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A VAIDADE DAS NOSSAS VOCAÇÕES

A vaidade das nossas vocações

O autor, padre Joacir, escreve sobre vaidade e vocação e a estreita ligação entre esses polos. Esclarece que está dentro do homem são suas vaidades e suas vocações, fora dele está a aplicação e o refreamento de cada uma destas concupiscências 

Minha está enchendo, primeiramente pela vaidade. Aliás, sou uma presa desta vaidade que totaliza meu aprisionamento vocacional. Minha consciência, como minha vida, está como uma barragem, sempre enchendo, mas que precisa de vez em quando abrir as comportas. No meu caso a enxurrada que chega é de vaidade e minhas vocações.

Elas me chegam e vão enchendo minha consciência ao ponto de transbordar. Meu transbordamento se dá pela escrita, que age como um “abrir as comportas”. Sem escrever minha consciência fica cheia e pode arrebentar a barragem da minha vida. Por isso, a vaidade e minhas vocações estão me “enchendo”: _”que moral é essa que fica tão somente na pregação ou nas letras mortas da norma?”.

As Vaidades…

Caminhando sobre minhas vaidades sou empurrado ainda mais para elas. O que eu crio? As crises que as vaidades me marcam, me cercam e me imputam a . Assim, criando um interior onde as próprias vaidades me fogem às mãos, sou conduzido a cada uma delas. É óbvio que em cada uma sou atraído como um ímã é atraído pelo metal.

A vaidade do Trabalho

Do trabalho tiro a vaidade da ocupação, me ocupando de um serviço dispensado às pessoas que nem sempre querem a totalidade do meu ofício? É um trabalho que surge uma vaidade que resta tão somente a solidão da mesma. Quem quer norma para ditar seu agir?

Alguém se interessa seguir a norma que me levou para o aprisionamento e pode te levar também? Ela já está escrita em minha vida. Não precisa desejar a norma, apenas aceita como se fosse seu querer.

Sendo um trabalhador da população que vive em milhões de normas, sou ainda estreitado em apresentar uma norma que valha para milhões de indigentes que vivem na navalha dos seus ambicionares. Morrem querendo se envaidecer do trabalho que exercem buscando enriquecer.

A vaidade da riqueza

A riqueza é outra das minhas vocações. Já pensou nisso? Sua riqueza trás um grande sonho! Contudo, a sua riqueza te deu sonho ou realização do sonhado? Ninguém quer assumir que trabalha no desejo de juntar a riqueza para viver em paz, usufruindo a bonança que esta vocação pode trazer a cada um.

O rico lapida sua aptidão do trabalho dando à sua riqueza uma leveza vocacional. Não se apega ao que tem, porém consegue seu vocacionado. Não seja você um rico de trabalho triste.

Assim, como estou aconselhando, estou fazendo ao mesmo te dando norma, porque para viver a riqueza existe a regulamento do rico: ninguém ainda descobriu, no entanto, muitos querem saber! É uma norma que os levam sempre para a indigência, por isso tem que afligir ininterruptamente, sem muitas das vezes, usar sua fortuna.

Atormenta, fica rico, mas não pode usufruir da vocação vaidosa de ser abastado, senão fica pobre. Ou tem medo de ficar carente outra vez. O endinheirado trabalha por temor: _receia de ficar pobre. Neste caso a vocação cultivada na riqueza é o medo, o qual tira a probabilidade do conhecimento. Aliás, esta é mais uma vaidade, a do conhecimento.

A vaidade do conhecimento

O conhecimento não tem limites. Quanto mais sábio for o homem, mas vaidoso ele será, e, com isso, consegue lapidar suas demais vocações. Não vou discorrer muito sobre o assunto do conhecimento porque não tenho necessidade de expor a ninguém uma vocação que está dentro de cada um. Contudo, posso afiançar, com certeza, que o conhecimento te ajuda a viver bem a sua vaidade do lazer. Seja vaidoso em esmero vivendo a vida; curta cada segundo no lazer que a vida propõe.

A vaidade do lazer

O lazer age na vida do homem como as idas e vindas das águas do mar que parece querer dizer alguma coisa. Não já estavam falando com seu movimento das marés? Penso que não. Ou posso objetar que ele comunica de alguma maneira aos viventes, neste caso, principalmente, aos humanos. Nem que eu quisesse poderia escutá-lo. Seu marulho imiscui no movimento.

Se perde sendo uma música ao pé do meu ouvido como se falasse mais do que seu movimento, cada vez mais agitado pelas marés. Sem falar nada o mar vai se afastando dele mesmo. Suas ondas, cada vez mais, aproximam-se da areia como se fossem amigos íntimos.

