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Crescem acusações contra Israel por genocídio contra palestinos

Crescem acusações contra Israel por genocídio contra palestinos

Juristas e organizações sociais de todo o mundo qualificam o terror imposto contra palestinos como genocídio. 70% dos assassinados são mulheres e crianças.

Por Cezar Xavier/Portal Vermelho

No duradouro conflito de Israel contra a Palestina, são constantes as acusações de genocídio, desencadeando um debate controverso que abrange mais de setenta anos de acontecimentos históricos. As acusações estão profundamente enraizadas na qualificação de Israel como um estado colonial, com vários incidentes servindo como pontos focais para aqueles que argumentam que as ações de Israel equivalem a genocídio.

A Nakba, o massacre de Sabra e Shatila, o bloqueio da Faixa de Gaza, a Guerra de Gaza de 2014 e a guerra Israel-Hamas de 2023 são citados como exemplos materiais que contribuem para a alegação de genocídio contra os palestinos.

O conflito, agora, está envolto em novas controvérsias com a recente ordem de evacuação emitida por Israel para o norte da Faixa de Gaza, sendo caracterizada por alguns como um “deslocamento populacional forçado”. Essa ação, que ocorre em meio a uma série de eventos turbulentos, tem gerado debates intensos sobre se ela constitui um genocídio.

No conflito recente, que começou em 7 de outubro de 2023, 19.453 palestinos foram mortos em Gaza, a esmagadora maioria deles, cerca de 70%, sendo mulheres e crianças (sendo 7.729 menores de idade). Cerca de 7.000 pessoas estão desaparecidas, provavelmente soterradas sob os escombros. Mais de 51.100 estão feridos. Além disso, mais de 5,6 milhões de palestinos foram registrados na UNRWA como refugiados em 2019.

A organização Human Rights Watch acusou o governo israelense de utilizar a dos civis na Faixa de Gaza como método de guerra. “Durante mais de dois meses Israel tem privado o de Gaza de alimentos e água, uma estimulada ou apoiada por altos funcionários israelenses, que reflete a intenção de matar civis de fome como método de guerra”, declarou Omar Shakir, diretor da HRW para Israel e Palestina, nesta segunda-feira (18).

Intenção genocida

A retórica adotada por autoridades israelenses tem sido apontada como expressões de intenções genocidas.

O ex-primeiro-ministro Benjamin Netanyahu afirmou que os israelenses estavam “comprometidos em eliminar completamente esse mal [do Hamas] do mundo”. Ele fez referência ao Velho (Bíblia Hebraica), citando 1 Samuel 15:3, onde se faz menção a Amaleque, um inimigo ordenado por Deus aos antigos israelitas para serem “genocidados”. O texto diz: “Vai, pois, agora e fere a Amaleque; e destrói totalmente a tudo o que tiver, e não lhe perdoes; porém matarás desde o homem até à mulher, desde os meninos até aos de peito, desde os bois até às ovelhas, e desde os camelos até aos jumentos”. Esses versículos, considerados violentos, têm uma longa história de uso por judeus de extrema direita para justificar a violência contra os palestinos.

Durante o conflito de 2023, o ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant, pediu um “cerco completo”, afirmando que estavam lutando contra “animais humanos” e agiriam de acordo. Outros membros do governo, como Ariel Kallner, do Knesset, e Daniel Hagari, sugeriram objetivos que foram interpretados como genocidas, incluindo a transformação de Gaza em uma “cidade de tendas”. Além disso, figuras proeminentes, como Amichay Eliyahu e Tally Gotliv, chegaram a propor o uso de armas nucleares em Gaza.

Essas declarações levaram o professor Raz Segal a caracterizar os eventos em Gaza como um “caso clássico de genocídio”. A analogia com a retórica usada em Ruanda antes do genocídio foi levantada, destacando semelhanças entre as mensagens israelenses e aquelas da emissora Radio Television Libre des Mille Collines (RTLM) em Ruanda, que qualificavam a etnia tutsi como “baratas”, assim como o ex-chefe do Estado-Maior do Exército israelense, Rafael Eitan, dizia que os árabes são como “baratas drogadas em uma garrafa”.

Em 14 de novembro de 2023, o Ministro das Finanças de Israel, Bezalel Smotrich, declarou que acolhia “a iniciativa da emigração voluntária dos árabes de Gaza para países ao redor do mundo”, sendo essa declaração comparada por críticos a um chamado para limpeza étnica.

Cumplicidade incondicional

Dentro dos Estados Unidos, o debate também atingiu proporções significativas. Durante um discurso na legislatura da Flórida, a representante democrata Angie Nixon, ao falar a favor de uma resolução pedindo “desescalada” e um cessar-fogo para encerrar as mortes de palestinos, foi interrompida por uma colega republicana, Michelle Salzman. Em determinado momento, Nixon afirmou: “Já são 10.000 palestinos mortos. Quantos serão suficientes?”. A representante republicana Michelle Salzman respondeu instantaneamente: “Todos eles”. Esta observação foi caracterizada por alguns comentaristas como um apelo aberto ao genocídio.

