Lula voltou e é hora de (re)construirmos a virada

Lula voltou e é hora de (re)construirmos a virada

por Ion de Andrade

A volta de Lula à no é uma lufada de ar fresco num ambiente que já estava irrespirável.

Mas Lula vem diferente, mais indignado e certamente mais atualizado com a agenda necessária ao Brasil, porque, como ele mesmo disse, na prisão ele teve de reflexão e aprendeu…

Me lembro do período que antecedeu aquela primeira eleição de Lula em 2002. Uma das coisas que foi bastante difundida foi a formação intensiva que o presidente deu a si mesmo numa série de assuntos estratégicos ao Brasil com os pensadores mais avançados em cada área.

Lula vive, desde sempre, um preparo permanente para os desafios que o povo deposita continuamente em suas mãos e se engana quem possa achar que na prisão Lula perdeu tempo, pois preparou-se ainda mais.

Em seu discurso de posse em janeiro de 2003, Lula falava de uma meta que pareceu inalcançável a muita gente. Três refeições por dia para o brasileiro. Me disse: – É bonito, mas não conseguirá!

O Lula de hoje fala de cultura e de juventude e fala de renda, mas agora fala de renda  dentre esses outros tópicos igualmente cruciais para a emancipação definitiva do nosso povo. Fala de juventude que é a principal perdedora da loucura que se instalou em .

Lula mudou e se o Brasil também mudou de agenda foi em boa parte pelo sucesso das políticas de enfrentamento da miséria que foram desenvolvidas no seu governo.

Temos, sob a liderança desse líder maior, que encontrar a continuação da história que começamos a escrever.

Os anos das lutas heroicas daquele país miserável que fomos, e que sequer permitia que as pessoas comessem três vezes ao dia, ficaram, em grande medida, para trás. Eu, por exemplo, que sou pediatra e num num bairro popular de Natal, há muito tempo não faço um só diagnóstico de desnutrição. E antes esses diagnósticos nos obrigaram a ter uma enfermaria-dia de suplementação alimentar para desnutridos, tantos e tão graves eram.

Isso não significa que a miséria tenha desaparecido por completo, ela não desapareceu, ela nos espreita e os programas que asseguram vida de sobrevivência não podem ser descontinuados ou ela voltará como já mostra o rosto. Prova disso o IBGE publicou nessa semana a horripilante estatística da volta à miséria de nada que menos que um milhão de pessoas por ano, todo ano desde o golpe. Mas os anos de governo popular conseguiram efetivamente virar a página em que estávamos em janeiro de 2003, ainda que não possamos ter a alegria da erradicação completa da miséria.

E hoje, sem abrir mão dessas conquistas, e chegando onde não chegamos para assegurar a vida de sobrevivência aos que hoje ainda são miseráveis, sim o Brasil quer e aspira por ir além dos níveis de sobrevivência.

Os problemas de hoje que nos horripilam a todos são os da iniquidade, da exclusão social dos pobres, do massacre de jovens negros que cotidianamente vitimam nossa gente todos os dias do ano; da falta de acesso à contemporaneidade nas periferias e zonas rurais onde o lazer, a civilidade, ou o acesso à cultura são quimeras. Locais onde o esgoto ainda corre a céu aberto e onde a cidadania é uma conquista heroica de poucos, por difícil que é de se chegar a ela.

Poderíamos resumir esse novo capítulo das lutas do nosso povo como sendo o do Desenvolvimento para a Inclusão Social.

Em Natal, na próxima semana, teremos uma discussão, num grupo egresso das discussões atuais referentes ao Plano Diretor, sobre o desenho institucional a propor para essa tarefa civilizatória que é uma necessidade hoje. Sim, pois não temos instituição que seja capaz de dar cumprimento a essa importante missão no nosso país.

Do que falaremos?

Da base a partir da qual as comunidades secularmente abandonadas pelo Estado poderão planejar o seu desenvolvimento e a sua emancipação cidadã. Portanto essas instituições, de que desenharemos os fundamentos, devem permitir e viabilizar a vida associativa local focada nessa agenda que lhe será obrigatória e constitutiva.

A ideia que já circula nesse pequeno grupo, que está inspirado também de algumas experiências internacionais é que essa instituição já surja equipada com os equipamentos coletivos mínimos, que estão sempre ou quase sempre ausentes das periferias e zonas rurais e que inexistindo condicionam a iniquidade e a exclusão social: as bibliotecas públicas (e elas podem ter espaços digitais), as salas de apresentação cênica, o cineclube, a de música, a piscina pública, as salas de reunião associativa, os espaços poliesportivos, os anfiteatros, as áreas de lazer, etc, etc, etc.

Essa é a agenda da Cultura em sentido amplo e da juventude como principal beneficiária e são também os sinos dobrando pelo Estado escravocrata que estaremos enterrando sem pompas.

O Brasil pode bancar isso tudo? Sim!

Já fizemos diversos exercícios orçamentários e sabemos que essa nova rodada de desenvolvimento institucional é perfeitamente viável materialmente para o país.

O problema que se põe é o da coragem política para enfrentar o paradigma que sustenta esse Estado escravocrata porque essa instituição/agenda é a grande virada contra ele.

Atenção gestores porque o Estado escravocrata vive dentro de nós e nos diz que toda despesa pública em periferias é dinheiro jogado no . Essa instituição/agenda materializa (tão tardiamente…) o enfrentamento da Exclusão Social naquilo que hoje ainda cumpre o papel de Senzala para um Estado que é a Casa Grande: nossas periferias e lonjuras.

Quando o companheiro Lula fala de defesa da cultura e da juventude me acende a esperança de que tal como ele fez contra a , possa fazer agora contra a Exclusão Social e como dizia Paulo Freire contra o Subdesenvolvimento Opressor.

Essa agenda: 1. consolida a democracia multiplicando a cidadania, 2. politiza o povo permitindo que entenda pela experiência de que Projeto de Sociedade falamos, 3. acesta um poderoso golpe contra o Estado escravocrata; 4. produz inclusão social e 5. nos atualiza com a civilidade.

E é isso que eu teimo em querer ouvir quando ouço o companheiro Lula falar de prioridade à cultura e à juventude!

A ele entregaremos, mirando por agora as de 2020, o nosso desenho de instituição para a virada!

Fonte: GGN

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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