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Mulheres tecem a resistência com palavras, cores e formas

Mulheres tecem a resistência com palavras, cores e formas

Mulheres tecem a resistência com palavras, e formas
Mulheres tecem a resistência com palavras, cores e formas – A dinâmica do acolhimento desatara muitos nós e instigaram treze Manas, ali presentes, compartilhar através de símbolos culturais propósitos de e resistência entrelaçados à  das Treze Matriarcas.
Por Fátima Guedes
O tempo histórico parece estagnado. Em sua rotineira indiferença, o institucional com suas iniquidades segue impotente para um interagir dialógico e socialmente transformador. Atrelados à tal virulência, cartéis patriarcais, em processo abusivo, miram categorias periféricas vulnerabilizadas; estas, por sua vez, reagem teimosamente por variados caminhos com foco no direito a uma existência com equidade. É o cotidiano da maioria das mulheres.
Em tons interventivos, canções de luz irradiam nosso isolamento físico (social não) e reconstituem memórias de resistência sempre atuais; sempre ativas. Voltemos, portanto, ao dia 8 de março (2020), Dia Internacional de Luta das Mulheres. Naquele dia, a Teia de Educação Ambiental e Interação em Agrofloresta construíra com parceiras solidárias a Chamada – Mulheres tecem resistência com palavras, cores e formas, unindo instituições, movimentos populares, artistas, educadores, academia, ecofeministas cujos reflexos alcançam instituições públicas essenciais no sentido do acolhimento aos permanentes clamores femininos invisibilizados em Parintins. O presente resgate intenta provocar ações comunitárias que interajam, de forma solidária, estado/sociedade civil.
Chamada trazia às mulheres e à comunidade referências sobre a data via rodas de escuta e acolhimento, de expressões em artes plásticas e poéticas femininas e de atividades lúdicas com o público infantil. Em natureza, a ação consolidava-se no acolhimento indistinto a todas as manas. Admitamos: as demandas femininas vão além dos limites de raça, credo, classe social, gênero… É em circunstâncias conflitantes que a maioria das mulheres dissipa sombras, escancaram calabouços existenciais… Emerge daí a autoconsciência do diverso/universo feminino: NÓS de um mesmo novelo. Assim, Nós se desfazem em abraços, colos, rodas de afetos, alicerces de lutas e resistências contra as perversidades patriarcais.

Tempo das Matriarcas

Inaugurou-se aquele dia com saberes, sabores e saúde*. A dinâmica colaborativa revivera a lenda das Treze Matriarcas relatada na Obra  O anuário da Grande Mãe, de Mirella Faur. Sob a maestria do abatazeiro*, Filho de Santo – José Lucas (nove anos) -, índias, negras, cabocas interagem e dissolvem barreiras temporais, classistas, racistas e religiosas. Na quebra de silêncios estruturais, mergulham na matrifocal androginia e sincretizam matizes culturais: em cada movimento, em cada fala reafirmam suas presenças no mundo, historicidades e jeitos amorosos de tecer a teia da vida. O ambiente, na totalidade, banhara-se na cadência mística do pequeno Lucas.
Sobre a Lenda, conta Mirella Faur: o início da vida na Terra fora de muita abundância e respeito mútuo entre os seres. Aos poucos, a ganância levou à competição, à agressão, desviando a Terra de sua órbita, gerando cataclismos e mudanças climáticas. Para a devida purificação, o destruíra esse primeiro mundo.
Para recriar o equilíbrio perdido, Mãe Terra e Vovó Lua intervêm com uma herança de amor através do coração das mulheres. Treze partes do Todo se manifestaram no mundo físico através das treze lunações com atributos de força, beleza, poder e mistério do . As treze Matriarcas interagiam potencialmente sensibilizando as mulheres a intervir de forma corajosa, justa e cuidadosa no reequilíbrio universal, a partir do alcance de sabedorias e de lições necessárias.
Cada Matriarca guardava no coração o conhecimento e a percepção; no ventre, a capacidade de gerar os sonhos. Assim, formaram o conselho – A Casa da Tartaruga. Cada uma dominava determinada verdade, simbolizada em cada uma das treze lunações. A cada reencarnação transferem a mulheres despertas toda a sabedoria alcançada dirigida ao cuidado com a Terra e com todos os seres indistintamente.
Todo esse saber tende contribuir com a autoconscientização, com a autoeducação e, assim, possibilitar o de dons, de projetos, de conhecimentos e saberes, e de trabalhos coletivos. Às mulheres particularmente, o saber dirige-se ao autocuidado, à autocuraalicerces da autonomia, da autorrealização com influências sobre a cura do mundo e da educação das novas gerações na reinvenção de valores e princípios opostos à lógica patriarcal.

