Mãos Contrárias
Poema de Antônio Victor
Minhas mãos não nasceram para as palavras,
mas para as ações pesadas que tantas vezes dispensam
o tão inútil pensar.
Minhas mãos em sua essência
são mãos ásperas, agrestes,
que de rugas se revestem na perpetuagem do tempo.
Minhas mãos nasceram para amansar cavalos
e segurar bois.
Procuram, no entanto, amansar as palavras
e em vão tentam dominá-las.
Nasceram as minhas mãos para as tetas da vaca
e a feitura do queijo.
E espremem e apertam e buscam extrair o leite das palavras.
Estas mãos nasceram para derrubar madeira,
para rachar lenha, para bater estaca,
esticar o arame, levantar cercas.
Mas lutam com as palavras, dividem as palavras, puxam as
palavras e acabam erguendo cercas entre elas e as palavras.
Minhas mãos nasceram para laçar o gado
e tentam laçar as palavras.
Nasceram para o cultivo da terra e tentam lavorar as palavras.
Nasceram para cortar a cana e tentam moer as palavras.
Nasceram para construir açudes e tentam represar as palavras.
Minhas mãos nasceram para abrir buracos
E tentam tanger estrelas.
Minhas mãos vivem escravas
de um ofício forçado para o qual não foram feitas.
Minhas mãos vivem escravas do verbo e da palavra,
porque nasceram para os calos e para o braço da enxada.
É por isso – tenho certeza – que minhas mãos,
sempre presas, nunca conseguiram nada.
Antonio Victor é o maior e mais conhecido poeta da cidade de Formosa-Goiás. Nasceu em 29 de outubro de 1958. Cultiva a arte dos versos e da prosa, preferencialmente em pequenos contos nos quais trabalha o regionalismo e a temática urbana. Aventura-se às vezes em temas universais e procura dar um toque de humor às suas histórias, sempre despretensiosas.