Até poderiam ser íntimos um do outro! Pois o mar sem a areia não se completa, da mesma forma que não dá para imaginar a areia sem o mar. O mar aproxima da areia como se estivesse em uma fome constante. A areia é gradativamente engolida pelas águas do mar.

Você ainda se lembra que eu disse anteriormente que o lazer vicia? Será que falei alguma asneira? Vejamos, então! Olha aqui o vício se manifestando! É uma vaidade que fascina muito rápido este lazer. Ficar sem fazer nada e se sentir ocupado é muito asqueroso. Para quem não pode ficar sem fazer nada é chato ver alguém em pleno gozo da tranquilidade.

Nem caldo de cana caiana poderia tirar o sossego do lazer; suco de umbu pode dar sabor ao seu lazer se ele te é atraente. Porém, o melhor sabor era mesmo se ocupar em não fazer nada. Tanto que a preocupação com um caldo de cana que seja ou mesmo um suco já poderia tirar a tranquilidade do lazer que se ocupa em não fazer nada.

Ter o nada como ocupação é perder a hora de se ter hora para seguir sua ocupação. Só pode ter certeza do sabor de não fazer nada, se vive ocupado com as ondas do mar, com a areia que é engolida pelas águas, com os sucos, os caldos de cana e com as músicas que parecem falar tudo que o tempo queria dizer e o mar não foi capaz de externar tudo que poderia expor.

O lazer no tempo

Assim o tempo vai passando! E, eu, você e todos mais estamos vivendo com os direitos que o lazer pode proporcionar. Uma chora, outra pode passar correndo atrás de uma bola murcha; um adulto tenta se divertir jogando peteca e outros tantos se ocupam com seus diferentes infortúnios.

Alguém conversando um pouco com seu amigo, mas não consegue, por um instante mínimo de tempo, desgrudar do . Todavia, todos estão cultivando suas vaidades que alega mais prazer em viver, e, porque não, cultivando a vaidade do lazer? O certo é que todos estão vivendo, porém, claro, cada um a seu modo. Todos permitem, tão somente isso, ver o tempo passar na leveza do prazer de viver o lazer de uma vida ocupada pelo seu próprio movimento.

No vai e vem das pessoas que passam para um lado e para o outro estão suas histórias que marcam a da vaidade do trabalho. Ninguém quer se dar ao luxo de se ocupar pela fadiga do trabalho, querem sim, a vaidade do lazer. Um descanso depois de uma longa vida sem fazer nada.

Cansa-se de não fazer nada, mas pode querer descansar por imaginar que cansa, cansar. Não trabalha, não faz nada e ainda se sente ocupado pelas suas vaidades era como se escutasse a vida te chamando: “venha!”. Mas ir pra onde? Para a vida, obviamente. No entanto, viver o lazer já não é experiênciar a vida? A resposta é: _”nem sempre!”.

O “nem sempre” é porque para se viver de forma intensa é tão simples, basta perpetrar o que se precisa arranjar no momento que se necessita executar. Se é pra sorrir, externe sua mais escancarada alegria, se for cantar, escolhe a melhor melodia para que suas cordas vocálicas vibrem com sua serenata.

Cante a melhor música! A canção que está dentro de você, ela tem a harmonia perfeita. Se vai usar uma roupa, como de repente você não gosta, mas pela imposição da sociedade é obrigado a usar, escolhe a indumento mais linda.

Tão simples assim! Viver no lazer da vida, basta viver a vida como ela lhe é exibida. O mar será sempre ele mesmo, com suas marés indo e vindo, e, de igual modo, a areia, ela sendo tragada pelo mar, enquanto tudo isso acontece, sua ocupação será com seu viver.

O vício da vaidade do lazer

Tenha cuidado somente por uma coisa: a vaidade do lazer pode viciar; desvirtuando você elimina todas as vaidades do trabalho, da riqueza e do conhecimento. Porém a última vaidade você não consegue excluir ao optar pelo lazer que é a vaidade . O porquê é fácil descobrir.

O Filósofo brasileiro, queridinho dos jovens que gostam das mídias sócias, penso que todos nós, Luiz Felipe Pondé disse que “A política é poder, e poder protege ou gera medo, e com o medo ninguém deve brincar” por isso que em Spinoza existem os afetos tristes e afetos alegres, poucos conseguem romper essa barreira de afeto triste que é o medo. Aqui temos uma forte “crítica spinoziana, herdada da epicurista, tem força na medida em que as religiões sempre foram, e continuam sendo, ferramentas políticas” (Pondé).

Deste modo, mesmo que alguém opte pela vaidade do lazer vai estar sempre certo que supera os limites impostos pela política, sejam eles supressão de valores ou valores em demasia que normalizam todo um comportamento de uma sociedade.

