Pesquisar
Close this search box.

Lula promete criar Ministério Indígena

Lula promete criar Ministério Indígena

Apib define apoio ao presidenciável do PT, mas a líder Sonia Guajajara alerta-o de que não serão mais aceitas obras como a hidrelétrica de Belo Monte
Por Cristina Ávila/Amazonia Real


Brasília (DF) – O candidato à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), prometeu criar um Ministério Indígena, se for eleito. E ainda avisou: “Preparem-se, pois alguém terá que assumir um ministério que vai tratar das questões indígenas”. Foi o que bastou para que os milhares de indígenas presentes no Acampamento Terra Livre (ATL) ovacionassem o ex-presidente. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), organizadora do encontro e da vinda de Lula ao acampamento, definiu apoio ao presidenciável, mas não sem questioná-lo sobre as gestões do PT no governo federal.
“Estamos aqui prontas, estamos aqui prontos, para que não haja mais Belo Monte no seu governo. Não precisamos de Belo Sun. Não podemos ficar à margem da construção desse país”, enfatizou Sonia Guajajara, coordenadora-geral da Apib. A hidrelétrica Belo Monte que vinha sendo repudiada com repercussões internacionais especialmente pelos Kayapó desde os anos 80 foi inaugurada por Dilma Rousseff pouco antes do impeachment, em 2016.
Sonia se apresenta na Apib como a principal líder indígena de articulação nacional e isso se traduz em sua pré-candidatura a deputada federal por São Paulo, depois de ter concorrido à vice-presidência. Nesses encontros de grandes públicos indígenas, ela só concorre em popularidade com a deputada federal Joenia Wapichana (Rede-RR), que parece agregar todas as simpatias. Em todos os dias, o ATL tem realizado plenárias lotadas – iniciando com 5 mil participantes e chegando entre segunda e terça-feira desta semana a 8 mil representantes de 200 povos.
Mais de uma dezena de parlamentares de partidos de esquerda do Congresso e da Câmara Distrital de Brasília estiveram na plenária desta terça-feira (12). O destaque foi a deputada federal Joenia Wapichana, a primeira e única mulher indígena eleita para o cargo. Ela lembrou que desde que tomou posse, em 2019, são incontáveis os requerimentos que fez na tentativa de refazer atos de destruição do Estado cometidos no governo Jair Bolsonaro.
A falta das demarcações de terras indígenas nos governos petistas e a hidrelétrica de Belo Monte são considerados “erros graves” por grande parte das organizações vinculadas às questões indígenas. Porém, esses erros ficam eclipsados diante do contraste com as medidas adotadas pelo governo Bolsonaro, já denunciado como genocida a organismos internacionais. Desde o ano passado, é comum ver nos acampamentos indígenas em Brasília até mesmo entre os povos mais críticos, como os Kayapó, sustentarem o apoio à candidatura de esquerda que possa derrotar o governo do atual presidente.
Lula permaneceu por cerca de três horas no ATL e ouviu lideranças de todas as regiões do País. Sua própria fala na plenária soou como uma autocrítica dos governos do PT. “Fazem 12 anos que estive na Presidência da República e a gente sempre aprende muito. Sabe o que fez, o que não fez e o que poderia ser feito”, afirmou logo após ter dito que “voltar a governar este País significará que nada será feito nos territórios indígenas sem a concessão de vocês”. Em entrevista recente à mídia internacional, Lula chegou a exaltar a obra de Belo Monte como um feito importante, embora tenha omitido os efeitos danosos da hidrelétrica sobre os povos indígenas.

Pela demarcação de terras

Lula assinou a Carta-compromisso com a Apib, que destaca a demarcação das terras que estão em processo de homologação
(Foto: Matheus Alves/Apib)

