No croquete de galinha, a cebola batidinha
Poema culinário: No croquete de galinha, a cebola batidinha… Dentre a vasta obra do inigualável poeta Carlos Drummond de Andrade, encontra-se essa singeleza de poema culinário, ensinando com graça e leveza a produzir uma delícia de croquete de galinha, em em homenagem à culinária brasileira, rica em cores, sabores, texturas e misturas. Quer tentar?
Por Carlos Drummond de Andrade
No croquete de galinha,
A cebola batidinha
Com duas folhas de louro
Vale mais do que um tesouro
Também dois dentes de alho
Nunca serão espantalho.
(Ao contrário)
E três tomates,
Em vez de causar dislates,
Sem peles e sem sementes,
São ajudas pertinentes
Ao lado do sal, da salsa,
(A receita nunca é falsa)
Todos boiam na manteiga
De natural doce e meiga.
E para maior deleite,
copo e meio de leite.
Ah, me esqueci: três ovos
Bem graúdos e bem novos
Junto à farinha de rosca
(Espante-se logo a mosca)
a pitada de óleo,
Sem se manchar o linóleo,
E mais farinha de trigo…
Ai, meu Deus, deixa comigo!
SOBRE DRUMMOND
Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira, Minas Gerais, em 31 de outubro de 1902, e faleceu no Rio de Janeiro, em 17 de agosto de 1987. A esse mundo, veio como membro de uma família de fazendeiros decadentes.
Estudou em Belo Horizonte e em Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, com os jesuítas, que o expulsaram do colégio por “insubordinação mental.” Voltou para Minas e, em Belo Horizonte, começou a escrever para o Diário de Minas, onde trabalhavam vários membros do incipiente movimento modernista brasileiro.
Formou-se em farmácia na cidade de Ouro Preto em 1925. Fundou, com outros escritores, A Revista, que, apesar da vida breve, foi importante veículo de afirmação do modernismo em Minas.
Ingressou no serviço público e, em 1934, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde foi chefe de gabinete de Gustavo Capanema, ministro da Educação, até 1945. Passou depois a trabalhar no Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e se aposentou em 1962. Desde 1954 colaborou como cronista no Correio da Manhã e, a partir do início de 1969, no Jornal do Brasil.
O modernismo não chega a ser dominante nem mesmo nos primeiros livros de Drummond, Alguma poesia (1930) e Brejo das almas (1934), em que o poema-piada e a descontração sintática pareceriam revelar o contrário.
O poeta trabalha sobretudo com o tempo, em sua cintilação cotidiana e subjetiva, no que destila do corrosivo. Em Sentimento do mundo (1940), em José (1942) e sobretudo em A rosa do povo (1945), Drummond lançou-se ao encontro da história contemporânea e da experiência coletiva, participando, solidarizando-se social e politicamente, descobrindo na luta a explicitação de sua mais íntima apreensão para com a vida como um todo. A surpreendente sucessão de obras-primas, nesses livros, indica a plena maturidade do poeta, mantida sempre.
Várias obras do poeta foram traduzidas para o espanhol, inglês, francês, italiano, alemão, sueco, tcheco e outras línguas. Drummond foi seguramente, por muitas décadas, o poeta mais influente da literatura brasileira em seu tempo, tendo também publicado diversos livros em prosa.
Alvo de admiração irrestrita, tanto pela obra quanto pelo seu comportamento como escritor, Carlos Drummond de Andrade morreu no Rio de Janeiro RJ, no dia 17 de agosto de 1987, poucos dias após a morte de sua filha única, a cronista Maria Julieta Drummond de Andrade.
Estilo Literário
Carlos Drummond de Andrade, assim como outros modernistas, adota a abordagem libertadora proposta por Mário de Andrade e Oswald de Andrade, utilizando o verso livre para demonstrar que a forma poética não precisa seguir um metro fixo. Dentro do modernismo, pode-se distinguir duas correntes: uma mais lírica e subjetiva e outra mais objetiva e concreta. Drummond se alinha com a segunda corrente, ao lado de Oswald de Andrade.
Embora seja frequentemente considerado o primeiro grande poeta a se destacar após o movimento modernista, isso não o caracteriza estritamente como um modernista. Ele herda elementos como a liberdade linguística, o verso livre e as temáticas cotidianas do modernismo.
Affonso Romano de Sant’ana analisa a poesia de Drummond com base na relação “eu x mundo”, dividindo-a em três abordagens:
- Eu maior que o mundo — evidenciada por uma poesia irônica
- Eu menor que o mundo — refletida na poesia social
- Eu igual ao mundo — englobando a poesia metafísica
No campo da poesia política, o contexto da Guerra Fria e do neocapitalismo influencia a obra de Drummond, que retorna à secura de seus primeiros versos. Em “O Observador no Escritório” (1985), ele revela uma visão filosófica que mistura marxismo e espiritualismo. Na década de 1980, o erotismo começa a ganhar espaço em sua poesia.
Fonte: Releituras