O incidente levou Nixon e o Conselho de Relações Islâmico-Americanas (CAIR) a pedirem sua censura ou renúncia. O diretor executivo do CAIR na Flórida, Imam Abdullah Jaber, declarou em comunicado: “Esse arrepiante apelo ao genocídio por uma legisladora americana é o resultado direto de décadas de desumanização do povo palestino por defensores do apartheid israelense e seus colaboradores ávidos no governo e na mídia.”

O congressista Max Miller, ao falar na Fox News, afirmou que a Palestina está “prestes a ser aniquilada… para se tornar um estacionamento”. Ele anteriormente instou a administração Biden “a sair do caminho de Israel e permitir que Israel faça o que faz de melhor”. Miller defendeu a de “regras de engajamento” durante o bombardeio de Gaza por Israel. Além disso, questionou a precisão da alegação do Ministério da de Gaza de que 10.000 pessoas foram mortas, sugerindo que muitos dos mortos eram “terroristas do Hamas”, não civis inocentes.

Ahmad Abuznaid, diretor executivo da Campanha dos EUA pelos Direitos Palestinos (USPCR), afirmou que “há um esforço bipartidário para desumanizar o povo palestino”, referindo-se especialmente à dúvida expressa pelo presidente Joe Biden sobre a precisão da contagem de mortes palestinas e aos ataques à congressista palestino-americana Rashida Tlaib por sua crítica à ofensiva militar de Israel.

Para que o genocídio aconteça, são necessários dois elementos críticos: as capacidades infra-estruturais e materiais para cometer o genocídio e a capacidade de ocultar o genocídio, chamando-o de algo diferente do que é. O Ocidente, materializado pelos EUA e países europeus, participa em ambas estas iniciativas. Em termos de capacidades materiais, os Estados Unidos enviou, não um, mas dois porta-aviões para a região, e deixou bem claro em palavras e atos que se algum estado ou grupo tenta entrar em cena e ajudar os palestinos na sua tentativa desesperada de sobreviver à operação genocida, que os EUA intervirão com toda a sua força.

Junto com isso, há todo um esforço de mídia para ocultar o caráter genocida do conflito, assim como perseguição aberta a personalidades e organizações que ousem criticar Israel. Estes são marcados como antissemitas e apoiadores do terrorismo, ou mesmo como defensores do genocídio contra os judeus. Nos EUA, este ambiente persecutório se expande entre as comunidades acadêmicas e professores universitários. As principais redes sociais escondem ou punem publicações pró-palestina e até mesmo aplicativos de Inteligência Artificial recusam a produzir sobre o assunto.

As redações ocidentais referem-se a atos flagrantes de limpeza étnica e deslocamento forçado em Gaza como “evacuações”, e afirmam que Israel está “defendendo-se” contra o “terror”, mesmo enquanto continua a aterrorizar milhões de civis que vivem sob a sua ocupação com bombas e balas, juntamente com leis de apartheid e políticas de opressão coloniais.

Intelectuais e juristas

O termo “genocídio” foi cunhado em 1944 pelo estudioso legal judeu polonês Raphael Lemkin. Para Lemkin, o genocídio não se refere apenas a assassinatos em massa, mas também a um plano coordenado visando destruir as bases essenciais da vida de grupos nacionais.

À medida que a situação se desenrola, vários acadêmicos, juristas e organizações expressaram as suas preocupações. Mais de 800 juristas assinaram uma declaração expressando alarme sobre a possibilidade de genocídio, enquanto organizações da sociedade civil e estudiosos do genocídio instaram o Tribunal Penal Internacional a intervir.

Especialistas como Ernesto Verdeja e Victoria Sanford alertaram para uma “campanha genocida”, traçando paralelos com genocídios históricos. No entanto, as opiniões variam, com alguns argumentando que o limite legal para o genocídio pode não ser atingido.

A análise do conflito israelense-palestino em termos de genocídio começou a ganhar destaque a partir de 2008. Alguns acadêmicos, como Martin Shaw, argumentam que a eliminação da maioria da sociedade árabe palestina em Israel em 1948 constituiu genocídio. Outros, como Michael Sfard, um advogado de israelense, discordam, afirmando que as políticas de Israel em relação aos palestinos não atendem ao limiar do genocídio.

Jan Egeland, ex-diplomata norueguês envolvido nos Acordos de Oslo, classificou a ordem de evacuação de Israel como um “deslocamento populacional forçado”. Esse termo refere-se à realocação forçada de uma população civil como parte de uma ofensiva organizada contra ela, sendo considerado um crime contra a pelo Tribunal Penal Internacional.

