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UMA CARTA DE PAULO FREIRE PARA THIAGO DE MELLO

Uma carta de para

De: Paulo Freire
Para: Thiago de Mello

Eita, Thiago velho de , amigo-sempre, companheiro imenso, “de mesmo”, sorriso constante para o e para os seres humanos, capaz de conversar com uma flor, de entender os passarinhos e doar a vida bonita aos esfarrapados do mundo, aguente o barco, irmão.

Precisamos de você, da sua fé e coragem, do seu desprendimento, da sua – um grito de e de esperança, esperança na manhã de um amanhã de que homens e mulheres, oprimidos hoje, teremos de criar. Poeta que propõe aos oprimidos um discurso diferente – sua palavração.

Um discurso permanente, que abalará vales e , rios e mares e deixará atônitos e medrosos os atuais donos do mundo. Precisamos do menino que você guarda em você e que ajuda a ser mais homem o homem que você é.

Aguente o barco, querido amigo! Muitas madrugadas, cheias de orvalho macio, esperam por você. Andarilho da liberdade, você tem ainda muitos trilhos a percorrer; seus braços longos, muitas crianças a abraçar; suas mãos, muitos poemas a escrever.

Paulo Freire Thiago de Mello
O educador Paulo Freire (à esq., de óculos) e o poeta Thiago de Mello

Geneve, 13 de janeiro de 1974Carta que o educador e filósofo Paulo Freire (1921-1997), Patrono da Brasileira,  enviou ao poeta Thiago de Mello em 1974, de Genebra, na Suíça. A correspondência foi publicada no livro Poesia Comprometida Com A Minha Vida E A Tua Vida, de Thiago de Mello. Resgatada pelo Portal Vermelho nos 95 anos de Thiago de Mello, celebrados em 30 de março de 2021. 

UMA CARTA DE PAULO FREIRE PARA THIAGO DE MELLO
Foto: Prefeitura de Manaus

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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