Cachinhos Dourados da Espiritualidade Alheia

Cachinhos Dourados da Espiritualidade Alheia

Que tal parar de bancar a cachinhos dourados da espiritualidade alheia? 

Por Raial Orotu Puri 

Este texto é em parte uma continuidade de conversas anteriores, e em parte uma sobreposição de pequenos incômodos que sinto com alguns discursos dentro da temática indígena, seja ela acadêmica, seja ela desde a perspectiva da causa, da , e, claro, do ponto de vista do ‘caminho sagrado’.

Bom, na perspectiva do Sagrado não pretendia me adentrar, pois penso que o Jairo já tem escrito profunda e brilhantemente sobre isso em vários textos, e realmente, em matéria de Sagrado Indígena eu penso verdadeiramente que não é o tipo de tema que eu considere um território a respeito do qual eu possa discutir com propriedade. Mas acontece que aqui eu queria exatamente sobre ter ou não propriedade, e sobre a enorme distância que existe entre conhecer um pouco e dizer que sabe e pode ensinar sobre seja lá o que for.

Como não deve escapar a ninguém, eu não gosto de falar desse tema. Mas acontece que, volta e meia, eu acabo recebendo mensagens de amigos que me encaminham links para casos e mais casos de desrespeito, apropriação e falta de noção. Algumas vezes, o assunto é puxado com ‘você viu isso?’. Bom, algumas dessas coisas são bem problemáticas, e eu gostaria de ser capaz de ‘desver’ a maioria delas… Mas ainda não aprendi essa capacidade, e por essa razão, vou vendo, me incomodando, e escrevendo a respeito.

Gostaria apenas de ressalvar que não se trata de tentar colocar meu posicionamento sobre os demais, e querer decretar como verdade absoluta aquilo que penso. (Esse é, aliás, o tema central dessa discussão). Entendam o que vou escrever como a minha verdade particular. Quem quiser que faça a sua a partir de seus próprios pressupostos…

Só para contextualizar em termos de metáfora, quero começar recordando uma passagem interessante que me voltou à após testemunhar o que a princípio devia ser uma conversa e acabou sendo um embate contraproducente. Não posso citar exatamente se a passagem metafórica foi algo que li ou assisti em vídeo, porque ultimamente tenho tido um monte de lapsos de memória (voltarei a isso daqui a pouco!), seja como for, o que me recordo da metáfora será suficiente à economia do argumento deste texto.

Enquanto eu ouvia o não-diálogo, minha memória me levou à narrativa de um enxadrista narrando como ele se aperfeiçoou no xadrez: Segundo ele, a conselho do seu pai, desde se acostumou a competir sempre com oponentes mais experientes que ele, pois assim, ele conseguia ser sempre desafiado a melhorar suas estratégias, a fim de conseguir superá-los.

Cachinhos Dourados da Espiritualidade Alheia

Ele acrescentava que ele precisou de muita paciência para lidar bem com as derrotas frequentes, mas que isso lhe deu mais expertise, e também calma para saber que, por melhor que ele pudesse vir a ser, sempre poderia encontrar alguém que poderia derrota-lo. Isso o elevou a primeiro do ranking, mas, a despeito disso, ele dizia, ele sabia que mesmo essa posição era provisória, pois em algum lugar ele sabia que existia alguém que estava treinando para ser melhor que ele.

Voltando a tratar dos meus esquecimentos, já li uma explicação que associa isso a estresse, ansiedade e outros males que acabam por afetar a memória; também já li uma explicação que diz ser isso um recurso natural do cérebro, de descartar o excesso de informações inúteis, para reter mensagens essenciais. Acho que meu caso é uma mistura dos dois, mas de todo modo, penso que faz parte do processo de aprendizado de qualquer um o não tentar dominar o todo de tudo. Assim como é natural se interessar mais por um determinado tema em detrimento de outros.

Há, no entanto, certo perigo no aprendizado por preferência, que é justamente o de dedicar-se apenas a coisas mais fáceis, e fugir do que é difícil, do que pode envolver esforço, frustração e derrotas constantes. O contrário disso é a estratégia do Xadrez supracitada.

