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Com ipês por todo lado, tudo é Brasília

Com ipês por todo lado, tudo é

A discussão se Brasília é todo o Distrito Federal ou limita-se ao Plano Piloto de Lúcio Costa parece mesmo sem sentido. Documentos e legislação que tratam da transferência, criação, formação e inauguração da nova capital do não fazem qualquer referência à separação entre Brasília e Distrito Federal. Distrito, cidade e capital são uma só essência. Indivisíveis e coincidentes.

Por Patrícia Doyle

A Lei nº 2.874, de 19 de setembro de 1956, determinou:

“Art. 1º A Capital Federal do Brasil, a que se refere o Art. 4º do Ato das Disposições Transitórias da Constituição de 18 de setembro de 1946, será localizada na região do , para esse fim escolhida, na área que constituirá o futuro Distrito Federal, circunscrita pela seguinte linha: (…).

Art. 33. É dado o nome de “Brasília” à nova Capital Federal.

Pode até ser que algumas circunstâncias tenham contribuído para embaralhar o entendimento. Por um lado, a capital foi projetada a partir de um Plano Piloto de Lúcio Costa, inspirado no urbanismo moderno de Le Corbusier, cujas influências remontam às -jardim de Howard, que preveem ocupação pouco densa e cidades-satélites. Por outro, no quadrilátero escolhido para abrigar o Distrito Federal existiam duas cidades remanescentes de , Brazlândia e Planaltina, e uma terceira se formou nos primeiros dias da construção, a Cidade Livre.

O Plano Piloto de Brasília em construção passou a ser ocupado antes da inauguração da capital. Uma grande invasão formada por migrantes fugindo da nordestina se formou nas cercanias da Cidade Livre e antecipou a criação de Taguatinga, em 1958. Ou seja, antes mesmo da inauguração da capital, havia cinco núcleos habitacionais distantes entre si. Talvez essas particularidades tenham reforçado a ideia de cidades e não bairros integrantes da capital do Brasil.

Lúcio Costa, em seu relatório do Plano Piloto, não faz qualquer referência à criação de “cidades”, apenas no último parágrafo do item 17 ele diz: “Deve-se impedir a enquistação de favelas tanto na periferia urbana quanto na rural. Cabe à Companhia Urbanizadora prover dentro do esquema proposto acomodações decentes e econômicas para a totalidade da população”.

Brasília, por tudo isso, é uma cidade peculiar que tem uma conformação urbana diferente das cidades conurbadas. É polinucleada, como bem definiu o geógrafo e emérito da UnB Aldo Paviani. Mas é, sobretudo, uma cidade constituída de bairros, embora distantes entre si, que reproduz as relações sócio-urbanas típicas das demais cidades brasileiras.

O antigo Distrito Federal era todo o município do Rio de Janeiro, com as mesmas funções de cidade-, com centro, bairros e subúrbios. Copacabana era tã do Brasil quanto Madureira. Bangu não era menos capital que Ipanema, assim como todos os bairros e subúrbios do Rio. Nem a distância geográfica, vencida em muitos casos pelos trens da Central, nem particularidades culturais, nem a situação socioeconômica impediam essa condição. Eram todos cariocas da gema, orgulhosos moradores da capital do Brasil.

Quem mora há mais em Brasília deve se lembrar que o núcleo central da capital era somente chamado de “Plano”. Moradores do Gama, Sobradinho, Taguatinga e demais localidades vinham ao “Plano”, porque estava implícito que tudo era Brasília. Em 10 de janeiro de 1960 houve uma divisão do território em circunscrições para fins de arrecadação de impostos, e uma delas era a do Plano Piloto. Já na ditadura, em 1965, o Decreto 456, que define as áreas metropolitanas de Brasília, criou a subprefeitura de Brasília.

Mas o equívoco se concretizou em 1990, com a mudança de nome da Região Administrativa I de Plano Piloto para Brasília. A Lei nº 110/1990, aprovada pelo Senado e sancionada pelo então governador Wanderley Vallim, alterou a Lei nº 49/1989 e nomeou a RA I de Brasília. Vallim, como vice de Joaquim Roriz, assumiu o governo para que o titular nomeado pudesse concorrer ao cargo de governador na primeira eleição direta da cidade.

A expressão cidade-satélite, historicamente, foi utilizada em referência às localidades mais distantes e empobrecidas. Lagos Sul e Norte e Park Way jamais foram chamados de satélites e sequer de cidades. Aliás, o termo “satélites” foi abolido por decreto na gestão do governador Cristovam Buarque. Em sua essência, continha um sentido preconceituoso.

Brasília é o Distrito Federal e o Distrito Federal é Brasília. Ponto.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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