FACHO DE LUZ

FACHO DE LUZ

FACHO DE LUZ

Não me lembro ao certo, talvez Campinas ou Vila Coimbra, numa casa modesta que tivera seus domínios arrombados, dali subtraídos alguns poucos bens, que conheci Athos Pereira, recém anistiado de 1979. Eu estava ali exercendo meu ofício de perito criminal, concursado e cursado em início de carreira, na tentativa de coletar os vestígios da cena do crime e assim circunstanciar a materialidade do fato para a instrução do processo; ele, um homem de fala calma, sentado a fumar o
cigarro pacientemente, observava meu trabalho, como a vaticinar em silêncio: “isso não vai dar em nada!”.

Jeito esquisito de conhecer aquele homem que influenciou boa parte de minha incipiente formação política, cujos textos que fizeram minha cabeça somaram-se aos de outro Athos (o Magno), Moura (Antônio Carlos), Salles (Antônio Pinheiro), Weffort e Sperb Leite (estes das co- lunas do Top News), “Pedro Tierra” (seu terno poeta irmão), Alencar (Osvaldo), Pedro Wilson, Caneca, Niso Prego, Mindé, Mineiro (Luis Fernando), Gusmão (Antônio Carlos), Safatle e demais que davam forma e substância ao Partido dos Trabalhadores (PT) no Brasil e Goiás.

Memorável época de construção de utopias, tempo de arregimentar filiados nas cidades da estrada de ferro nos fins de semana, junto de Fafau, Marquinhos, Gaúcho, Alan Kardec… (o povo do jornal “Crimelão”); tempo de “Liberdade Flavia Shilling”; de “Programa Mesa de Bar” -tempo que cursava Jornalismo na UFG, profissão de Athos Pereira e alguns outros próceres da esquerda da boa escrita, como sua companheira Thaís, a amada xará Nonô (Laurenice) e Wilmar Alves – ô saudade danada desse povo e desse tempo, sô!

Mas foi da inesquecível conversa militante, rodeada da boa cachaça de um pós-encontro-municipal-do- PT (1986), onde as teses das tendências internas ainda reverberavam, que Athos Pereira subverteu meu caminho de jovem militante sossegado.

Ideia lançada na minha estrada, incensada por Delúbio, Sandra e Arruda (Leônidas), convenceu-me da candidatura a deputado estadual do PT, sendo ele um de nossos possíveis senadores da República. Pensa!!!

Se da perícia realizada recuperados não foram seus bens, da amizade conquistada aprendi que um mundo melhor é possível. É facho de luz na vida da gente que chama.

Obrigado, Athos Pereira!

Imagem do WhatsApp de 2023 04 18 as 08.59.50Antenor Pinheiro – Geógrafo. Membro do Conselho Editorial da Revista Xapuri.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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