Governo quebra a Funai e abandona índios, diz Instituto Socioambiental

Governo quebra Funai e abandona índios, diz Instituto Socioambiental

Em editorial, o ISA critica a ação deliberada da administração de Michel Temer para desestruturar o órgão e as políticas de proteção aos direitos indígenas

O Diário Oficial da União traz, hoje (5/5), a exoneração de Antônio Fernandes Toninho Costa do cargo de presidente da . Não traz a nomeação de um substituto, mas ninguém duvida mais que o próximo a ocupar a função seja alguma ave de rapina.

Isso porque Costa teria se oposto à nomeação de 25 pessoas para cargos de confiança, indicadas pelo PSC – mesmo partido que indicou ele próprio para a presidência do órgão – e por deputados ruralistas anti-indígenas, como Luiz Carlos Heinze (PP-RS), aquele que disse que os índios são “tudo o que não presta”. Costa foi a quarta pessoa a ocupar o cargo em um ano de governo Temer.

Ontem, quinta-feira (4/5/), foi confirmado o contingenciamento de 55% dos recursos discricionários da Funai, aqueles destinados ao custeio e investimentos. Este corte é feito sobre um orçamento já completamente depauperado, que se encontrava em patamar de uma década atrás. Nos próximos meses, a Funai vai involuir da paralisia das atividades para o desmantelamento estrutural.

Osmar Serraglio, ocupante do Ministério da , sabendo da repercussão desastrosa que o desmonte da indigenista já tem na opinião pública, procurou tirar o corpo fora e atribuir a exoneração de Costa à “coalizão” governista e o corte orçamentário ao Ministério do .

Oriundo da bancada ruralista, Serraglio foi relator de uma grave emenda à , a PEC 215, que não prosperou, mas pretendia transferir para o Congresso a competência do Poder Executivo para dar a última palavra sobre a demarcação das Terras Indígenas, abrir as áreas já demarcadas para a exploração e devastação e anular processos de demarcação já finalizados.

Na quarta-feira (3/5), os ruralistas divulgaram o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Funai e do Instituto Nacional de Colonização e (Incra), elaborado ao gosto da bancada e prolixo em ilações sem comprovação, que traz como recomendação principal a da Funai.

Na segunda-feira (1/5), a imprensa noticiou um massacre promovido por fazendeiros contra os índios Gamela, no Maranhão, deixando 13 feridos, dois deles gravemente, sob o risco de amputação das mãos por cortes de facão.

Todos esses fatos se sucederam, imediatamente, à maior mobilização de índios já vista em , com quatro mil representantes de duzentos , que vieram manifestar a sua repulsa ao retrocesso civilizatório que vive o país e, em especial, às ameaças arquitetadas contra os seus direitos no governo e no Congresso. Os índios foram recebidos com respeito pelo Supremo Tribunal Federal (STF), mas tratados a bombas pelo Legislativo e o Executivo federais.

O presidente exonerado disse à imprensa ter constatado a existência, neste governo, de uma “ditadura ruralista” que impede a Funai de cumprir a sua obrigação legal de proteger e promover os . Incluiu Serraglio entre os responsáveis por sua saída, caracterizou-o como anti-indígena e reconheceu que a presença dele no ministério dá cobertura aos que promovem a violência contra índios.

O reiterado desvirtuamento da política indigenista coloca sobre os ombros de Michel Temer uma responsabilidade pessoal e histórica pelas vítimas desse processo.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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