Falas, Cores, Formas e Movimentos…

Mulheres tecem a resistência com palavras, cores e formas
Roda de mulheres incentiva o acolhimento (Foto:Floriano Lins/ Real)

A dinâmica do acolhimento desatara muitos nós e instigaram treze Manas, ali presentes, compartilhar através de símbolos culturais propósitos de luta e resistência entrelaçados à Lenda das Treze Matriarcas. Os propósitos decoravam os treze segmentos pentagonais da mandala colocada sobre o chão, imitando um casco de tartaruga. A mística atinge seu ápice com um solidário e emocionado abraço.
Os fazeres do dia avançam com a exposição de painéis – Mulheres desenham seus NÃOS. A intenção visibilizava o dia das Mulheres através da arte feminina e simultaneamente chamava a atenção da comunidade ao combate de toda forma de violência. Sete manas expressaram seus NÃOS: Malu Moura, Leonara Martins Oliveira, Patrícia Xavier Viana, Thalia Andrade dos Santos, Suame Alfaia, Ádria Helena Xavier Albuquerque, Míriam Carvalho…
Bem a propósito: as mídias locais referendam Parintins por seu potencial artístico da festa dos bois. Apesar das relevantes contribuições artísticas, e independente da festa, as mulheres continuam invisibilizadas. O espaço da maioria das manas ainda é a casa e os cuidados domésticos.
A exposição artística comprovara: somente sete manas artistas se atreveram expressar seus NÃOS sobre as malversadas paredes do que seria a casa da cultura dos parintinenses. Dotadas de sensibilidade, as sete manas transformaram NÃOS silenciados em arte irreverente; em rebeldia contra o determinismo patriarcal – cão de guarda do Estado de Direito. Em apoio, manos artistas expressaram também seus NÃOS à violência sistêmico-estrutural.
Assim, NÃOS artísticos aquarelavam de vida e de ecos libertários as paredes em ruínas da casa da cultura. Em paralelo, com palavras, gestos e afetos, a Roda (Fala Mana!), acolhia amplamente o diálogo e, assim, desfaziam-se NÓS estruturantes, classistas e autodepreciativos. Rompiam-se silêncios, medos, complexos, dores reprimidas… A Roda se revestia com alvores da Casa da Tartaruga e atraíra presenças significativas àqueles propósitos.
Com espontaneidade e sentido de pertencimento social, a Defensoria Pública, através das Defensoras, Gabriela Ferreira Gonçalves e Enale de Castro Coutinho, quebra todo um verticalismo institucional. As referendadas acolheram o universo/diverso feminino de Parintins, comprovando que é possível sim, as instituições do Estado Democrático de Direito responderem adequada e tempestivamente, conforme anúncio/denúncia de Norberto Bobbio, às demandas da sociedade civil, mesmo na contramão do dito e não feito. O Comissariado de Menores também quebrou muralhas: Chiara Regina Souza Farias e Elizane de Souza Brandão bradaram seus NÃOS à violência estrutural.
A presença comprometida do institucional potencializara a voz da comunidade com intervenções, desabafos, denúncias… Enfim, vivenciara-se ali um ensaio dialógico com propósitos democraticamente libertadores.
Pela primeira vez, as manas invisibilizadas de Parintins são ouvidas em seus territórios originais. Defensoria e Comissariado de Menores dissolveram o estruturalismo vertical materializando-se, assim, a democracia participativa. A partir daquela data, a Ilha Tupinambarana vislumbra um institucional inédito: escuta e acolhimento efetivo a gemidos ignorados.
Outros NÃOS ilustraram também aquele dia: feiras de artesanatos; de plantas medicinais, ornamentais e frutíferas; de alimentos funcionais e de fórmulas naturais de saúde. Ressoaram também ecos matriarcais na Tenda Ilza Azevedo*, com alinhamentos da Mãe do Corpo (ponto de conexão energética localizado três dedos abaixo do umbigo)benzeções e outros cuidados.
Em remate, atributos das Treze Matriarcas (sabedoria, poder, força, amorosidade, cuidado e beleza)refletiram-se no ambiente orientando possibilidades de equilíbrio comunitárioInesperadamente, um brado intervém sobre as ruínas da casa da cultura: era uma das manas, até então calada, cobrando respostas da Câmara de Vereadores sobre o Projeto de Iniciativa Popular que decreta o dia 8 de março, feriado municipal. O referido Projeto fora encaminhado àquela Casa, em 25 de novembro de 2019, dia mundial de combate à violência contra as mulheres, e vem mantido em silêncio.
vir-a-ser anunciado direciona-se aqui e agora a esperançamentos ativos. Enquanto a manazada* tecia resistências com palavras, cores e formas, maninhas/maninhos* dialogavam sobre o dia dedicado às mulheres. São as sementes entregues a nós para o hoje em movimento. No tempo certo florescerão, ainda que o solo se apresente estéril. Temos certeza!
Uma última exigência que se faz decreto na poesia de Ivan Lins: Quando colherem os frutos, digam o gosto pra mim.  

