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“Terra Rasgada: como avança o garimpo na Amazônia brasileira”

“Terra Rasgada: como avança o garimpo na Amazônia brasileira”: Dossiê inédito explica avanço do garimpo na Amazônia

A área devastada por atividade nas Terras Indígenas na Amazônia cresceu 495%, entre 2010 e 2020, aponta publicação, que traz lista mecanismos de funcionamento de invasões e propostas de solução. A Aliança em Defesa dos Territórios, articulação política dos povos Yanomami, Munduruku e Kayapó, lança, nesta quinta-feira (16), o dossiê “Terra Rasgada: como avança o garimpo na Amazônia brasileira”.

Por Carolina Fasolo /Instituto Socioambiental (ISA)

O documento explica os mecanismos que promovem o avanço do garimpo, aponta as fragilidades institucionais da cadeia do ouro e lista uma série de medidas para combater a atividade ilegal.

A área ocupada pelo garimpo nas Terras Indígenas (Tls) na região cresceu 495%, entre 2010 e 2020. Os territórios Kayapó (PA), Munduruku (PA) e Yanomami (RR) são os mais impactados pela exploração ilegal de ouro, respectivamente.

“O relatório mostra como o governo pode realmente combater o garimpo, desde a proteção integral dos territórios indígenas, passando pela cadeia do ouro até chegar à comercialização”, afirma uma liderança Kayapó que pediu para não ser identificada por temer ameaças.

A Aliança, que atua desde 2021 contra o garimpo e outras atividades que destroem as TIs, esteve em Brasília, na última semana, para entregar o dossiê aos ministérios do Meio Ambiente e Mudança do Clima, da Justiça, dos Povos Indígenas e dos Direitos Humanos, à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai(, à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), à Polícia Federal e ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama). “Precisamos desse diálogo para construir os planos junto com o governo”, afirma Júlio Ye’kwana.

O estudo afirma que o atual boom do garimpo no Brasil foi “facilitado por medidas administrativas e decisões políticas do governo Bolsonaro” e é responsável por graves e massivas violações aos direitos humanos dos povos indígenas, “em especial dos Kayapó, Munduruku e Yanomami, como o direito à vida, ao território, à autodeterminação, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, à segurança alimentar e nutricional, à saúde e muitos outros”.

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A publicação destaca ainda que o comércio de ouro no Brasil configura um “estado de coisas inconstitucional”, já que as instituições com atribuição legal sobre a cadeia econômica do ouro (Agência Nacional de Mineração, Banco Central do Brasil e Receita Federal) foram omissas em sua atuação.

“A superação desse cenário demanda a coordenação entre estas instituições, aliada ao fortalecimento e à autonomia dos órgãos e entes responsáveis pela fiscalização, gestão e proteção territorial de áreas protegidas, especialmente no enfrentamento às lavras ilegais”, diz o dossiê.

Agência Nacional de Mineração

A Agência Nacional de Mineração (ANM) é apontada como um dos principais gargalos na cadeia de custódia do ouro. A autarquia é responsável por conceder a Permissão de Lavra Garimpeira (PLG), documento que autoriza a exploração de uma área pelo garimpo, limitada a 50 hectares para pessoas físicas e a 10 mil hectares, para cooperativas. No entanto, as falhas na fiscalização e a falta de um sistema eletrônico de controle permitem a atuação irregular de garimpeiros, que muitas vezes concentram um grande número de títulos minerários.O regime de PLG dispensa, ainda, a realização de pesquisa mineral prévia no processo de licenciamento, o que facilita a ocorrência de “garimpos fantasmas”, que servem para “esquentar” o ouro explorado ilegalmente em TIs ou Unidades de Conservação, por exemplo. Citando diligência do TCU divulgada em 2019, o dossiê aponta que a autarquia ocupa o 2º lugar no ranking dos órgãos mais expostos à fraude e corrupção no Brasil, ficando atrás somente da Agência Nacional de Transporte Terrestres (ANTT). 

Banco Central

O Banco Central (Bacen) é responsável por supervisionar as Distribuidoras de Títulos e Valores Imobiliários (DTVMs), as únicas instituições autorizadas a comprar e a revender ouro de garimpos, por meio dos Postos de Compra de Ouro (PCO), os braços das DTVMs nos municípios.  O dossiê aponta que o Bacen tem uma fiscalização falha e não sanciona as DTVMs envolvidas na compra de ouro ilegal. Apenas oito instituições têm PCOs ativos no país, e um terço desses postos pertence a uma única DTVM, a FD’Gold. “Maior instituição do ramo, a FD’Gold DTVM comprou entre 2019 e 2020 — segundo o MPF — 1.370 kg de ouro ilegal”. 

De acordo com o dossiê, o cenário de fragilidade institucional no Brasil é responsável por pela disseminação da exploração ilegal e da lavagem do ouro. Um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que analisou todas as permissões de lavra garimpeira no país apontou que nos últimos anos a produção ilegal de ouro superou o volume do metal explorado de forma regular.

“No Pará e no Mato Grosso, estados que concentram 94% das autorizações minerárias para garimpo no país, a comercialização de ouro ilegal e potencialmente ilegal superou a do ouro de origem lícita em 2019 e 2020 […] No mesmo período, o Pará produziu 30,4 toneladas de ouro de garimpo, dos quais ao menos 22,5 toneladas (74%) foram extraídas de maneira irregular. Segundo o estudo, Itaituba, Jacareacanga e Novo Progresso responderam por 85,7% do comércio de ouro clandestino no mesmo período”.

Soluções

“O garimpo tem solução, mas ela tem que ser sistêmica e em múltiplas escalas, como é o problema. A gente quis apresentar um apanhado de medidas básicas para enfrentar o problema, tanto no âmbito da proteção integral de terras indígenas como na cadeia do ouro”,  afirma Luísa Molina, pesquisadora do ISA responsável pela organização do dossiê. 

A publicação lista uma série de ações para reprimir o avanço do garimpo
ilegal e impedir novas frentes de invasão, implementar mecanismos de fiscalização e controle já existentes e criar novos mecanismos para impedir a atividade. O dossiê reforça que é necessária uma articulação interinstitucional no âmbito do poder público para garantir a efetividade dessas ações.

“Não basta simplesmente colocar equipes em campo e destruir maquinário: deve-se efetivamente desarticular a organização criminosa por trás do garimpo e inviabilizar a utilização de equipamentos logísticos que dão apoio ao ilícito”, ressalta o documento.

Carolina Fasolo – Jornalista. Fonte: Instituto Socioambiental (ISA). Foto: Fred Mauro/ISA. Este artigo não representa necessariamente a opinião da Revista Xapuri e é de responsabilidade da autora. 


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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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