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Supremo Tribunal Federal analisa isenção fiscal para agrotóxicos no Brasil

Supremo Tribunal Federal analisa isenção fiscal para agrotóxicos no Brasil

 Julgamento foi retomado na sexta-feira, dia 9, e deve seguir até o dia 16.

Por Maria Vitória de Moura/ Xepa

O Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a julgar a inconstitucionalidade da isenção fiscal de agrotóxicos em plenária virtual na última sexta-feira (9) e seguirá na discussão do processo até o dia 16, data final para os magistrados apresentarem ou modificarem suas manifestações sobre o tema, depositando no sistema seus votos a favor ou contra.

Hoje, a isenção tributária dos agrotóxicos possibilita que esses recebam  uma redução de 60% da base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), devido ao Convênio nº 100/97, do Conselho Nacional de Fazendária (Confaz).

Além disso, os venenos agrícolas também são beneficiados, desde 2004, pela Lei 10.925, de autoria do deputado Mario Negromonte (PP-BA), que prevê a isenção do pagamento de tributos como o PIS/Pasep. Já em 2011, foi estabelecida a isenção total do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de determinados tipos de agrotóxicos.

O que é isenção fiscal?

Quando existe um imposto, como o ICMS e outros impostos citados acima, mas há uma lei que exclui a necessidade de que alguns setores paguem essa tributação para a União, unidade federativa ou município, então esse produto está recebendo isenção fiscal. Ou seja, a região em que ele é isento de pagar imposto está deixando de lucrar com sua importação, exportação e comercialização. Acontece que a isenção não está prevista na Constituição Federal, sendo infraconstitucional. Assim, os casos e critérios dependem do valor, condição e/ou região.

Qual a análise do STF?

Em 2016, o Partido Socialismo e (Psol) iniciou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) questionando as cláusulas 1ª e 3ª do Convênio nº 100/97 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e o Decreto 7.660/2011, citados anteriormente como exemplos das isenções cedidas aos agrotóxicos no pagamento de imposto.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) questiona justamente a isenção de 60% aos chamados “insumos agrícolas”, como herbicidas, fungicidas e inseticidas (leia-se aqui uma longa lista de venenos).

A cláusula primeira também prevê que outros produtos agrícolas, como ração , se beneficiem da redução na cobrança do imposto. Já a cláusula terceira, estabele que o Estado e o Distrito Federal concedam redução da base de cálculo ou isenção do ICMS a todos os produtos citados no documento também nas comercializações internas.

Na ação, o Psol argumenta que, além de intensificar o uso de pesticidas, a isenção fiscal concedida pelo Estado fere o direito fundamental ao meio ambiente equilibrado, previsto no artigo 225 da Constituição Federal.

O partido destaca casos ligados a impactos ambientais e laborais, ressaltando que a exposição dos a esse tipo de produto nas lavouras prejudica a saúde da categoria, além de os venenos não oferecerem segurança à saúde dos consumidores finais dos alimentos.

O fator inconstitucional da isenção tributária aos agrotóxicos começou a ser julgado em 2020, mas foi paralisado na Corte no final do mesmo ano, quando o ministro Gilmar Mendes pediu vista e adiou a votação. Nesta semana, o caso volta a ser pauta entre os magistrados. Até o momento, o placar do julgamento está em um voto contrário à isenção, por parte do relator, Edson Fachin, e um voto favorável, de Gilmar Mendes.

Enquanto Fachin aponta a inconstitucionalidade da isenção e seus riscos à vida coletiva, Mendes disse que os danos à saúde “não devem ser desconsiderados, mas por si próprios são insuficientes para se declarar a inconstitucionalidade dos benefícios, porquanto produtos essenciais não são isentos de causarem malefícios à saúde”.

Essenciais para quem? 

O Tribunal de Contas da União (TCU) estimou que, no período de 2011 a 2016, apenas com a isenção do PIS/Cofins, relativas à alíquota zero para agrotóxicos, o Estado deixou de arrecadar um total de R$ 6,8 bilhões de reais. Números que se intensificam atualmente, principalmente pelo grande número de agrotóxicos que passaram a ser permitidos no Brasil durante o governo de Jair Bolsonaro (PL).

Naiara Bittencourt, então advogada popular da de Direitos e integrante da Campanha Contra os Agrotóxicos e pela Vida, alerta sobre o efeito cíclico das maiores aprovações de agrotóxicos e a queda na arrecadação de impostos, ressaltando, ainda, como esse fator incentiva o uso de venenos agrícolas.

“Funciona como uma cadeia cíclica: mais agrotóxicos e menos impostos, mais incentivo e benefício estatais, maior utilização e incentivo nestas áreas”.

Por outro lado, um  publicado na revista , de autoria de Wagner Soares e Marcelo Firpo de Souza Porto, revela que para cada dólar gasto com a compra de agrotóxicos no Paraná, são gastos U$$ 1,28 no tratamento de intoxicações agudas por veneno, aquelas que ocorrem imediatamente após a aplicação.

No cálculo, apesar de não serem considerados os gastos com saúde pública em decorrência da exposição constante aos agrotóxicos, como com o tratamento do câncer, é possível entender que, além de não contribuir para com os cofres públicos, os agrotóxicos geram gastos financeiros para o Estado, sem mencionar os gastos psicológicos e físicos daqueles atingidos pela arma química que compõe a no campo brasileiro.

Os possíveis desfechos 

Como colaboradores do processo judicial estão organizações ambientais e sociais, como a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e as organizações Terra de Direitos, Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, Abrasco, Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) e Fian-Brasil.

Já ao lado das isenções fiscais se concentram grandes organizações ligadas ao agronegócio, sendo elas a Associação dos Produtores de e Milho (Aprosoja), Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg), Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Federação das Associações de Arrozeiros do (Federarroz), Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e Crop Life.

Para que seja tomada uma decisão entre esses dois opostos, faltam os posicionamentos de outros oito ministros, uma vez que o STF tem atualmente dez membros.

O caminho até o dia 16 será de extrema importância para o futuro do Brasil, sendo essencial que a sociedade civil se faça ouvida em nome das principais vítimas das leis de incentivo aos agrotóxicos: os agricultores familiares, os trabalhadores do campo, os povos tradicionais rodeados pelas monoculturas transgênicas e envenenadas e o consumidor, que recebe em seu prato mais veneno do que pode imaginar.

Matéria postada originalmente em Mídia Ninja.

Fonte: Mídia Ninja. Foto: Reprodução/ Brasil de Fato. Este artigo não representa a opinião da Revista e é de responsabilidade do autor.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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