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RECONSTRUIR O BRASIL E GANRANTIR DIREITOS

Reconstruir o Brasil e garantir direitos

Neste Dia Internacional contra a LGBTIfobia é preciso se amparar no projeto de reconstrução nacional. O objetivo principal é barrar os retrocessos que tanto afetaram a comunidade LGBTQIA+ nos últimos quatro anos.

Por Arthur Wentz e Silva/Revista Xapuri

Nas últimas eleições iniciou-se um caminho árduo de combates à extrema-direita no Brasil. Bolsonaro, derrotado nas urnas e ruas deste país, foi o principal opositor dos direitos LGBTQIA+. Juntamente a sua corja conservadora, seu discurso foi volátil contra a população, constantemente violentada neste país. Como se não bastasse sua inquisição aos nossos diferentes corpos, seu discurso odioso continua vivo dentro da sociedade. 

Nesse sentido, derrotar Bolsonaro foi o primeiro trabalho para podermos ocupar os espaços políticos. Ainda que seu projeto político de destruição tenha se afastado do cargo mais alto do executivo brasileiro, encontramos sua herança mais viva do que nunca. É preciso resistir! 

Parada do Orgulho LGBTQIA+ de SP. Foto: Bruno Santos/FolhaPress

São muitos os desafios que leva a população LGBTQIA+ a lutar nos tempos novos do Brasil. Com quatro anos de fascismo, as conquistas foram se desgastando, junto à democracia. Assim, nosso principal papel é reconstruir um país democrático e enfrentador das violências. Sendo assim, a unidade em prol de um país democrático, que evidencie nossos corpos como política pública de garantia de direitos é um caminho dado para superação dos desafios deixados pelo fascismo.

Mercado de Trabalho

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Protesto contra opressão a trabalhadores gays no 1º de maio de 1980 Foto: Reprodução/CartaCapital

O capitalismo é o principal nutriente para a não-garantia de espaços para minorias. Isso é evidente quando falamos de exclusão, violência e preconceito dentro das grandes forças motoras do mercado. A população LGBTQIA+ é constantemente afetada pelos problemas letais do sistema mercadológico.

Em suma, a pesquisa realizada pelo Center for Talent Innovation, com divulgação do Fundo Brasil afirma que 61% dos funcionários gays e lésbicas optam por esconder sua sexualidade dos cargos de chefia e liderança com medo da demissão. Para além, o estudo apontou que 33% das empresas do Brasil dizem não contratar pessoas LGBTQIA+ para cargos de chefia.  Acerca da violência, menciona que 41% das pessoas LGBTQIA+ sofreram algum tipo de discriminação em razão da sua orientação sexual ou identidade de gênero no ambiente de trabalho.

Essa violência fica ainda mais explicita quando tratamos da população transsexual. O mesmo estudo narra que 90% de travestis caem na prostituição, devido à ausência de oportunidades no mercado de trabalho, mesmo tendo uma excelente qualificação profissional. 

Paralelo a isso, o estudante de Letras na Universidade de Brasília (UnB) e estagiário, Fábio Teixeira menciona as dificuldades de constatação dos recortes de raça e sexualidade no mercado de trabalho: “Devido ao patriarcado heteronormativo, eu como uma pessoa preta e gay, sinto que minhas competências são subestimadas e até mesmo, anuladas perante o que é imposto como “politicamente correto” e “moral” em minha vida profissional. De uma forma nivelada, homens brancos que atendem ao estereótipo masculino normativo são vistas com mais “prestígio” ou dadas como mais competência em mesmas funções que eu mesmo ocupo.”

Segurança

Outro fator que é de fundamental discussão é a segurança. Sobretudo quando se trata da população trans e travesti. Os altos índices de violência exploram o despreparo do Brasil em lidar com isso. Sendo assim, enxerga-se um país que não é seguro para as comunidades que aqui vivem. 

Conforme as estatísticas do Observatório de Mortes e Violências contra LGBTI+ no Brasil, ocorreram ao menos 273 mortes violentas a pessoas LGBTQIA+ no país. Sendo, portanto, 228 assassinatos, 30 suicídios e 15 mortes por outras causas. Essas estatísticas apresentam que a cada 32 horas acontece uma morte violenta no Brasil.

Analogamente as pessoas transexuais, o Brasil segue liderando casos de assassinato. A pesquisa revela 167 casos, em que 159 envolvem travestis e mulheres trans, com 58% de composição das mulheres negras e oito homens trans e pessoas transmasculinas, também de maioria negra. 

Acesso à saúde 

Entendida como direito básico, a saúde ainda é um pilar fundamental na garantia dos direitos à população LGBTQIA+. Nesse parâmetro, o estigma ao HIV e a infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) criam um estereótipo, minimamente adotado pelos aparatos públicos a saúde.

Da mesma forma, no caso de travestis e transexuais, o uso do nome social é um a principal luta dentro de hospitais, clínicas e centros de atendimento. Ainda que o SUS tenha sido o primeiro lugar a adotar o nome social, as realidades se apresentam, em muitos casos, como opressoras. Outro fator que se destaca é a ausência de profissionais devidamente capacitados para lidar com a população trans. Dessa forma, tratamentos clandestinos severamente perigosos à saúde pública se tornam uma opção. 

Para pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) o caminho para resolução de demandas e problemas está na Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais. Lançada em 2011, apresenta como principal objetivo na garantia de melhor atendimento na rede pública de saúde.

