Com o liberou geral das armas, crimes de feminicídio podem virar epidemia

Com o liberou geral das armas, crimes de feminicídio podem virar epidemia
ameaçadas: Com o liberou geral das armas, crimes de feminicídio podem virar epidemia
Por: no Balaio do Kotscho
É raro o dia em que os telejornais não noticiem um ou mais crimes de feminicídio.
Na quinta-feira, o portal G1 registrou mais um caso dessa matança de mulheres que já virou rotina:
“Uma mulher de 22 anos morreu no hospital após ser baleada pelo namorado em Seberi, no norte do Rio Grande do Sul, conforme a polícia civil. Maiara Dondoni estava na casa de uma amiga, na tarde de segunda, quando Sirineu Albânio, 36 anos, a procurou para sair, mas ela não aceitou”.
O que pode acontecer agora que a posse e o porte de armas foram liberados pelo governo do Capitão Bolsonaro e quase todo mundo poderá ter uma arma em casa?
Para responder a essa pergunta, pedi um relato a quem entende do assunto: a jornalista e escritora Marisa Marega, uma velha amiga, que é uma das ativistas mais empenhadas no combate à violência doméstica.
Se nada for feito, com urgência, se esta barbaridade da ofensiva armamentista do governo não for impedida pelo Legislativo e pelo Judiciário, corremos o risco de sofrer uma nova epidemia social: a matança generalizada de mulheres que desobedecerem a seus valentes maridos ou companheiros, como aconteceu com Maiara Dondoni.
Leiam abaixo o dramático depoimento de Marisa Marega.
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O feminicídio avança. Uma mulher morre a cada duas horas no .
Traduzindo essa realidade para dados da ONU, o Brasil lamentavelmente é o quinto país do planeta onde morrem mais mulheres assassinadas.
Segundo a Organização das Nações Unidas, os outros são de El Salvador, Colômbia, Guatemala, Rússia. Não por acaso, países onde o machismo, o poder hierárquico e a relação desigual entre homens e mulheres dominam na sociedade.
E os números da violência contra a mulher seguem num crescendo. De um lado, porque as vítimas agora denunciam mais; de outro, porque os “machos” não toleram a separação. E, como agravante, nós temos a proteção do Planalto com o discurso armamentista.
Em , os casos de feminicídio – quando a mulher é vítima só por ser mulher- aumentaram 76% no primeiro trimestre de 2019 em relação ao mesmo período do ano anterior. Isso significa 37 .
O Monitor da Violência publicado pelo G1 aponta que oito em dez dos casos aconteceram dentro das residências, onde as mulheres deviam estar mais protegidas.
No Rio de Janeiro, não é diferente. O Instituto de Pública, que divulga anualmente o Dossiê Mulher, mostra que 71 mulheres foram vítimas de feminicídio naquele estado em 2018.
Mais da metade dos crimes foram cometidos por companheiros ou ex- companheiros. Mas 71 são apenas as vítimas qualificadas como feminicídio já que, no total, 350 mulheres foram assassinadas, 120 dentro de suas casas.
Por que temos essa realidade?
Os especialistas apontam a falta de políticas públicas voltadas para mulheres, de qualificação no judiciário, nas polícias, na , na educação _ enfim, um cipoal de carências.
Mas o país já avançou. Dona Ruth Cardoso, no governo Fernando Henrique, tão logo tomou posse como primeira dama, levou para o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, em Brasília, sua companheiras feministas que havia anos lutavam pela questão de gênero e foram, em 2013, a base da Secretaria de Políticas para as Mulheres.
Depois, em 2006, no governo Lula, veio a Lei da Penha, que criou mecanismos para prevenir e coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, de acordo com a Constituição Federal.
Maria da Penha, que deu nome à Lei, é a farmacêutica bioquímica que o marido tentou assassinar duas vezes: uma com um tiro nas costas, que a deixou numa cadeira de rodas, e outra quando tentou eletrocutá-la no banho.
Ela lutou durante 19 anos por justiça, até que, em 2002, o agressor foi para a cadeia, onde cumpriu apenas 16 meses em regime fechado e depois foi para o semi- aberto.