Verbos em ação

Mulheres tecem a resistência com palavras, cores e formas
Canal de diálogo em roda de conversa (Foto: Floriano Lins/Amazônia Real)

 

A interatividade das Defensoras com a comunidade, com as inesgotáveis demandas femininas aproximara outros acolhimentos, o Defensor Luiz Gustavo do Nascimento Cardoso. Dadas às incisivas atenções aos pedidos de socorro de companheiras vítimas de violência, Dr. Gustavo nos permite reconhecer sua presença em Parintins junto a Gabriela e Enale – canais de influências humanamente éticas, sobre instituições e demais serviços públicos.

Somente aqueles e aquelas que alcançaram o éter da ética humana são capazes de derrubar protocolos classista, conceituais e estreitar laços com a Justiça Social. O Educador Paulo Freire concebe a ética humana, como direito de ir e vir, de comer, de vestir, de dizer a palavra, de amar, de escolher, de trabalhar, de crer e de não crer, o direito à segurança e à paz.
Oportunamente, a TEIA transformara-se num canal dialógico com a Defensoria Pública. Dia após dia, initerruptamente, acolhe virtualmente sussurros disfarçados e reprimidos… São vozes sem rosto clamando por atenção, por escuta, por medidas protetivas urgentes, por alimentos, por devolução de documentos sob a apropriação indébita de parceiros, por direito ao teto usurpado, pela guarda dos filhos e etc. São Terezinhas, Raimundinhas, Dolores, Chiquinhas, Tunicas, Rosicas, Cecés, Sabazinhas e outras tantas mais…      
Tempos apocalípticos são favoráveis para mudanças estruturais. Lembrem sempre…
Falares da Casa
Abatazeiro – Tocador de abatá. Na Umbanda é responsável pela comunicação, através do ritmo, com os guias espirituais e o terreiro.
Manazadas – Coletivo de manas.
Maninhas/maninhos – Referência às crianças.
Saberes, sabores e saúde – Referência ao desjejum oferecido pela TEIA em ocasião de encontros.
Tenda Ilza Azevedo – Espaço de acolhimento da TEIA para benzeções, massagens e orientações sobre cuidados naturais de saúde. Homenagem à memória da aguerrida militante.
Fonte: Amazônia Real

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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