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Entranhas lapidadas no chão do céu

Entranhas lapidadas no chão do céu

“Recortes de negro aqui e ali, parecem ilhéus

Serra da Estrela, eterna quimera

Em rios de luz, flocos de neve, tua alma nasceu

Sulcaste as entranhas do ventre da terra …”  (Antónia Ruiva, 2009)

Por Antenor Pinheiro, especial de Serra da Estrela, Portugal

As lagartixas-da-montanha fazem mover flores e folhas rasteiras das silenes lilases e brancas ornadas por neve em transição. Observo-as ligeiras, como que em busca de proteção para suas delicadas patinhas carijós nos frios campos assentados sobre a manta rochosa da serra mais charmosa do solo de Camões, cujo nome me remete pra bem pertinho do céu: Estrela! Hoje entendo! Seus afloramentos rochosos disformes, recortados, têm incrustadas marcas deixadas pelo rigoroso abrasão glaciar que lhe retira os extratos da superfície ao movimento deslizante de cristais de gelo, obediente ao solo inclinado. E à radiação do sol que se torna cálido com a primavera fotografada, têm lapidados seus contornos até que se transmutem em esculturas barrocas ladeadas de flocos brancos de neve. Logo mais, a fenda mais baixa, depositária de sedimentos conduzidos por suas estrias, formará a azul bacia d’água glacial que se infiltra manhosamente nas fraturas de seus granitos de 300 milhões de anos. Esta, a sua dinâmica geomorfológica, agora o sei!

antenorAntenor Pinheiro – Geógrafo. Membro do Conselho Editorial da Revista Xapuri. Foto: Antenor Pinheiro.

 

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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