Hoje, Maria da Penha dirige um instituto que leva seu nome e dá palestras para alertar sobre a violência contra a mulher. No Ceará, o Instituto Maria da Penha usa o cordel, sob a direção do músico Tião Simpatia, para levar às escolas um programa de conscientização dos jovens sobre a violência doméstica.
No governo Dilma Roussef, outro progresso. Foi criado o programa “Mulher, viver sem violência” que prevê, entre outros recursos, a criação da Casa da Mulher Brasileira em cada estado.
Ali, a vítima tem, no mesmo local, atendimento médico para exame de corpo de delito, delegado, assistente social, psicólogo, ministério público, defensoria pública, promoção da autonomia econômica, alojamento de passagem e brinquedoteca.
O governo federal cede o terreno e banca a construção, via Banco do Brasil, e estados e municípios são responsáveis pelo funcionamento. Passados seis anos, dos 27 estados, as Casas da Mulher Brasileira funcionam apenas em Campo Grande, Curitiba, São Luiz, Fortaleza e Boa Vista.
Em São Paulo, é uma vergonha. A casa está pronta há dois anos, mas o governo estadual e a prefeitura município não se entendem sobre o seu funcionamento. No Distrito Federal, a casa foi inaugurada, mas teve que ser fechada para reformas e agora funciona precariamente.
O descaso dos governos em todos os níveis é generalizado, enquanto o número de feminicídios só faz aumentar.
Como se sabe, sempre pode piorar. E foi o que aconteceu. Em abril, a ministra Damares Alves disse na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara dos Deputados que “manter a Casa da Mulher pelo ministério é impossível”.
A ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos do governo Jair Bolsonaro simplesmente lavou as mãos, feito Pilatos. Instado, desde o dia 3 de maio, a informar quantas Casas da Mulher Brasileira estão em funcionamento, o ministério não me respondeu.
Resumo da tragédia: ninguém se responsabiliza pelas trágicas mortes de mulheres. Para dar uma ideia da gravidade da situação, a jornalista Kotscho montou um grupo no Facebook (endereço no pé da matéria) de apoio às vítimas de violência doméstica, que nós duas coordenamos, e nele já estão inscritas quase 2.500 mulheres em situação de vulnerabilidade total.
Ninguém sabe a quem recorrer no sufoco, como pedir socorro ou deixar a residência com vida. Em muitos estados, as vítimas dizem que ligam para o 180 e não recebem a resposta para o que precisam. Outras, narram até que o número não funciona.
A ausência do poder público é generalizada. Exceto algumas iniciativas do Ministério Público, em alguns estados, e das Guardas Municipais, em poucas cidades, o que existe é um vazio.
A solução apontada por especialistas é que a questão da violência contra a mulher seja tratada como uma política de estado e não de governos. Só assim, teremos ações planejadas e continuadas que não dependem do governante de plantão.
Em paralelo, é necessário ampliar iniciativas de empresas como Avon e Magazine Luiza, que trabalham a questão da violência com seus funcionários no local de trabalho, além de capacitar os jovens nas escolas para entender o problema e funcionar como multiplicadores de uma de paz.
Para finalizar, devemos destacar a importância de envolver toda a sociedade através de campanhas nas mídias que funcionem como um alerta. O machismo mata e cada cidadão pode com a sua atitude evitar assassinatos de mulheres.
Neste momento, com a liberação das armas pelo governo de Jair Bolsonaro, entidades como o Fórum Brasileiro de , o Instituto Maria da Penha e a Agência Patrícia Galvão, que investigam a violência contra a mulher, são unânimes em projetar que a situação só vai se agravar.
A arma dentro de casa será a ferramenta ideal que os machões usarão para cometer o feminicídio “num surto”, “sob violenta emoção”.
E aí fica a pergunta: já que o Estado se omitiu e ainda agravou a situação com a liberação das armas, o que você sugere para salvar a vida das mulheres ameaçadas?
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Facebook: Violência doméstica- Grupo de apoio
https://www.facebook.com/groups/1741293742823826/2465906630362530/?comment_id=2466034777016382&notif_id=1557417991070766&notif_t=group_comment_reply
Coordenadoras: Mariana Kotscho e Marisa Marega
Telefone para denúncias: 180

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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