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Antes que o político e o econômico engulam o científico

Antes que o político e o econômico engulam o científico

Ninguém, em sã consciência, é capaz de negar as mudanças nos ritmos climáticos, que vêm acontecendo nas últimas décadas.

Por Altair Sales Barbosa

Esse fenômeno é percebido pela mudança dos índices pluviométricos, que demonstram certa irregularidade de ano para ano, mudanças de temperatura, mesmo nas faixas tropicais da Terra, onde os meses correspondentes aos hipotéticos verões se apresentam mais amenos e os que correspondem à hipotética primavera, muito quentes. Da mesma forma, os meses de maio, junho e julho, outrora muito frios na região tropical, de certa forma, apresentam uma notável irregularidade térmica de ano para ano.

Locais no hemisfério Sul onde eram registradas esporadicamente as tempestades tropicais ou mini furacões passaram a conviver com esses fenômenos com maior frequência. Fatos que mostram mudanças nas configurações do regime climático, pelo menos nas últimas três décadas. Porém, ao longo da história bem recente do planeta Terra, foram registradas mudanças climáticas globais, algumas de longa duração, outras de curta duração. Isso é difícil de se compreender, por aquelas pessoas que cultivam a ideia de que a Terra é um planeta estático. Poucos, ao raciocinarem sobre o assunto, entendem que a Terra, ao invés de estática, é um planeta dinâmico.

Alguns apontam que as mudanças climáticas atuais são consequências do aumento de CO2 (dióxido de carbono) na atmosfera, provocado principalmente pela queima de combustível fóssil, e apontam o índice de 350 ppm (partes por milhão) como limite, para evitar um colapso do clima atual.

Entretanto, os estudiosos da história evolutiva do planeta Terra sabem que, em concentrações normais, o CO² é fator primordial para o metabolismo das plantas e para um padrão climático global sem provocar entropia. O difícil é estabelecer o nível de padrão ideal para cada faixa latitudinal do Planeta.

Os dados obtidos atualmente apontam que as concentrações do CO² a nível global passaram de 272 ppm, na aurora da era pré-industrial, para 346 ppm, em 1986. Todavia, no Cretáceo, período geológico de grande diversidade da vida na Terra, a concentração de CO² era dez vezes maior. A causa desse aumento é atribuída às atividades vulcânicas; à medida que essas atividades diminuem, vai diminuindo também a concentração de CO² na atmosfera.

Outro fator relevante a ser colocado para facilitar as reflexões refere-se às oscilações de concentração de CO² durante a glaciação Pleistocênica. Essas concentrações atingiram o máximo de 350 ppm antes do começo do último período interglacial, ou seja, ainda dentro de um estágio glacial conhecido como Ilinoian na América do Norte, e Riss na Europa, que em seguida sofre um recuo, dando origem a um interglacial, que é seguido pelo avanço glacial, conhecido como Wurm na Europa e Wisconsin na América do Norte. No final desse estágio, mas ainda no glacial, as concentrações de CO² atingem 225 ppm e, logo em seguida, acontecem o final da glaciação Pleistocênica e o início do Holoceno, época geológica que estamos vivendo e que alguns estudiosos consideram como um interglacial.

Análise isotópica do carbono contido em anéis de crescimento dos troncos de árvores indicou variações nas taxas de CO² na atmosfera da Europa no curso dos últimos 15 séculos. Entre o ano 1000 de Nossa Era e o ano de 1010, a taxa passou de 230 ppm para 310 ppm, ou seja, índice semelhante ao atual; por sua vez, os 230 ppm ocorridos não correspondem a um período glacial. Todavia, no último estágio glacial do Pleistoceno, a quantidade de CO² era a mesma de mil anos atrás, na Europa. 

Nos compêndios de Arqueologia Histórica da América do Norte, sempre se encontram citações de que o século XVI foi um período crepuscular na história europeia do Novo Mundo, via conquista pelo Ártico. A fase de clima mais quente, que em primeiro lugar permitiu aos noruegueses colonizarem a Groenlândia, foi-se modificando ao longo dos séculos seguintes e essas colônias desapareceram, ainda no século XV.  Isso demonstra que a taxa de CO² e sua correlação com o clima ainda se encontra em fase muito especulativa.

O estudo do clima envolve incontáveis variáveis e nem todas podem ser mensuradas com exatidão. Até a década de 1980 os físicos defendiam a tese de que o universo era governado por leis precisas e estáticas, portanto os eventos ocorridos poderiam ser previstos; porém, a Teoria do Caos mostrou que os eventos universais podem ter ocorrido de modo aleatório. Por isso, previsões climáticas localizadas e temporais podem sofrer alterações repentinas, porque os mecanismos são imprevisíveis. 

Por essas razões, o estudo real das mudanças climáticas deve levar em consideração as causas naturais e as causas antrópicas, mas os fatos têm demonstrado um enorme abismo no grau de importância, a favor das causas naturais.

O Homem, como espécie Homo sapiens sapiens, já demonstrou ser capaz de alterar vários ecossistemas e até de criar ecossistemas artificiais, isso desde a Pré-História, até se incrementar nos tempos atuais. Mas daí a dizer que o ser humano pode controlar forças planetárias, ou mesmo forças universais, que de forma direta ou indireta influenciam fenômenos que ocorrem no planeta Terra, é tentar criar um antropocentrismo artificial e demonstrar uma visão míope acerca do que seja Meio Ambiente.