Lidar com a frustração de derrotas constantes é realmente um desafio e tanto para crianças, – e, eu diria, também para alguns adultos – já que perder não é necessariamente uma coisa prazerosa, e na a ideia de que ‘o importante é competir’ nem sempre é muito pacificada.

De todo modo, eu penso que esta estratégia é muito boa mesmo, não só para xadrez, mas para diversos outros campos da existência: No tabuleiro de Xadrez e em muitas coisas da vida, ganhar se aprende perdendo. E é somente após apreciar todas as estratégias de jogadas que podem dar errado que você consegue enxergar onde estão os lances que conduzem aos ‘xeque-mate’.

Não tenho dúvida do quanto de tentativa e erro está encoberta nos métodos que compõe a indígena: saber a época certa de colher a taquara que faz o cesto, pressupõe que alguém precisou testar mês a mês, dia a dia, a flexibilidade correta do tipo de cipó ou palha eleito como o melhor (e a escolha do melhor também possivelmente exigiu testes, tentativas e erros), e certamente foram muitos os cestos descartados por estarem mau acabados ou quebradiços antes de se chegar à sua conformação perfeita.

E sim, eu sei, há sempre aquele artista miraculoso que faz coisas que parecem descidas do céu de tão perfeitas. Eu não teria coragem de perguntar, mas sei lá, pode ser que a Amélia Marubo ou a Maria do Socorro Huni Kui tenham, quem sabe, feito alguma coisa que era apenas “mais ou menos” antes de chegar ao nível de impecabilidade que hoje suas peças possuem… talvez…  E talvez, o que as tenha levado à perfeição que hoje vejo em seus trabalhos tenha sido a persistência em sempre se aperfeiçoar e tornar sua arte cada vez mais irretocável.

Ou talvez não, e elas já tenham nascido com essa capacidade divina da perfeição… Mas acontece que entre todos os gênios que fazem tudo perfeito, há um monte de gente que precisa suar muito. Há muita gente que vai precisar fazer e refazer, que vai precisar se aperfeiçoar, e que vai precisar sempre reconhecer que precisa melhorar muito para poder ser pelo menos bom no que faz.

É normal que antes de qualquer obra magistral aconteça algum esboço, da mesma forma que é absolutamente compreensível que qualquer conhecimento pronto e acabado prescinda aprendizado. Se isso é uma verdade nas artes, ela também o é em todo processo de conhecimento, seja de si mesmo, seja de outra coisa qualquer. E, no fim das contas, sempre vai haver algo a ser ainda aprendido, um grau a ser alcançado, um nível a ser subido numa escala de conhecimento. E, como disse o enxadrista, em algum lugar sempre haverá alguém que pode ‘ganhar’ de você em termos de conhecimento, e que terá algo a te ensinar. Por esta razão, estar aberto a aprender, ficar calado e escutar é imprescindível.

E é justamente por conta disso, me vejo um tanto incomodada com as auto afirmações de sabedoria plena, dessa negativa a receber explicações importantes sobre determinados assuntos e contextos, desse discurso do ‘você não tem de me dizer isso, eu sei disso tudo’.  Sabe? Disso tudo? Tudo?

Assim, vamos tentar deixar umas coisas bem combinadinhas aqui? Primeiro: Você não sabe tudo, eu não sei tudo, ninguém sabe tudo! E isso é normal e deveria ser tranquilo, não? Eu acho sinceramente que a vida de alguém que bem antes de estar morto já tivesse a chance de saber tudo seria um tanto chata, porque desde o meu ponto de vista aprender é uma parte indissociável da vida humana e, nesse sentido, eu creio que o vedar-se a aprender com o outro é, além de uma falta de abertura ao diálogo, também uma forma de matar aos poucos a curiosidade, a criatividade e a intuição e, por conseguinte, matar a natureza humana em você mesmo.

