É necessário criar regras únicas para manejar a fauna, alertam pesquisadores
Carta aberta assinada por cerca de 30 instituições pede mudanças na legislação e políticas pública para fomentar ações de manejo da fauna.
Por Duda Menegassi/O Eco
Para combater a crise de perda de biodiversidade, é preciso agir. Em muitos casos, isso traduz-se em ações de manejo como a reintrodução ou a translocação de espécies para recomeçar ou reforçar populações em determinados locais. Para fazer esse trabalho, uma carta aberta assinada por cerca de 30 instituições reforça a necessidade de adaptar a legislação brasileira, combater a desinformação, engajar atores e criar políticas públicas de fomento.
A “Carta de Salto Morato“, como foi chamada, é assinada pela Rede Brasileira de Translocações para Conservação de Fauna junto ao Grupo Especialista em Translocações para a Conservação da IUCN. Ao todo, são cerca de 30 instituições.
O documento foi um dos resultados do Curso Internacional de Translocações para a Conservação, realizado entre os dias 28 de agosto e 1º de setembro de 2023, na Reserva Natural Salto Morato, no Paraná. O evento reuniu representantes de órgãos governamentais, universidades, zoológicos, criadouros, instituições de pesquisa e organizações da sociedade civil.
O texto destaca o enorme potencial das reintroduções e outras translocações de populações animais “para revolucionar a conservação da nossa biodiversidade e ecossistemas naturais” e recuperar o que foi perdido.
Os especialistas ressaltam que é necessário deixar claro a função conservacionista e a base científica por trás das translocações de animais, além de reconhecer o papel-chave das instituições “ex situ”, ou seja, que fazem esse manejo das espécies em cativeiro, como zoológicos e criadouros.
“Ainda há pouco engajamento dos órgãos públicos, da academia, da sociedade em geral e – crucialmente – dos políticos brasileiros com as translocações para a conservação. Da mesma forma, a legislação brasileira, em vários níveis, está desatualizada e é insuficiente diante da atual abordagem ativa da conservação”, escrevem em trecho da carta, que recomenda a inclusão desta categoria (translocação) nas licenças ambientais fornecidas pelos órgãos competentes.
A carta é direcionada a diretores de todos órgãos ambientais, além da ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, e às presidências do CNPq e da Associação de Zoológicos e Aquários do Brasil (AZAB), e para Frente Ambientalista no Congresso.
De acordo com Marcelo Rheingantz, organizador do curso e membro da Rede, a ideia é que o encontro em Salto Morato seja o começo de diversas ações no âmbito da Rede Brasileira de Translocações.
“Como a gestão da fauna é muito descentralizada, os diferentes órgãos muitas vezes têm visões antagônicas sobre o mesmo problema. Então o manejo de fauna é muito diferente de um lugar pro outro e depende muito da interpretação de quem está avaliando. É necessário termos uma legislação única e mais clara a respeito do manejo da fauna, com objetivos e métricas de avaliação”, explica Marcelo, que é diretor-executivo do Refauna, iniciativa que tem recuperado as populações de animais silvestres do Parque Nacional da Tijuca.
Ter regras mais claras também ajudaria a evitar ações como a soltura inadequada de espécies fora da sua área de ocorrência ou em locais que não ofereçam condições para a sobrevivência dos animais no longo prazo.
O pesquisador explica que atualmente as translocações são feitas apenas dentro de licenças de pesquisa, o que restringe as ações que visam apenas à conservação, sem fins específicos de pesquisa. “Translocação pode ser manejo, sem pesquisa”, resume Marcelo.
Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.
Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.
Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.
Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.
Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.
Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.
Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.
Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.
Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.
Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.
Zezé Weiss
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