Angélica Baptista, uma das pesquisadoras do estudo afirma: “A Política Nacional de Saúde Integral das Lésbicas, Gays, bissexuais, Travestis e Transsexuais, do Ministério da Saúde, precisa efetivamente ser colocada em prática. Temos vários estados da Federação que não possuem os conselhos previstos para atender a comunidade LGBTQIA+, conforme indicam dados do aplicativo Dandarah, fruto de projeto de pesquisa da ENSP. Esses conselhos têm o papel fundamental de fomentar uma rede de cuidados para aquela população”.

Acesso à Educação 

No que tange a educação, também se percebe um brusco afastamento desses grupos, principalmente no que se relaciona com pessoas trans e travestis. Segundo a V Pesquisa Nacional de Perfil Socioecnômico e Cultura dos (as) Graduandos (as) das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), realizada em 2018, apenas 0,3% da população universitária do país se identifica como trans.

A evasão também é um cenário real que prejudica e materializa essa construção de violência às pessoas LGBTQIA+. Motivos que levam a tal evasão trabalham com a ideia da violência e ausência de espaços acolhedores dentro de escolas e universidades.

Juntamente com isso, dados da Pesquisa Nacional Sobre o Ambiente Educacional no Brasil 2016, estudados pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) mencionam que 73% dos alunos LGBTs já foram agredidos verbalmente, tendo sua orientação sexual como motivação e 68% por conta de sua identidade de gênero.

Para Diego Ferreira, Diretor de Universidades Públicas da União Nacional dos Estudantes (UNE), o novo período é um período de sonhos, motivados pelo novo processo de reconstrução nacional. Reconhece na Universidade um mecanismo de apresentação real do que acontece na sociedade. Acredita que “um dos desafios é a institucionalização das cotas para pessoas transexuais, como uma medida paliativa, de ação afirmativa, conforme o papel que ela exercerá”. Afirmou ainda que “com a recomposição orçamentária e ampliação desse orçamento é possível sonhar com espaços de acolhimento para a população LGBT+ dentro das universidades.”  

O 17 de maio

Em 17 de maio de 1990, a homossexualidade deixou de constar como Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde. Antes da data mencionada, tal orientação sexual era tida como distúrbio mental. A data hoje carrega um sentido mais amplo, sendo reconhecida como o Dia Internacional Contra a LGBTIFOBIA.

Passados 33 anos de reconhecimento da homossexualidade, ainda há grandes desafios correspondentes aos quatro anos de desmonte das políticas de assistência à população LGBTQIA+.  Muitos destes desafios vem sendo superados, graças a grande iniciativa de diálogo por parte do atual governo. Entretanto, é preciso buscar mais, muito mais.

Em conclusão, Dani Balbi (PCdoB – RJ), primeira deputada estadual trans da ALERJ, afirmou em tweet na data de hoje (17) “o compromisso da mandata para seguirmos na luta contra a LGBTIfobia e para a luta por direitos para toda a população LGBTQIA+, a fim de romper esse ciclo de violência que permeia a comunidade e garantir uma vida digna e igualitária”.

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Dani Balbi. Foto: Reprodução/PCdoB

Balbi, também lembra que apenas em 2018 que a transexualidade foi deixada de ser considerada doença. Fazendo valer a importância das resistências que garantiram conquistas básicas para a população LGBTQIA+ no Brasil. Caso do enquadramento da LGBTIfobia como crime na Lei de Racismo (Lei 7.719/89).

Conquistas recentes 

A principal conquista da comunidade LGBTQIA+ se refere a derrota de Bolsonaro nas urnas em outubro do ano passado (2022). A construção da campanha de Lula, desde o início, colocou sob a ótica política, as várias mãos de minorias tão atacadas nos últimos quatro anos pelo projeto odioso na extrema-direita. Apesar disso, o discurso continua intacto e nomes da LGBTQIAfobia se tornam recorrentes nas discussões do Congresso Nacional.

Ainda que tivemos um grande número de parlamentares da extrema-direita com vertentes conservadoras terem sido eleitos no último pleito eleitoral, também tivemos grandes alcances na representatividade destes grupos. Ao todo foram 20 candidaturas eleitas. No Congresso, com a articulação de Duda Salabert (PDT-MG) e Erika Hilton (Psol-SP), temos hoje a primeira bancada trans na história da Casa legislativa.

Para além das conquistas legislativas, temos também o compromisso do Ministério dos Direitos Humanos. Em seu primeiro discurso, o ministro Silvio Almeida afirmou a importância de cada um dos grupos minoritários para o governo federal. Além disso, a articulação e criação da Secretária Nacional LGBTQIA+ vinculada ao Ministério e dirigida por Symmy Larrat.

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Symmy Larrat Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Já existente em algumas universidades do país, a articulação pela aprovação das cotas para pessoas transexuais e travestis já é uma luta recorrente no cenário político atual. Dani Balbi (PCdoB – RJ) protocolou, na ALERJ, projeto de lei que prevê cotas para trans e travestis nas universidades do Rio de Janeiro. No âmbito nacional, Erika Hilton (Psol – SP) faz pressão para que prática se torne uma realidade consistente.

Arthur Wentz e Silva: Estagiário da Revista Xapuri                Capa: Reprodução/Contraf Cut


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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