As vocações ao sexo, ao poder e ao dinheiro

Tirando todas as vaidades dos homens como: trabalho, riqueza, conhecimento, lazer e política o que restará é se converter às suas vocações ao sexo, ao poder e ao dinheiro. Para ficar claro que há uma diferença entre riqueza e dinheiro. O homem é vocacionado ao dinheiro, mas se envaidece pela riqueza. A riqueza está na vaidade.

Desta moral que não atinge ninguém que minha consciência tem asco. Uma moral normática que fica nas rubricas das leis e nos discursos vazios de significado.

O que está dentro do homem são suas vaidades e suas vocações, fora dele está a aplicação de cada uma destas concupiscências. A norma refreia, como se espera, a vocação ao sexo. Nascemos, todavia, desta vocação humana sexual, mas o poder como vocação escapa ao homem quando sua escolha é tão somente o orgulho miserável de acumular dinheiro.

Diante disso, a consciência será sempre a advogada do homem que lhe defende cada vez que ele se deixa levar pela concupiscência de suas vaidades e de suas vocações. É vaidoso quem se deixa dirigir pelas suas vaidades, mas também pode ser soberbo cultivando suas vocações ao sexo, ao poder e ao dinheiro. Se vive bem quem faz a opção de não ser nem orgulhoso e nem vaidoso, apenas um político com todo o domínio que fundamenta sua prática.

O horror 

Para Georges Bernanos no seu romance “Sob o sol de Satã” diz o homem tem uma vocação natural: “vocação natural para a mentira”. Ele mesmo dá um tom de horror da eternidade do mal quando descreve no seu “Diário de um pároco de aldeia” um padre no vício do alcoolismo, no leito de morte, o qual ainda consegue ver a totalidade da graça.

A revolta proposta por este horror da eternidade do mal se dá também porque, na verdade, “sua vida apenas foi tragada pela deformação maior do mal: a vaidade”. Ele era, portanto, vaidoso ao mentir que vivia com medo de viver na verdade do seu horror?

Viver uma ocupação

Viver é, antes de tudo, ver o tempo passar. Têm pessoas que vivem apressadas, elas veem o tempo passar depressa. O que conta no tempo é como se consegue estar nele e ser livre para viver própria vida. Ao viver muito se diz que viveu tempo demais.

Não está errado esta afirmação até porque a mesma frase pode ter um sentido contrário na medida que a vida corre risco de deixar de existir, ou, para afirmar o viver, ela está prestes a deixar o tempo. Viver pouco é experimentar pouco o tempo.

A vida é um movimento do viver no tempo. Quem vive, vive num tempo, e, com o mesmo tempo, seu viver vai se esvaindo do tempo, assim se perde a vida.

O que cada um está fazendo agora é viver, ou seja, cada pessoa está ocupando o tempo que tem, está vivendo. Quando a pergunta feita seja esta: a pessoa tem quanto tempo de vida? A resposta será: tem tantos anos de vida. A quantidade de tempo vivido é a idade da pessoa que vive no tempo.

Não se vive ocupado do tempo, mas sim ocupa-se o tempo que a pessoa tem ao seu dispor, o qual ninguém sabe se tem muito tempo para viver ou não. Cada pessoa tem seu tempo para viver. Algumas vivem e se ocupam com o tempo, outras, todavia, vivem ocupadas com as preocupações da vida, esquecem de se ocupar com a própria vida.

Os graus da ocupação

Há, contudo, os graus de ocupações tanto quanto se consegue viver em contato com as coisas que ocupam a vida humana. No entanto, apenas duas sejam verdadeiramente necessárias, uma vez que também abraça todos os degraus das ocupações internas e externas.

A ocupação que lhe dá prazer em viver é se ocupar com seu viver, ocupar com a sua própria vida interior onde os afetos se encontram trazendo alegria de todas as ações externas. Se não está vivendo bem a sua ocupação interior, o externo fica cheio de medo, dúvida, rancor e ressentimento, um verdadeiro marasmo de incertezas.

Conclusão

Viver, principalmente, se ocupando no tempo que te resta faz experimentar uma paz benfazeja de interior que se manifesta no seu tempo de vida. Viver é cultivar nossa vaidade e nossa vocação no tempo; é ver o tempo passar, seja ele breve ou não. Assim, seja vaidoso no tempo que te resta para viver sua vocação, mas saiba também que sua vaidade pode abreviar seu tempo de vida.

Padre Joacir d’Abadia, filósofo, autor de 12 livros. Especialista em Docência do Ensino Universitário, Arraial d’Ajuda-BA, 30 de Outubro de 2020.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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