Um 5 de junho melancólico

Um 5 de junho melancólico –

Por Jaime Sautchuk –

O Dia Mundial do Meio Ambiente, celerado em 5 de junho, este ano foi o mais melancólico das últimas décadas no Brasil. Não houve motivo algum a se comemorar, muito ao contrário, o governo que aí está, desde o golpe de 2016, só nos tem dado motivos a se lamentar, inclusive neste aspecto da vida nacional.

O ambiente do qual fazemos parte, onde está a qualidade de vida da nossa gente, nem consta da pauta de preocupações desse governo federal. Na contramão do verdadeiro progresso, o que se vê a todo instante são novas medidas que visam apenas aumentar o lucro de uma elite que não se envergonha de entregar os recursos naturais da nação aos grandes conglomerados internacionais.

Se as cidades brasileiras dependerem de planos e recursos federais pra cuidarem da mobilidade urbana, do saneamento básico, da saúde e educação públicas, estarão cada vez mais perdidas. O neoliberalismo que voltou a reger o Estado brasileiro não quer saber dessas questões e propõe cada vez mais cortes no orçamento desses setores. E conta com o apoio de fatia majoritária do Congresso Nacional pra implantar suas medidas. Só a bancada ruralista, porta-voz do latifúndio, domina 40% da Câmara Federal.

No que se refere aos recursos naturais é à agropecuária, então, a porteira está escancarada. No ano passado, foi aprovada a proposta do governo de redução do tamanho da Floresta Nacional (Flona) do Jamanxim, no Sudoeste do Pará, que significa sua extinção, na prática. E estão em andamento processos de quebra do contingenciamento de áreas riquíssimas em minérios, que serão entregues a grandes empresas.

São ações que sugerem a retirada de florestas nativas, contrariando o que vinha ocorrendo há mais de uma década, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), de São Paulo. São informações obtidas a partir de satélites operados por esse órgão.

A taxa de desmatamento registrada na Amazônia brasileira em 2015 foi 71% inferior à registrada em 2004, ano em o Governo Federal pôs em operação o Plano para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm), coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA). Ou seja, desde aquele ano vinha ocorrendo uma queda real no desmate, ano após ano.

Jamanxon Bernando C%C3%A2mara 1024x683ANOTE AÍ:

Jaime Sautchuk – Editor da Revisa Xapuri. Trabalhou nos principais órgãos da imprensa, Estado de SP, Globo, Folha de S.Paulo e Veja. E na imprensa de resistência, Opinião e Movimento. Atuou na BBC de Londres, dirigiu duas emissoras da RBS.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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