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BODARRADA: A POESIA LIBERTÁRIA DE LUIZ GAMA

Bodarrada: a poesia libertária de Luiz Gama 

A poesia de Luiz Gama se destaca por ir de contra o lirismo abordado na época em que viveu e principalmente pela forma ao qual o poeta de maneira satírica transplantava qualificativamente seu ideal a favor da cultura negra e da defesa desta identidade.

Por Brasil Escola

Em 1859, quando trabalhava na Secretária de Policia, publicou  pela tipografia Dois de Dezembro, de São Paulo, suas sátiras com o pseudônimo de Getulino. Seu livro, Primeira trovas burlescas, foi publicado em 1859, livro este que possui por assim dizer, um dos seus mais conhecidos poemas denominado “Quem sou eu?” popularmente  chamado de “Bodarrada”, nome este que vem da palavra “bode” que na gíria da época significava mulato, negro.  Nesta parte grandiosa do poema vemos uma critica consciente e não elitizada, nos versos:
“[…]Eu bem sei que sou qual grilo
De maçante e mau estilo;
E que os homens poderosos
Desta arenga receosos
Hão de chamar-me — tarelo,
Bode, negro, Mongibelo;
Porém eu que não me abalo,
Vou tangendo o meu badalo
Com repique impertinente,
Pondo a trote muita gente.
Se negro sou, ou sou bode
Pouco importa.  O que isto pode?
Bodes há de toda a casta,
Pois que a espécie é muito vasta.
Há cinzentos, há rajados,
Baios, pampas e malhados,
Bodes negros, bodes brancos,
E, sejamos todos francos,
Uns plebeus, e outros nobres,
Bodes ricos, bodes pobres,
Bodes sábios, importantes,
E também alguns tratantes
Aqui, nesta boa terra
Marram todos, tudo berra;
Nobres Condes e Duquesas,
Ricas Damas e Marquesas,
Deputados, senadores,
Gentis-homens, veadores;
Belas Damas emproadas,
De nobreza empatufadas;
Repimpados principotes,
Orgulhosos fidalgotes,
Frades, Bispos, Cardeais,
Fanfarrões imperiais,
Gentes pobres, nobres gentes
Em todos há meus parentes.
Entre a brava militança
Fulge e brilha alta bodança;
Guardas, Cabos, Furriéis,
Brigadeiros, Coronéis,
Destemidos Marechais,
Rutilantes Generais,
Capitães-de-mar-e-guerra,
— Tudo marra, tudo berra —
Na suprema eternidade,
Onde habita a Divindade,
Bodes há santificados,
Que por nós são adorados.
Entre o coro dos Anjinhos
Também há muitos bodinhos…[…]”
A poética de Luiz Gama transcorre por duas vias que o destacam como o verdadeiro poeta dos escravos, a primeira se refere pela aceitação de sua identidade étnica, demonstrando a importância e beleza de ser negro.
A segunda é a conscientização através dos versos contra o preconceito tanto dos que sofrem a ação e também dos que a praticam. Sua poesia não revela uma condição passiva, humilhada ou desgraçada, mas declara e informa de uma maneira equalizada, buscando não apenas deleites poéticos, mas atitudes que levassem ao leitor a ação diante do que lhe foi abordado.
Lutando inteligentemente contra um contexto histórico que marginalizava o negro e sua cultura, o poeta, jornalista e advogado Luiz Gama foi através dos seus versos e da sua luta um real representante da literatura negra no Brasil, exaltador de sua etnia, que ao contrário de muitos, que escondiam a origem negra, ele corajosamente a engrandecia com grande eloquência e personalidade.
O engajamento político e a estrutura semântica seja ela satírica ou lírica, dos versos de Luiz Gama, se mesclam produzindo uma poesia precursora daquilo que hoje se chama consciência negra, sua obra passa pelo processo de se viver na pele o que se escreve se baseando não apenas no que viu ou imaginou, mas naquilo que sentiu e viveu.  Outra característica marcante em sua obra é a de aceitar a visão preconceituosa do outro e torná-lo vítima do próprio preconceito, demonstrando que o âmbito em que ambos ocupam poeta e interlocutor, é semelhante.
Luiz Gonzaga Pinto nasceu na cidade de Salvador, estado da Bahia, em 21 de junho de 1830. Filho de negra Africana livre e de um fidalgo de origem portuguesa. Sua trajetória é marcada pela luta incansável pela libertação dos negros e por uma valorização efetiva a respeito da cultura negra no Brasil. Luis Gama morreu no dia 24 de agosto de 1882, em sua casa na Rua do Brás, a futura Rangel Pestana. O seu enterro foi considerado o mais solene e concorrido que São Paulo conheceu, no século XIX.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
GAMA, Luiz.(1830-1882) Primeiras trovas burlescas. Edição preparada por Getulino.3.
Ed. São Paulo :Typ; Bentley Júnior, 1904.

Publicado por: RUBENS SANTOS DO NASCIMENTO
Fonte: Brasil Escola/ com edições da Revista Xapuri

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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