Não é mais lógico (nem menos) direcionar a narrativa histórica para o Homo sapiens sapiens, em vez de para qualquer outra espécie moderna. Um andorinhão com veia de historiador, justificadamente orgulhoso do voo como a óbvia realização suprema da vida, considerará os andorinhões, essas espetaculares máquinas de voar com suas asas arqueadas, que se mantêm no ar por um ano ininterrupto e até copulam em pleno voo, como o ápice do progresso evolutivo. 

australopithecus afarensis
Australopithecus afarensis reconstruction, Natural Science Museum -Shutterstock

Elaborando uma fantasia de Steven Pinker, se os elefantes pudessem escrever a história, talvez retratasse a anta, o elefante marinho e o macaco-narigudo como ensaios principiantes ao longo da estrada principal da evolução da tromba, dando os primeiros passos, sem que nenhum deles, sabe-se lá por que, alcançasse verdadeiramente o sucesso: tão perto, e no entanto tão longe. Os elefantes astrônomos talvez especulassem se em algum outro mundo existiriam formas alienígenas de vida, que teriam atravessado o rubicão nasal e dado o salto final para plena proboscitude.

Não somos andorinhões nem elefantes, somos gente. Quando, em imaginação, perambulamos por alguma época remota, é humanamente natural que reservemos uma curiosidade e um carinho especial por qualquer espécie, banal em tudo o mais, que naquele cenário antigo tenha sido nosso ancestral.  É difícil negar nossa humana tentação de ver nossa espécie particular com uma que está trilhando a estrada principal da evolução, enquanto as outras caminham pela margem, como elenco coadjuvante.

Nesse sentido, é muito importante o conhecimento científico das causas naturais e antrópicas, levando-se em consideração a seta do tempo, para um balanço que possibilite uma real compreensão dos problemas relacionados às mudanças climáticas. 

É necessário levar em consideração as mudanças climáticas de longo prazo e as mudanças de curto prazo. Para isso, é imprescindível compreender a história evolutiva do planeta Terra com todos os seus elementos: tectônicas de placas; correntes marinhas e suas correlações com as correntes aéreas; fenômenos localizados como El Nino e La Nina; erupções vulcânicas; teoria geral dos sistemas; teoria do caos; teoria de Milankovitch; fluxo de carbono;  correntes de convexão; com as plumas e as superplumas que ocorrem no manto da Terra e suas influências na temperatura do assoalho oceânico, e como consequência nas águas, alterando a direção e temperatura das correntes marinhas; as  influência solares e cosmológicas; E, por último, as ações antrópicas, que devem ser analisadas dentro de uma perspectiva de tempo da história da humanidade.

Ainda é preciso levar em consideração as atuações climáticas nas faixas zonais da Terra, definidas latitudinalmente, e ainda considerar que fenômenos de inversão de polaridade magnética também já aconteceram na história do Planeta.

Portanto, para o entendimento global do tema mudanças climáticas, por mais que pareça estranho, exige, na sua base, o conhecimento da teoria da Tectônica de Placas, cuja comprovação, a partir da década de 1960, veio revolucionar todos os conceitos que a humanidade tinha até então sobre os ambientes terrestres e marinhos, possibilitando uma visão holística dos fenômenos ambientais e ressaltando a ideia da temporalidade.

Com os conhecimentos gerados pela Tectônica de Placas, a Terra não poderia mais ser olhada como um planeta imutável, cujos continentes e bacias oceânicas permaneciam fixos ao longo do tempo. Em vez disso, os pesquisadores começaram a ver a Terra como um planeta integrado e dinamicamente mutável.

Por outro lado, essa teoria reforçou vários outros conhecimentos, como a dinâmica das correntes de convexão, que ocorrem no interior da Terra e que não só afetam o relevo, mas são capazes de mudar as temperaturas das águas oceânicas, que por sua vez influenciam de forma direta as correntes marinhas, que modificam a composição de umidade e temperatura das correntes aéreas.

O estudo da Tectônica de Placas possibilitou também o conhecimento de correntes oceânicas profundas, como é o caso da Corrente da Groenlândia, que se desloca lentamente numa grande profundidade e, por onde passa ciclicamente, altera a dinâmica das correntes marinhas, que, como já foi dito, traz consequências climáticas, uma vez que influenciam diretamente as circulações aéreas.

A teoria da Tectônica de Placas trouxe também conhecimentos sobre fenômenos como El Nino e La Nina, relacionando-os com os efeitos da rotação da Terra e os movimentos dos ventos oriundos do Leste, as monções que se formam no oceano Índico, bem como suas ações nos fatores climáticos das faixas tropical e subtropical do Planeta.

Também é importante ressaltar os avanços científicos oriundos da teoria da Tectônica de Placas e sua interação com a teoria de Sistemas, trabalhada pela Física Quântica, explicitando dados sobre a teoria do Caos, os conceitos de Seta do Tempo, dos Equilíbrios e Desequilíbrios, da Irreversibilidade, do Efeito Borboleta, dos Fractais e assim por diante. Elementos estes que são fundamentais para entender a globalidade dos fenômenos da atmosfera terrestre.

Portanto, falar de mudanças climáticas sem o mínimo de conhecimento desses pontos assinalados é jogar um caldo de falácias dentro do cadinho de dados que os pesquisadores a duras penas estão juntando.

altair salesAltair Sales Barbosa – Doutor em Antropologia / Arqueologia. Sócio Titular do Instituto Histórico e Geográfico do Estado de Goiás. Pesquisador Convidado da UniEvangélica de Anápolis.

Foto de capa: compartilhada pelo prefeito de Nova York, Eric Adams

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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