Governo premia Adele Benzaken, demitida na gestão Bolsonaro por promover saúde trans
Em 2019, Adele Benzaken foi exonerada do cargo por publicar a cartilha “Homens Trans: vamos falar sobre prevenção de infecções sexualmente transmissíveis?”.
Exonerada do Ministério da Saúde durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) por publicar uma cartilha destinada a homens trans, a médica sanitarista Adele Benzaken foi condecorada na quarta-feira (12) com a Ordem Nacional do Mérito Científico pelo governo brasileiro. Junto ao infectologista Marcus Vinícius Lacerda, autor de um estudo que apontou a ineficácia da cloroquina no tratamento contra a covid-19 em 2020, a sanitarista esteve na lista de indicados à honraria em 2021, mas ambos os nomes foram vetados pelo ex-presidente Bolsonaro na época.
Em 2019, Adele Benzaken foi exonerada do cargo de diretora do Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs), do HIV e Hepatites Virais do Ministério da Saúde de Jair Bolsonaro por publicar a cartilha “Homens Trans: vamos falar sobre prevenção de infecções sexualmente transmissíveis?”. O documento foi elaborado juntamente ao Instituto Brasileiro de Transmasculinidade (Ibrat).
“Ele verbalizou, várias vezes, a questão da cartilha para homens trans, que tinha sido lançada em janeiro e foi amplamente divulgada pela própria assessoria de comunicação do Ministério da Saúde, através do Blog Saúde”, disse a médica em entrevista ao Brasil de Fato naquele ano. “Entretanto, logo após o início do novo governo, essa cartilha recebeu algumas críticas e mandou-se retirar do ar.”
Durante a solenidade no Palácio do Planalto na quarta (12), ambas as cientistas vetadas por Bolsonaro receberam a honraria pelas mãos do presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT) e da ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos.
“Estamos reunidos aqui hoje para dizermos, em alto e bom som: chega de obscurantismo. Basta de negacionismo. Chega de jogar cientistas às fogueiras”, disse Lula durante a cerimônia.
“Chega de aceitar que cientistas como Adele Benzaken ou Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda tenham suas condecorações revogadas. Adele, porque se preocupou com a saúde dos homens trans. Marcus, porque ousou publicar a verdade: a cloroquina não combate a Covid”, reiterou em uma publicação em suas redes sociais.
Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.
Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.
Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.
Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.
Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.
Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.
Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.
Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.
Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.
Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.
Zezé Weiss
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