mais nobre do termo, dirigia o setor da FUNAI dedicado à proteção dos índios isolados, os mais frágeis dos nossos povos originários. Bruno ousou ser coerente, dedicado, correto, competente e corajoso. Fez o que esperava dele, cumpriu o que o país, a Constituição, a ética e a defesa dos direitos humanos lhe atribuíram e sua escolha pessoal, profissional, espiritual acolheu e transformou em missão.
Mas acontece que Bruno era tudo isso no tempo errado, no maldito governo errado, na era de trevas que assola o país e transforma o mal, a vilania, a torpeza em critério de valor. Especialmente nas áreas às quais, ao assumir, bolsonaro fez a sua declaração de guerra particular: defesa do meio ambiente e proteção aos direitos indígenas. E como parte dessa declaração, reuniu seus exércitos: todos os delinquentes, predadores pequenos e grandes, bandidos empresariais e políticos dedicados a invadir sobretudo a Amazônia, objeto maior de sua ganância cega, burra, ignorante e truculenta. A Aliança do Mal chegou ao poder e partiu pra concretizar seus objetivos destrutivos sem nenhum pudor ou escrúpulo.
Então Bruno foi atropelado, por ser, juntamente com outros servidores da FUNAI, do Ibama, do ICMbio – também atingidos – um obstáculo à entrega da Amazônia a seus predadores.
Um dos episódios mais fortes para entender a guerra suja de bolsonaro foi a reação do governo à queima, solicitada por Bruno à Polícia Federal em 2019, de balsas de garimpeiros ilegais em área protegida. Tudo feito conforme a lei, para interromper uma atividade altamente danosa ao meio ambiente e à vida dos índios da região do Javari.
Por ter cumprido seu dever, Bruno foi exonerado e os garimpeiros ilegais, envenenadores de rios, ponta de lança do narcotráfico, do tráfico de ouro, do dinheiro de grandes contraventores que ficam à sombra, ganharam um aval de peso. O recado foi claro: destrua que o bolsonaro garante.
Do outro lado, Bruno contra-atacou com as armas que um bolsonarista jamais entenderá: licenciou-se da FUNAI para poder continuar a exercer seu dever de servidor público decente e dedicado, na proteção aos índios isolados e ao meio ambiente na região do Javari. Aliou-se à UNIVAJA, organização indígena, e a outros indigenistas e ambientalistas para tentar uma tarefa sobre-humana: proteger a Amazônia contra seus predadores, entre os quais o próprio Estado brasileiro, por omissão e ação na tarefa sórdida de tentar calar e manietar políticas públicas e seus operadores. Bolsonaro esqueceu que não dá pra controlar gente que presta. Parece que ele não atentou para o que aconteceu durante a ditadura que ele tanto preza: milhares foram à luta, ainda que ao custo da própria vida e a maldita ditadura caiu. Como vc vai cair agora, Bolsonaro!
Ao contrário do que pensam os imbecis, Bruno não morreu. Nem morreram todos os que tiveram o mesmo destino físico. Eles são mais fortes que vocês, fascistas de merda! E a Amazônia sobreviverá. Com tudo o que ela e seus defensores significam.
Portanto, não há como fugir nem tergiversar, nem relativizar: escolham seu lado. E, mais uma vez, vamos à luta!
https://xapuri.info/onu-e-outras-organizacoes-cobram-protecao-da-amazonia-contra-o-crime-2/