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Dia Nacional Tereza de Benguela: Marcha da Mulheres Negras lança Manifesto

Dia Nacional Tereza de Benguela: Marcha da Mulheres Negras lança Manifesto

Neste 25 de julho, nós mulheres negras e indígenas estamos nas ruas com a força das nossas ancestrais e de milhares de lutadoras anônimas para gritar bem alto que seguimos em marcha.

No momento em que o Brasil atravessa uma grave crise política e econômica, com o desmantelamento de políticas públicas duramente conquistadas e desmandos por parte de governos elitistas e conservadores, nós negras de São Paulo voltamos às ruas. Celebramos o Dia Internacional da Mulher Negra Latinoamericana e o
Dia Nacional Tereza de Benguela, marcos da luta das mulheres negras em todo o Brasil e no Continente.

Somos o coletivo Marcha das Mulheres Negras de São Paulo que ajudou a construir a Marcha das Mulheres Negras contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver, que levou a Brasília cerca de 50.000 mulheres em 2015. Em São Paulo, realizamos duas marchas vitoriosas e colocamos nas ruas mais de 5 mil mulheres negras no dia 25 de julho de 2016 e 2017, denunciando o racismo e o machismo, o retrocesso político e celebrando nossa força e nossa energia pela vida das mulheres negras, de todas as mulheres.

Nesta 3ª Marcha das Mulheres Negras de São Paulo apresentamos para toda a sociedade questões que nos afetam diretamente e que queremos ver enfrentadas por todas as pessoas que acreditam num novo projeto de país.

Reivindicamos o Bem Viver por acreditarmos em outras formas de gestão do coletivo e do individual. Ao exigir outra economia, sustentada nos princípios de solidariedade, reciprocidade, responsabilidade e integralidade, o Bem Viver nos inspira a criar alternativas às relações exploratórias do capitalismo.

Marchamos contra o racismo, o feminicídio, o machismo, o etnocídio, a lesbofobia, a bifobia e a transfobia, o racismo religioso e todas as formas de violência e violação dos direitos humanos.

Voltamos às ruas para denunciar o genocídio da população negra em curso, pela violência da polícia do Estado e a “guerra às drogas”, que vem se efetivando como política de criminalização da juventude e não de enfrentamento efetivo ao narcotráfico.

No Brasil, vivemos um quadro de guerra não declarada que, de formas extremamente violentas, restringe individual e coletivamente nosso direito à vida. Pobreza, indigência, morte precoce, violência, violação de direitos, restrições à livre expressão sexual, incidência crescente de infecção por HIV/Aids e altas taxas de
mortalidade, pedofilia, desemprego, exploração sexual infantil e invasão dos corpos, estão entre os desafios enfrentados pelas mulheres negras, na maior parte das vezes em isolamento.

Apesar da nossa luta cotidiana, somos a maioria das vítimas da violência doméstica e obstétrica e da mortalidade materna; somos maioria da população carcerária feminina e vemos aumentar de maneira assustadora a violência sofrida pelas travestis e transexuais negras que vivenciam múltiplas formas de discriminações. Fatos recentes evidenciam um acirramento da violência contra a população negra, onde as mulheres negras têm sido o alvo privilegiado de práticas perversas e assassinas.

Mulheres lésbicas seguem sendo vítimas de “estupros corretivos” e a eugenia – adotada historicamente no Brasil para controlar o crescimento populacional da comunidade negra e pobre – volta à cena política com a esterilização forçada e irreversível de Janaína Aparecida Quirino, que tem 36 anos e vive na cidade paulista de Mococa.

Ingriane Barbosa, negra, 30 anos, mãe de três filhos, foi mais uma vítima da criminalização do aborto, tema em debate no Supremo Tribunal Federal em audiência pública nos dias 3 a 6 de agosto. Um assunto que diz respeito às vidas de todas nós, pois somos também aquelas que mais morrem por aborto inseguro.

