“Os fios de cabelo dizem a verdade”

“Os fios de cabelo dizem a verdade”
 
Olhar para uma lagoa calma é o mesmo que se olhar no espelho e ver a profundeza dos olhares que se trocam: o olhar de si mesmo para consigo mesmo e dizer que valeu a pena a vida que se levou.
 
 
Isso é GRATIDÃO pela existência curta que se passa na Terra. É curvar-se à natureza e reconhecer a grandiosidade do modo análogo de uma célula humana e de um planeta.
 
Olhar para uma lagoa é reconhecer-se pequeno quando a humanidade é grande. É deixar rolar as lágrimas sufocadas pelo peso da escuridão, é buscar realmente o verbo, a palavra sufocada. Vivemos o estresse da dor, diz o condor. O humano virou covas abertas. As relações e os suores dos corpos amantes e febris esfacelaram-se ao chão.
 
E as partículas esvoaçantes que sobraram clamam unidade. Outros corpos saltitam no horizonte e pedem passagem. Os dedos dos pés querem voar como pássaros. As mãos se cruzam em nós sobre a lama. As cabeças rolam por fim. Os fios dos cabelos dizem a verdade: Tu trouxestes a desgraça, agora a leve embora por amor aos sapos.(…) “
 
Texto: Eliane Potiguara ( partícula de uma crônica urbana)
♦️Foto de Ana Marina Coutinho ( assessoria de comunicação da UFRJ)
🧵Vestido: presente da amiga Dilma Baldez confeccionado por Angela Amado
Pode ser uma imagem de 1 pessoa, joias e ao ar livre

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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação. 

Resolvemos fundar o nosso.  Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário.

Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também. Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, ele escolheu (eu queria verde-floresta).

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Já voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir.

Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. A próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar cada conselheiro/a pessoalmente (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Outras 19 edições e cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você queria, Jaiminho, carcamos porva e,  enfim, chegamos à nossa edição número 100. Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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