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O secreto beijo sagrado

O SECRETO BEIJO SAGRADO

O secreto beijo sagrado

O secreto beijo sagrado -Uma casa bem edificada está sempre norteada por um projeto. Contudo, o projeto ainda não é propriamente a casa, embora seja ele quem irá fazer a unidade da edificação em todo o seu conjunto. A casa só se tornará uma verdadeira habitação quando estiver com todos os seus cômodos edificados

Por Padre Joacir Soares d´Abadia 

De modo similar, a unidade da liturgia é a totalidade de sua celebração.  Tal como afirma a Constituição Apostólica Sacrossactum Concilio, “a Liturgia é simultaneamente a meta para a qual se encaminha a ação da Igreja e a fonte de onde promana toda a sua força” (SC, 10). Assim, as indicações litúrgicas preveem ações e gestos que compõem um conjunto cheio de ricos significados na vida da Igreja.

Dentro da liturgia, como parte das celebrações, existe a figura do beijo celebrativo, de grande significado, especialmente na Santa Missa. Muitas vezes, esse beijo é secreto, revelado tão somente ao mistério celebrativo.
Eis alguns momentos litúrgicos em que o beijo se faz presente:
1) Beijo da cruz interna da Estola
 
Enquanto o padre se paramenta, veste as roupas litúrgicas, ele o faz com a forma gestuária do beijo na cruz que se encontra na parte interna da estola. É a íntima unidade entre quem celebra com Aquele que é celebrado.
 
Depois que o sacerdote veste a casula, o mistério de unidade deixa de ser visível aos olhos humanos e passa a fazer parte do mistério envolto a toda a celebração.
 
2) Beijo de Saudação do Altar
 
Ao se aproximar do altar, o Presbítero, devidamente paramentado para a função que vai desempenhar, faz uma vênia, uma forma de saudação, que consiste em baixar a cabeça juntamente com os ombros em frente ao Altar. Em seguida, o sacerdote aproxima do altar e faz uma segunda saudação com o beijo, representando a intimidade. No beijo ao altar o sacerdote mostra-se disponível para a celebração como o canal da graça de Deus.
 
Oração do beijo do altar: “Nós vos suplicamos, Senhor, pelos méritos de vossos santos, (beijando o centro do altar) cujas relíquias aqui se encontram, e de todos os demais santos, vos digneis perdoar todos os nossos pecados. Amém”.
 
3) Beijo ao Santo Evangelho
O sacerdote beija o Evangelho, fazendo a oração: “Que pelas palavras do Evangelho nos sejam perdoados os pecados.”
 
4) Beijo da paz ou Saudação (Ósculo da paz)
Em quatro cartas paulinas, segundo Raymond Brown, (1 Tessalonicenses, 1 e 2 Coríntios, Romanos) e em 1 Pedro, a saudação deve ser feita com “um ósculo santo”.
Embora beijos fossem comum entre os membros da família, havia certa reserva quanto a beijos públicos na sociedade greco-romana. Na maioria das vezes, os beijos são descritos em cenas de reconciliação ou no encontro de parentes, após uma separação.
 
Durante seu ministério, Jesus e seus discípulos não trocam beijos, mas o uso que Judas faz do beijo no Getsêmani, num contexto em que ele não queria alarmar Jesus, pode significar que era uma saudação normal no grupo e, certamente, o beijo como cumprimento está atestado na Bíblia:
a) “Então Esaú correu-lhe ao encontro, e abraçou-o, e lançou-se sobre o seu pescoço, e beijou-o; e choraram” (Cf. Gn 33,4);
b) “Joab disse a Amasa: Como vais, meu irmão?, e tomou-o pela barba com a mão direita, para o beijar” (2Sm 20,9);
c) “Levantou-se, pois, e foi ter com seu pai. Estava ainda longe, quando seu pai o viu e, movido de compaixão, correu-lhe ao encontro, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou” (Lc 15,20).
 
Evidentemente, a comunidade cristã adotara o beijo como sinal de amizade; era santo porque era trocado entre os santos.
 