Assistimos também a grave violação dos direitos humanos com a Intervenção Militar que ocorre nas favelas do Rio de Janeiro. Foi neste contexto que vimos uma parlamentar eleita ser executada de forma sumária com o trabalhador Anderson Gomes. Marielle – negra, lésbica, parlamentar socialista, ex-moradora na favela da Maré e liderança destacada na defesa dos direitos humanos e denúncia do genocídio – foi assassinada porque ousou erguer a voz em favor de sua comunidade. Quatro meses depois do assassinato, é inaceitável não haver nenhum resultado que aponte os culpados.

Em São Paulo, seguimos também com a militarização das nossas vidas. A violência policial assassinou de maneira cruel Luana Barbosa, mulher negra, lésbica, na frente de seu filho. Afamília segue lutando no judiciário pela condenação dos assassinos.

As mães, companheiras, filhas, irmãs, mulheres vítimas diretas dos assassinatos de jovens assassinados pela polícia do Estado, além da dor da perda têm que arcar com todo o custo social dessa violência e continuam na sua dolorosa busca por justiça e contra a impunidade.

Outra questão cara às mulheres negras é o fato de assistirmos a cada dia o nosso direito à livre religiosidade ser atacado. Não só há terreiros sendo constantemente depredados, como tentam aprovar uma lei que proíbe o exercício pleno dos seus ritos de abate religioso, num total aviltamento à nossa cultura e religiosidade.

Por todo esse cenário de desmontes e negações de direitos estamos dizendo em alto e bom som que não vamos deixar que continuem nos aniquilando.

Repudiamos como o governo em suas diferentes esferas é negligente com as nossas vidas. O incêndio e desabamento do edifício Wilton Paes de Almeida no Largo do Paissandu, no dia 1º de maio de 2018, mais uma vez revelou a falência da política de moradia na cidade. Até hoje há famílias acampadas nas ruas pela total
negligência do Estado. Não podemos esquecer mais esse crime. As famílias merecem exercer o direito à moradia digna.

Não aceitamos o retrocesso dos nossos direitos duramente conquistados!

Os golpistas impõem uma reforma trabalhista que acaba com a CLT. Mesmo sendo a maioria das trabalhadoras informais, com dificuldade de acesso a benefícios trabalhistas, as mudanças nas leis de trabalho nos atingem porque quando todo mundo perde, nós negras e indígenas perdemos ainda mais.

Querem também acabar com o direito à aposentadoria e nos fazer trabalhar até morrer. O golpista Temer tentará votar a Reforma da Previdência e a velhice de negros e negras, já tão precária, estará em piores condições.

Além disso, querem desengavetar a redução da maioridade penal para aprisionar mais e mais nossos jovens, numa política de encarceramento que é parte do genocídio do nosso povo. Com a PEC 55, congelaram por 20 anos o investimento no SUS, onde 7 em cada 10 usuários são negras e negros. Tentam exterminar comunidades
quilombolas e nações indígenas para tomar as terras para o agronegócio.

Não permitiremos nenhum retrocesso! Nenhum direito a menos!

Vamos ocupar todos os espaços nossos por direito!

Vamos garantir o direito de sermos livres e donas de nossos corpos, sem nenhuma interferência de fundamentalistas de qualquer natureza. Marchamos pela construção de um novo marco civilizatório que seja antirracista, anticapitalista e que contemple as mulheres negras de forma estrutural. Não há mudança real que
não passe por nós, mulheres negras!

Vamos fazer valer nossa luta pelo Bem Viver, aclamado por mulheres negras de todo Brasil na Marcha de 2015.

Somos Dandara, Aqualtune, Tereza, Luiza Mahin, Carolinas, Chicas, Laudelinas, Samoas, Luanas, Cláudias, Katianes, Matheusas e Marieles.

Somos luta e resistência, e uma sobe e puxa a outra, na certeza de que quando uma negra avança, ninguém fica para trás!

25 de julho: Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha
Dia de Tereza de Benguela

Rumo ao Encontro Nacional de Mulheres Negras 30 anos

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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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