Apostando na estratégia de ser um candidato oposto em quase tudo do governo Bolsonaro, Lula aceitou a proposta da plenária do ATL de fazer “um revogaço” nos primeiros dias de seu governo, caso seja eleito. Isso significa revogar portarias, normas administrativas e decretos que tragam prejuízos aos povos tradicionais. A principal reivindicação que ouviu foi pela demarcação dos territórios indígenas. Durante todo o governo de Jair Bolsonaro, nenhuma TI foi demarcada ou homologada. Dilma Rousseff (PT), sucessora de Lula, conseguiu ficar entre os piores números desde José Sarney, que ficou na Presidência da República entre 1985 e 1990. Lula também conseguiu ficar atrás de Fernando Henrique Cardoso e Fernando Collor.
O presidenciável petista informou que o primeiro mês de seu governo deverá ser de construção de propostas para a reconstrução do País, com viagens aos Estados e contará com a participação dos povos originários. Ele comentou que as reivindicações feitas pela plenária do ATL já podem se constituir em esboço de um plano de governo.
Sem festejar as promessas do ex-presidente, o articulador político da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia (Coiab), Toya Manchineri, disse à Amazônia Real que a ideia de um Ministério Indígena não é nada nova. “É um sonho do movimento indígena, desde a Constituinte”, lembrou. Na opinião dele, um ministério poderia garantir programas mais arrojados de fiscalização e proteção dos territórios. A proposta também foi pensada pelo recém-criado Setorial Indígena do PT, instância do partido que prepara o documento a ser entregue como sugestão de plano de governo.

A Carta-compromisso da Apib

Lula com a Carta-compromisso entre as lideranças indígenas
(Foto: Oliver Cornbihtt/Mídia Ninja/Apib)

A Apib e o conjunto de suas organizações regionais prepararam uma Carta-compromisso entregue ao ex-presidente durante sua visita ao ATL. O documento relata os problemas enfrentados e em seguida é dividido em cinco eixos temáticos de reivindicações: direitos territoriais, retomada de espaços de participação e controle social, reconstrução de políticas e instituições indígenas, interrupção da agenda anti-indígena no Congresso e agenda ambiental.
No primeiro eixo, considerado prioritário por ser essencial à sobrevivência física e cultural dos povos tradicionais, as organizações indígenas propõem que até o fim de 2026, período correspondente ao mandato presidencial em disputa, seja firmado comprometimento político, com garantia de recursos suficientes para a identificação, delimitação, declaração, demarcação e homologação de todas as terras indígenas. Além de plano factível de imediata desintrusão de todas as terras indígenas, cada vez mais invadidas por fazendeiros, grileiros, madeireiros e garimpeiros. Também é ressaltada a necessidade de política especial de proteção e de não-contato aos povos isolados ou de contato recente.
A Carta-compromisso também enfatiza a obrigação de consulta com respeito a protocolos, em obediência à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sempre que houver medidas administrativas ou legislativas que impactem os territórios e direitos dos povos originários. Além disso, é reivindicada a reativação dos Conselhos Nacional de Política Indigenista, de Segurança Alimentar, Meio Ambiente, Saúde e de Direitos Humanos, que sofreram duros impactos no atual governo federal. Propõe ainda o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS) e o Subsistema de Saúde Indígena (Sesai/SUS), bem como implementação da Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial das Terras Indígenas.
Na carta são citados ainda os projetos de lei que tramitam no Congresso que incentivam invasões de territórios, promovem danos ambientais, à saúde das pessoas, destruição ambiental, uso de veneno na agricultura que não raro contaminam rios e solo dos territórios tradicionais, promovem a grilagem de terras públicas e flexibilizam o licenciamento ambiental para empreendimentos que destroem a natureza. As propostas ambientais para um possível governo Lula podem se resumir no quinto eixo do documento em que é reivindicado o cumprimento dos compromissos assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris e em outros acordos internacionais do clima e meio ambiente.

Lula foi saudado pelos indígenas no ATL (Foto:@scarlettphoto/Apib)

Foto de Capa:  Kamikia Ksedje – Midia Índia/Apib


 

Block

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

0 0 votos
Avaliação do artigo
Se inscrever
Notificar de
guest
0 Comentários
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários

Parcerias

Ads2_parceiros_CNTE
Ads2_parceiros_Bancários
Ads2_parceiros_Sertão_Cerratense
Ads2_parceiros_Brasil_Popular
Ads2_parceiros_Entorno_Sul
Ads2_parceiros_Sinpro
Ads2_parceiros_Fenae
Ads2_parceiros_Inst.Altair
Ads2_parceiros_Fetec
previous arrowprevious arrow
next arrownext arrow

REVISTA

REVISTA 114
REVISTA 113
REVISTA 112
REVISTA 111
REVISTA 110
REVISTA 109
REVISTA 108
previous arrowprevious arrow
next arrownext arrow

CONTATO

logo xapuri

posts recentes

×