Procura
Fechar esta caixa de pesquisa.

MESTRE TUCUEIRO, MESTRE TUCUMÃ: O MITO DO TUCUM

Mestre Tucueiro, Mestre Tucumã, Rei Surrupiar: o do Tucum

No politeísmo Piaga, o Mestre Tucumã é tido como a divindade que comanda toda a linha dos Surrupiras. Ele guarda as matas e castiga aqueles que entram sem autorização em seus domínios.

Por Causos Assustadores do Piauí

No Brasil temos mais de uma espécie de palmeira conhecida como Tucum. Uma delas é a Bactris setosa, cujos frutos possuem casca escura. Outra espécie é o Astrocaryum vulgare, que possui frutos com coloração mais alaranjada. Ambas as espécies estão sob a guarda de uma divindade conhecida como Mestre Tucum.
A palavra Tucum ou Ticum deriva do idioma e significa “agulha para costura”. A palmeira tucum é chamada assim porque os índios brasileiros utilizavam seus espinhos para costurar.
No politeísmo piaga, essa palmeira é morada do Mestre Tucum, que também pode ser chamado de Mestre Tucueiro, Mestre Tucumã ou Rei Surrupira.
O mito do tucum possui suas na da região amazônica. De acordo com a , no princípio do não existia a noite como a conhecemos atualmente, pois uma enorme serpente era responsável por guardá-la no fundo das águas. Por conta disso, a noite só poderia surgir quando a Cobra Grande autorizasse.
A serpente possuía uma filha que estava prestes a casar e, como presente, exigiu que a mãe lhe entregasse a noite, para que pudesse ter sua lua de mel. Mesmo relutante, a Cobra Grande resolveu atender ao pedido da filha.
Prontamente, o noivo enviou três mensageiros para que navegassem pelo rio até a morada da Cobra Grande, com a missão de trazer a noite aos noivos.
Ao chegarem à morada da Cobra Grande, os mensageiros receberam dela um coco Tucum, lacrado com cera de abelha. Sem muitas delongas, a senhora da noite disse apenas que naquele coquinho estava a encomenda que os mensageiros teriam que levar em aos noivos, não devendo jamais romper o lacre.
Quando retornavam da viagem, os três mensageiros começaram a ouvir muitos ruídos vindos de dentro do coco Tucumã. O mais curioso dos índios convenceu os outros dois a abrirem o fruto e verificarem o que tinha dentro dele. Os índios derreteram a cera e romperam o lacre, libertando a noite e fazendo com que o dia ficasse completamente escuro.
Ao perceber a atitude irresponsável e desobediente dos mensageiros, a filha da Cobra Grande ficou muito irritada, pois agora teria de descobrir uma solução para que a noite e o dia fossem separados novamente. Quando a estrela solar surgiu no céu, durante a madrugada, a noiva criou pássaros para que pudessem anunciar cada etapa do dia.
Para anunciar e fazer surgir o amanhecer, foi criado o pássaro Cujubim (Aburria cujubi). Para anunciar o entardecer e a chegada da noite, foi criado o pássaro Inhambu (Crypturellus sp.) E para castigar os três mensageiros desobedientes, a filha da Cobra Grande os transformou em macacos de boca preta e risco amarelo, a mancha escura representando a fumaça e a mancha amarela representando a cera que eles derreteram.
É justamente por isso que existe um Tucum de coloração escura e outro de coloração mais clara. Como receptáculo capaz de guardar imenso poder, o Tucum primordial foi alterado quando foi liberada a noite, dando origem às duas espécies mencionadas, a mais escura representando a noite, e o mais claro representando o dia.
1558059754301916
Além do mito amazônico que faz referência aos mistérios do Tucum, também encontramos no – com mais intensidade na região maranhense – o culto à família de encantados denominados Surrupiras, entidades que habitam os tucunzeiros e são intimamente ligados a essas palmeiras, se manifestando em ritos do tambor de mina, terecô e outros.
Os Surrupiras, quando se manifestam através dos médiuns, demonstram características de caboclos bravos, selvagens, por vezes com ações impactantes, manuseando sem receio as espinhosas folhas da palmeira tucum, ou até mesmo abraçando o caule espinhoso dessa palmeira. Quando se manifestam, vêm geralmente com a missão de quebrar-demanda, afugentando os maus espíritos e desmanchando os mais pesados feitiços porventura lançados contra seus devotos.
Dependendo da região onde se encontra culto aos Surrupiras, podemos identificar muitas entidades distintas ligadas a essa família, dentre as quais temos Índio Velho Surrupira, Vó Surrupira, Surrupirinha do Gangá, Trucoeira, Mata Zombana, Caboclo Tucumã, Tananga, Caboclo Surrupira, Nagoriganga e Zimbaruê. Também é possível encontrar a utilização do termo “Caboclo Surrupira’ como classificação genérica para denominar várias entidades com características comuns à família dos Surrupiras.
No politeísmo Piaga, o Mestre Tucumã é tido como a divindade que comanda toda a linha dos Surrupiras. Ele guarda as matas e castiga aqueles que entram sem autorização em seus domínios. Durante cultos piagas específicos, o Mestre Tucum pode irradiar sua energia através dos médiuns, mas sem incorporação direta. É celebrado geralmente junto aos caboclos guerreiros, sendo honrado também na festa das palmeiras sagradas, que ocorre entre setembro e outubro.
Fonte: Causos Assustadores do Piauí/O mito do Tucum (Mestre Tucumã)/
Texto: RAFAEL NOLÊTO (adaptado e alterado em parte por JOSÉ GIL BARBOSA TERCEIRO).  Ilustrações: DOUGLAS VIANA E RAFAEL NOLÊTO Fontes citadas na matéria: NOLÊTO, Rafael. Piaga: Deuses, Encantados, Espíritos e outros Seres Lendários do Piauí. Teresina: Clube de Autores, 2019. NOLÊTO, Rafael. A Magia das Palmeiras: Divindades da Mata de Cocais. Teresina: Clube de Autores, 2019.

 

 

Deixe seu comentário

UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

PARCERIAS

CONTATO

logo xapuri

posts relacionados

REVISTA

[instagram-feed]