E tu choras…
E falas comigo como se acaso minha percepção à tua se assemelhasse quando, ao contrário, dela se interpõe, tal qual o esplendor do astro-rei dilui as sombras da soberana da noite. Não lembras que a mim pregastes a pecha da ilusão, ao lembrar do meu fascínio em transformar meu jardim? Esse fascínio, frágil criança, nada mais é que a certeza que o que é real ou não, a mim pertence a decisão. Eu não sonho, pequena, eu transformo… eu vivo… Mas não pense que o entorpecimento do sono não me conduz ao reino etéreo das visões, pois, dele também sou soberana.
Quando transmuto meu jardim em vermelhas cores, mostro que a mim pertence decidir o que é belo e agradável. Fria… insensível… Assim como devemos ser quando precisamos olhar a natureza de nosso ser, quando precisamos decidir que realidade queremos, que sopro nos moverá adiante…
Livre, menina… Veja… Livre…
Assim caminho sobre esse ladrilho de mosaicos existenciais seguindo adiante, sentindo a leveza do desapego pelo imutável, olhando para o infinito azulado com a inveja pela incapacidade de infligir seu desejo de muda-lo também, assim como faço com as delicadas rosas de meu jardim.
Feliz estavas enquanto outros tristes te olhavam? Essa liberdade vivida e a frágil alegria que me contastes em tua recente carta não suporta o amanhã que te esperas, onde os monstros que criastes em teu ser sempre buscam de ti chegar-se… E assim vivem todos que não entendem que o tabuleiro sobre o qual jogamos esse xadrez existencial devemos sempre ser a rainha, livres das limitações impostas pelo mundo.
Veja, criança… olhe com que cores pinto essa carta que agora te envio… sinta o leve perfume que preenche teu sentido… perceba sua suavidade ao toque de tuas pequeninas mãos… compreenda que nossos sentidos são os barões que nos governam, e sussurram aos nossos pensamentos o que ‘sonham’ ao nos transmitirem o que ao nosso redor preenche a nossa existência…
Me despeço exortando-te a pintar tua existência como bem desejares, pois, essa existência não é aquilo que nos impõe a tal ‘realidade’ que vemos, ou, pior, aquilo que nos obrigam a aceitar… Tudo é como o sentimento, querida alma: do amor ao ódio, o que os separa somente é a tênue definição do que amamos ou odiamos…
Volte ao seu espelho e lá admire-se, com a ilusão com que a visão promove a definição que seja você aos olhos de quem a observe (mesmo que seja você mesma), mas que não é capaz de definir o que você realmente é ou o que se esconde por trás do espelho de teus olhos…
Com apreço e sentimentos maternos,
R. de Copas,
10 Primidi, mês de Prairial”