Brasil comercializou 7,3 bilhões de m³ de madeira de espécies ameaçadas entre 2010 e 2020

Brasil comercializou 7,3 bilhões de m³ de madeira de espécies ameaçadas entre 2010 e 2020

Mercado nacional foi responsável por 94% do consumo, que representa 6% de toda madeira comercializada no período, mostra inédito.

Entre 2010 e 2020, o Brasil movimentou 7,3 bilhões de metros cúbicos de madeira de espécies ameaçadas, entre elas o pau-santo, acapu, angelim, cedro e itaúba, que possuem diferentes riscos de , mas todas com alta vulnerabilidade. O grande mercado consumidor é o próprio Brasil, que ficou com 94% da comercialização, sendo a maior parte destinada a produtos pouco nobres, como madeira serrada bruta.

Esses são alguns dos dados da 11ª edição do Boletim Timberflow, iniciativa do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), divulgada nesta segunda-feira (29).

Segundo o boletim, o primeiro mapeamento do tipo no país, o volume de madeira de espécies ameaçadas comercializado no período representa 6% do fluxo total das transações nacionais.

Ao considerar as madeiras da lista vermelha da União Internacional para da (IUCN), e também as listadas nos instrumentos legais e portarias nacionais entre 2010 e 2022, o Instituto chegou a 60 espécies em diferentes status de ameaça que ainda são comercializadas no Brasil.

Entre essas 60 espécies, 32 pertencem à categoria Vulnerável (VU), 27 à classificação Em Perigo (EN) e uma à categoria Criticamente em Perigo (CR).

Apesar do status de vulnerabilidade, as espécies classificadas como Vulnerável (VU) ainda podem ser exploradas em Planos de Manejo Florestal Sustentável, respeitando critérios de manutenção das espécies. Aquelas inseridas nas categorias Em Perigo (EN) e Criticamente em Perigo (CR) têm sua proibida.

“Esse esforço foi feito para chamar a atenção para o tema da comercialização dessas espécies madeireiras e propor, junto com todos os atores do setor, uma discussão de caminhos para a manutenção da e da integridade setor florestal”, explica a consultora da iniciativa de legalidade florestal do Imaflora, Maryane Andrade.

– destino da madeira

Segundo o boletim Timberflow, o Mato Grosso é o com maior produção de madeira de espécies ameaçadas – 55% do total -, seguido pelo Pará (25%) e Rondônia (10,3%). Os três são historicamente os maiores produtores de madeira da região amazônica.

A região Centro-Oeste do Brasil foi responsável por comprar 35% dessa madeira, seguida pela própria região Norte (27%). Apenas cinco espécies respondem por 82% da produção total: itaúba, garapeira, angelim, cedro, cumaru-de-cheiro e acapu. As quatro primeiras são classificadas como Vulneráveis (VU) e o acapu, como Em Perigo (EN).

De acordo com o , apenas o Acapu (Vouacapoua americana) representa 2,5% da produção total e acumula uma produção de mais de 188 mil m³ de madeira em tora, apesar da proibição de seu corte.  Além disso, sua madeira hoje é comercializada ilegalmente para usos ordinários, como matéria-prima barata para produção de cercas e mourões de fazendas na Amazônia.

A espécie Criticamente em Perigo que os pesquisadores identificaram ser ainda comercializada é o pau-santo (Bulnesia sarmientoi). Entre 2010 e 2020 foram comercializados 1,5 mil m³ da espécie.

O trabalho salienta que grande parte do volume comercializado de espécies Críticas (CR) e Em Perigo (EN) se deu nos anos que antecedem a promulgação da Instrução Normativa MMA n.º 1, de 12 de fevereiro de 2015, pelo IBAMA – que proíbe a aprovação de Planos de Manejo Florestal de espécies dentro dessas classificações. A partir de 2016, os dados indicam uma redução na exploração dessas espécies como um impacto positivo dos instrumentos legais, mas comprovam que a legislação ainda não foi suficiente – em 2020, foi registrada nos bancos de dados oficiais a exploração de 18.348,97 m³ de madeira em tora de espécies dentro das classificações CR e EN.

Madeira nobre subutilizada

Assim como o acapu, a 11ª edição do Timberflow identificou que a maior parte da madeira proveniente de espécies sensíveis (94%) é destinada a produtos pouco nobres, como madeira serrada bruta, que representa 60% dos produtos comercializados, juntamente com outros derivados como resíduos industriais, cavacos e lascas, toretes e mourões.

Por isso, o trabalho traz como recomendações o investimento no industrial do setor florestal, de forma a elevar o valor agregado dos produtos de madeira. 

Além disso, também é destaque o combate à ilegalidade, fraudes e ao vazamento para o mercado ilegal, por meio do refinamento da fiscalização por parte dos governos estadual e federal.

“Observamos que a proibição de exploração de determinadas espécies pouco adianta se não houver empenho no combate à ilegalidade. Embora não seja tarefa fácil, é possível reforçar medidas em prol de um setor florestal mais responsável e eficiente”, reforça Maryane Andrade.

Cristiane Prizibisczki – Jornalista. Fonte: O Eco. Foto: Madeira explorada na Amazônia – Arquivo Idesam. Este artigo não representa a opinião da Revista e é de responsabilidade do autor.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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