E quando estamos falando de contextos indígenas, estamos falando de um mundo inteiro, ou melhor, de mais de 300 mundos inteiros! Com línguas, costumes e culturas próprias. E, neste caso, é bastante pretensioso que alguém se pretenda conhecedor ‘de tudo’, notadamente em se tratando de alguém que não é ‘nativo’ destas culturas. Porque até mesmo quem é nativo precisa aprender. Imagina quem não é…

Cachinhos Dourados da Espiritualidade Alheia

Talvez isso seja o que mais deixa o ar da Academia tão rarefeito: a quantidade de especialistas pretensiosos. Veja, não quero dizer que todo mundo na Academia se comporte assim, mas acontece que tem um número meio grande de gente por lá que realmente acredita ser o suprassumo da sabedoria, mas que, trocando em miúdos ‘sabe de nada, inocente’, e pior: não apenas ‘fica lá’, mas muitas vezes invade outros espaços e usa seu currículo lattes para se arrogar no direito de definir coisas que não se definem pelo estudo acadêmico. E o “Sagrado Indígena” é talvez o exemplo mais sensível.

E chegamos aqui ao ponto sobre o incômodo da vez: Domingo passado uma amiga compartilhou comigo um link severamente ‘complicado’, –  para dizer o mínimo – apresentando um Curso Virtual de ‘Xamanismo’ (Aff!). A lista de professores era composta por meia dúzia de indígenas e mais de duas dezenas de brancos (Aff²!) especialistas em várias áreas acadêmicas e conhecimentos de diferentes povos tradicionais, ensinando sobre ‘xamanismo’ dentre outras aberrações híbridas de gosto duvidoso, que reuniam conhecimento indígena de povos diversos das Américas com técnicas importadas de diferentes partes do globo; vale acrescentar, na maioria dos casos, os professores da lista não pertencem às culturas que pretendem ensinar (Aff³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³³!)

Sei que a esta altura vai ter quem pergunte: e onde está o problema dona Raial Orotu Chata do Rolê Puri? Bom, o problema está neste caso em toda a parte, e está até em eu precisar explicar, mas que seja: para começar a conversa, curso virtual de ‘Xamanismo’ é o que há de mais avançado em termos de embuste! Simples assim!

Mas, a título de explicar melhor este ponto, vou tentar destrinçar essa questão termo a termo.
Primeiramente o ‘Xamanismo’… Já não é de hoje que muitos parentes têm comentado sobre o uso impróprio da palavra ‘Xamanismo’, um termo importado e que não tem relação com as práticas espirituais indígenas deste lado de cá do mundo. E aí já começa o problema, porque apesar de muitos de nós estarmos repetindo sem cansar que ‘xamanismo’ para nós não faz
sentido, o que não falta é acadêmico vindo para nós dizer ‘não, veja bem, você não tá entendendo…’

Não, fofo, você é que não está entendendo: ou você está falando da cultura específica da qual deriva esta palavra, ou seria trate de encontrar a palavra correta para falar, porque Xamanismo não está relacionado com a espiritualidade dos das Américas, até porque essa espiritualidade é tão diversa quanto são as culturas desses povos. E faça o favor também de não tratar como se fosse tudo a mesma coisa, não generalize, porque generalizar é reduzir, e usar de reducionismo para com povos que têm sofrido séculos de opressão é uma tremenda porcaria.

Em segundo lugar a proposta de curso virtual… Vejam, eu até sou super adepta de tutorial do youtube, mas né? A gente aprende através desse recurso a fazer artesanato, culinária, técnicas de reciclagem de materiais, economia doméstica, cultivo de hortaliças, construção, etc. Mas eu realmente não dou conta de conceber que se leve a sério uma proposta de aprendizado sobre coisas profundas como a dimensão da espiritualidade na base de EaD e vídeo tutorial!

Além disso, esse tipo de proposta tem um problema que eu já apontei em outros textos, e que eu vejo repetida nesses cursos: a mistureba. Tratam-se de diversos especialistas de generalidades, que pegam um pouquinho de cada coisa, e montam um conjunto, oferecendo-o a terceiros como técnica de ‘aprofundamento’ espiritual. Agora eu pergunto: Qual é a profundidade dessa generalização? Um centímetro?

Sabem, eu não digo que não possa acontecer de alguém se sentir bem e se dar por satisfeito com esse universo de generalidades, mas invariavelmente acabo vendo nesse tipo de coisa uma versão pós-moderna do conto da Cachinhos Dourados*, em que a personagem título acaba se dando muito mal pela imprudência de adentrar na casa alheia sem nem conhecer os donos da casa, e acaba se dando muito mal por conta dessa imprudência.