5) Beijo de despedida do Altar
O altar representa, desde tempos remotos, o próprio Cristo, “a pedra angular” (Ef 2,20). Beijá-lo é beijar o mistério da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus.
 
Quando o Sacerdote se despede do altar com um beijo, mais do que um ato respeitoso e de intimidade eucarística, é o momento em que se renova a vocação, pelo mistério celebrado; instante em que o Sacerdote é “alentado” por Jesus a permanecer fiel.
É uma fidelidade que remonta seu dia a dia com orações e súplicas, assim o beijo de despedida do altar se faz com a recitação da oração: “Seja-vos agradável, ó Trindade santa, a oferta de minha servidão, a fim de que este sacrifício que, embora indigno aos olhos de vossa Majestade, vos ofereci, seja aceito por Vós, e por vossa misericórdia, seja propiciatório para mim e para todos aqueles por quem ofereci. Por Cristo Jesus Nosso Senhor. Amém.”
 
6) Beijo à mão do Padre
Beijar a mão do Padre é um antigo costume que expressa respeito tanto pelo sacerdote, por ser um “homem de Deus”, quanto pelos sacramentos que essas mesmas mãos dispensam.
 
Pedir a bênção, beijando a mão do Padre, é confessar com um gesto a crença de que essas mãos foram, sim, ungidas para abençoar e fazer o bem. Se o próprio
 
Sacerdote impede que o fiel use dessa “profissão de fé”, talvez seja porque ele mesmo não tem convicção da sublimidade de sua vocação, uma vez que por tais mãos, ungidas pelo óleo do Crisma, Cristo desce a terra, eucaristicamente, compadecendo-se de nossa fragilidade.
Portanto, que o beija-mão continue sendo demonstração de nossa imensa gratidão, por um Deus que olhou para a débil humanidade e assegurou a dispensação dos mistérios sagrados por meio de homens, frágeis como nós, mas revestidos de um poder que vai muito além do que nossos olhos podem ver.
 
7) Beijo ao anel do Bispo
Ao beijar o anel do Bispo, demonstra-se respeito pela autoridade que ele representa, ao mesmo tempo que estupor diante do mistério da Igreja, da qual ele é Pastor. Beija-se, portanto, a Igreja como um todo, no sincero desejo de que haja um único beijo, uma única fé, uma única razão de existir, em Cristo Nosso Senhor.
 
Conclusão
Tudo na liturgia necessita seguir critério na sua execução. As ações Litúrgicas seguem com suas reservas até aos dias atuais sem deixar se corromper pelos seus executores.
 
Beijar o sagrado é ter o sincero desejo de nós mesmos fazermos parte deste sagrado, como numa tentativa penitencial de nos tornarmos menos indignos, de lábios menos impuros, a fim de nos aproximarmos do Sumamente Santo.
Beijar é demonstração de carinho? Mais que isso, é desejar, por meio tão fugaz, que a presença do outro se eternize. É amar sem palavras. É adiar despedidas, ou mesmo preparar para enfrentá-las.
 
Beijar é valer-se da tentativa de transmitir um pouco de si à pessoa amada, seja ela pai, mãe, irmão, filho, cônjuge ou amigo. É comunicar, de forma ágrafa: “Amo você”. “Não se vá”.  “Fique”. “Se cuide”. “Não morra…”
Em um só beijo, paradoxos brincam de nos fazer rir ou chorar sem, no entanto, retirar de nós o que há de mais belo, ao conferi-lo: nosso próprio coração. Oxalá a cada beijo sacro fôssemos pessoas melhores e mais santas!


Joacir filósofoBIBLIOGRAFIA

A BÍBLIA DE JERUSALÉM: nova edição, revista. 9. Ed. São Paulo: Paulus, 2000.
BROWN, Raymond E. Introdução ao Novo Testamento. Tradução de Paulo F. Valério. São Paulo: Paulinas, 2004.
Constituição Apostólica Sacrossactum Concilio, 10. Documento do Concílio Vaticano II. Paulus: São Paulo, 1997.
Ordinário da Santa Missa – São Pio V”
 
MONTFORT Associação Cultural
bra/documentos/decretos/ordinario_santa_missa/

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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