Ocupação de áreas de risco para moradia triplicou no país desde 1985
Áreas de favelas são destaque nesse crescimento
Por Bruno Bocchini/Agência Brasil
A ocupação para moradia de áreas reconhecidamente suscetíveis a inundações, deslizamentos, secas, estiagens e outros desastres climáticos aumentou 2,8 vezes no período de 1985 a 2022, ano em que 123 mil hectares de áreas de risco do país passaram a estar ocupadas.
Os dados, divulgados nesta terça-feira (31), são de levantamento do MapBiomas, rede colaborativa formada por organizações não governamentais (ONGs), universidades e empresas de tecnologia.
O crescimento da ocupação de territórios de risco foi proporcionalmente maior nas áreas de favelas, onde esse aumento foi de 3,4 vezes no período de 1985 a 2022. De acordo com o levantamento, em 2022, 3% da área urbana total estava em regiões de risco, considerando uma média nacional. Nas favelas, esse percentual chegou a 18%.
Entre as situações de risco avaliadas estão os fundos de vales, ou seja, áreas que ficam a, no máximo, três metros de distância vertical do rio mais próximo. O MapBiomas identificou 425 mil hectares de áreas urbanas nessa situação, mas que ainda não são oficialmente reconhecidas como áreas de risco. Dois terços (68%) desta ocupação ocorreram nos últimos 38 anos. De acordo com o levantamento, a ocupação muito próxima aos leitos quadruplicou de 1985 a 2022.
“Os dados mostram uma situação preocupante, onde as ocupações precárias e com maior vulnerabilidade a eventos extremos cresceram rapidamente. Enquanto as áreas urbanas no Brasil triplicaram desde 1985, a ocupação muito próxima aos leitos dos rios quadruplicou e a ocupação em áreas de alta declividade quintuplicou no mesmo período de tempo”, destaca um dos coordenadores de mapeamento de Áreas Urbanizadas do MapBiomas, Julio Pedrassoli.
Áreas íngremes
O levantamento avaliou ainda o cumprimento da lei 6766 de 1979, que proíbe ocupação e loteamentos em terrenos com declividade superior a 30%, suscetíveis a deslizamentos. Segundo o documento, 98,8% das áreas ocupadas cumprem a legislação. Porém, a ocupação das áreas proibidas aumentou 5,2 vezes desde 1985.
Fonte: Agência Brasil Capa: Prefeitura de Beruri
Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.
Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.
Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.
Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.
Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.
Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.
Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.
Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.
Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.
Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.
Zezé Weiss
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