E o pior não é só a própria pessoa se enganar em achar que está fazendo uma grande coisa em brincar de supermercado com a espiritualidade alheia (a propósito, isso é apropriação cultural, sabiam?!), o pior mesmo é essa pessoa pretender ser de outros, em um âmbito tão sério como o da espiritualidade.

Cachinhos Dourados da Espiritualidade Alheia

Pra ser sincera, não vejo nisso nenhuma grande diferença entre esse tipo de prática e a dos pastores neopentecostais midiáticos. Não vejo, porque para mim os dois vendem ilusões e se aproveitam da inocência alheia de forma irresponsável. E, fazendo isso, podem não apenas colocar em risco aqueles que se os seguem, como também podem causar decepções, desinformação, preconceitos, e impedir que essas pessoas possam, quem sabe, alcançar de fato, um conhecimento real sobre práticas tão sérias e importantes que lhes são apresentadas de maneira superficial, incorreta e descontextualizada.

Igualmente, como dizem os usuários da ‘‘, é preciso beber para conhecer. Até aí tudo bem, mas vocês realmente acreditam que um único copo de bebida vai ser suficiente para conhecer tudo? E, ainda mais, para ensinar e ser ‘mestre’ para os outros? Puxado, né, minha gente?!

Eu não sei, mas acho que isso é derivado da vaidade da branquitude de achar que dá conta de tudo bem rápido, e é por isso capaz de virar professor doutor Ph.D. em espiritualidade indígena. E nisso eu sou realmente bem incisiva: Só que não. Só que nunca! Lamento, mas quanto a isso não tem discussão. E seria bom demais que vocês raion (não-índio) entendessem isso de uma vez.

Essa ‘Casa’ não é, e nunca vai ser sua, então faça o favor de ter respeito e só entrar quando, onde e SE for convidado. E sendo convidado, tenha mais respeito ainda e não saia por aí querendo ensinar e lucrar com algo que não te pertence, porque se você faz isso, só prova que não aprendeu porcaria nenhuma.

A título de arremate, quero citar uma frase que li nos tempos ainda da graduação, e que aqui bem se aplica por analogia: “Na vida daqueles que buscam a iluminação divina, há que se ser sempre aprendiz; todo aquele que neste campo se fizer de magistrado, encontrará, invariavelmente, a risada de deus”.

E para mim é ‘desse preço’ a coisa: Somos nessa vida só e tão somente aprendizes, e não importa o quanto cheguemos a aprender, sempre haverá ainda muito por ser aprendido. E tudo o que eu espero da vida é isso, ter disposição para aprender, aprender, aprender e continuar aprendendo, e a misericordiosa e perdoadora gargalhada Divina caso algum dia eu me ache qualquer coisa mais do que uma mera aprendiz.

 

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Cachinhos Dourados é um conto popular do folclore europeu. O primeiro registro escrito dessa história data de 1837 de autoria Robert Southey em seu livro “Os Doutores”. Nesta primeira versão, os três ursos têm a casa invadida por uma senhora, e não por uma garotinha. No entanto, a versão mundialmente conhecida é a uma garotinha de cabelos loiros que passeando pela floresta entra numa casa, experimenta de vários pratos de mingau até achar um que está em temperatura que lhe apetece. Depois ela resolve sentar e acaba quebrando uma cadeira. Por fim, ela adormece no quarto dos ursos, que chegam mais tarde à casa e encontram a bagunça feita. O final da história varia: em algumas, ela toma um grande susto e foge esbaforida, nas outras, ela acaba sendo morta pelos donos da casa. A moral da história é a advertência de se ter cuidado ao entrar em ambientes cujos donos e as regras você desconhece. Nada mais a propósito para falar de espiritualidade indígena…

 

Raial feliz

Raial Orotu Puri (Andréia Baia Prestes Puri) é graduada em Direito e  doutoranda em antropologia pela UFPR. Mora no Acre onde na Assessoria Jurídica da Federação do Povo Huni Kuin do Acre (FEPHAC).

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– Todas as imagens são pinturas de autoria do pintor brasileiro Maurício Negro, selecionadas por Jairo Lima.


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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