Egeland, em uma entrevista à BBC, afirmou que centenas de milhares de pessoas estão fugindo por suas vidas, caracterizando a ação como um “deslocamento forçado” que, de acordo com a Convenção de Genebra, configura um crime de guerra. Francesca Albanese, relatora especial da ONU, alertou sobre uma possível limpeza étnica em Gaza. O historiador israelense Raz Segal foi ainda mais longe, chamando-a de “caso clássico de genocídio”.

Estudiosos do direito internacional e do genocídio acusam as autoridades israelenses de usarem uma linguagem desumanizadora, com advertências de que as declarações feitas durante a guerra Israel-Hamas de 2023 poderiam ser interpretadas como uma indicação de uma intenção genocida.

Um documento vazado do Ministério de Inteligência de Israel sugeriu a expulsão permanente da população de Gaza para o Egito, sendo descrito como um apoio à limpeza étnica. O governo israelense minimizou o relatório, chamando-o de um “documento conceitual” hipotético. O tema do deslocamento é motivo de discussão e discordância dentro do governo de Israel, com alguns defendendo expressamente a expulsão permanente dos palestinos de Gaza.

Enquanto alguns afirmam que Israel está cometendo genocídio, outros defendem termos alternativos como limpeza étnica, politicídio, espaciocídio ou genocídio cultural. Esses críticos afirmam que a acusação de genocídio é frequentemente feita por anti-sionistas com o objetivo de demonizar Israel. No entanto, juristas consideram estes termos inadequados e prejudiciais ao debate sério sobre genocídio.

O historiador Simon Sebag Montefiore destacou a ironia de judeus serem acusados dos mesmos crimes que historicamente sofreram, afirmando que a palavra genocídio “foi agora desvalorizada pelo seu uso metafórico a ponto de se tornar sem sentido”. Intelectuais como David Hirsh e Robert Wistrich, no entanto, negam a acusação contra Israel, insistindo numa comparação direta entre milhões de mortos no Holocausto causado pelos alemães nazistas e os “assassinatos rotineiros” de ambos os lados em Israel. Curiosamente, algumas das principais vozes que acusaram abertamente Israel de genocídio foram sobreviventes do Holocausto.

O debate jurídico também é intenso sobre se Israel violou a Convenção de Genocídio. Desde 1998, o advogado de direitos humanos norte-americano Francis Boyle, professor de direito internacional na Faculdade de Direito da Universidade de Illinois, vem argumentando que um caso nesse sentido deveria ser apresentado. Boyle afirma que Israel implementou uma campanha militar, política e econômica sistemática e abrangente com a intenção de destruir substancialmente o grupo nacional, étnico, racial e religioso (muçulmano e cristão) dos palestinos.

Em 2013, o Tribunal de Crimes de Guerra de Kuala Lumpur, um “tribunal de cidadãos”, considerou Israel culpado por genocídio, concordando com a acusação de que as “difíceis condições de vida foram deliberadamente infligidas para destruir” os palestinos.

Desde 2021, uma investigação em andamento sobre crimes de guerra em Israel, Gaza e na Cisjordânia está sendo conduzida pelo Tribunal Penal Internacional (TPI). Em 9 de novembro, Al Haq, Al Mezan Center for Human Rights e o Palestinian Centre for Human Rights moveram uma ação contra o TPI, pedindo a inclusão de crimes contra a humanidade por parte de Israel, nomeadamente apartheid e genocídio, em sua investigação em curso, bem como a prisão de Benjamin Netanyahu, Isaac Herzog, Yoav Gallant e outros suspeitos de cometer esses crimes.

Em 13 de outubro, o ministro das Relações Exteriores iraniano, Hossein Amir-Abdollahian, rotulou o cerco e o corte de itens essenciais como “busca de genocídio de toda a população em Gaza”. Em 15 de outubro, o ministro das Relações Exteriores paquistanês, Jalil Abbas Jilani, chamou diretamente os ataques aéreos e o bloqueio de Gaza de genocídio. O presidente palestino, Mahmoud Abbas, descreveu o conflito em Gaza como uma “guerra de genocídio e massacres cometidos pelas forças de ocupação israelenses”.

O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da foi um dos que qualificaram a guerra de Israel como um genocídio. “É muito grave o que está acontecendo neste momento no Oriente Médio, ou seja, não se trata de ficar discutindo quem está certo, quem está errado, de quem deu o 1º tiro, quem deu o 2º. O problema é o seguinte aqui: não é uma guerra, é um genocídio que já matou quase 2 mil crianças, que não têm nada a ver com essa guerra, que são vítimas dessa guerra”, afirmou Lula, ainda em 25 de outubro, durante discurso em um evento público. A afirmação foi feita ao final da gestão do no Conselho de Segurança da ONU, onde Lula tentou aprovar resoluções para um cessar-fogo em Gaza, que foram vetadas pelos EUA.

Fonte: Portal Vermelho Capa: Reprodução


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

revista 119

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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