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KUARUP: FESTA INDÍGENA CELEBRA MEMÓRIA DOS MORTOS

: Festa indígena celebra dos mortos 

Alguns anos atrás, em 2016, o Kuarup foi realizado na Aldeia Yawalapiti, no Mato Grosso, entre os dias  13 e 14 de Agosto.  O ritual é tão profundo e sua tão bonita que merece ser contado sempre, ano-pós-ano, por todos os tempos vindouros.
 
Kuarup: Festa indígena celebra memória dos mortos 
foto: portal gov.br
 
HUKA-HUKA 
 
O Huka-Huka é uma luta ritual. Durante o Kuarup, é no Huka-Huka que jovens “atletas” dos vários grupos presentes mostram sua força.
 
A luta começa sempre  quando o guerreiro local, o  chefe da luta,  caminha até o centro da arena e chama os adversários, os campeões de cada tribo presente, pelo nome. Atendendo ao chamado, os lutadores vão-se posicionando em frente ao oponente.
 
Em seguida, se entreolham, se agarram e vão à luta, até alguém cair ao chão. O Huka-Huka começa sempre ao alvorecer do dia seguinte ao início do Kuarup, depois que acontece a ressurreição simbólica dos mortos, e o canto e o choro cessam.  Depois da disputa individual, os jovens presentes encerram as festividades com lutas grupais.
 
 
Os povos indígenas do se despedem de seus mortos celebrando o Kuarup, um alegre ritual de encerramento do luto. “Os mortos não gostam de ver os vivos tristes”, acreditam. Por essa razão, fazem uma festa exuberante, onde os “Kuarup”, que são troncos de madeira decorados, representam o espírito dos mortos.
 
KUARUP: FESTA INDÍGENA CELEBRA MEMÓRIA DOS MORTOS
Foto: EBC/Agência Brasil
 
Diz a que o Kuarup começou quando o Pajé Mavutsinim preparou seis troncos para trazer de volta à seis pessoas que tinham morrido em sua aldeia. Depois de avisar que quem tivesse relações sexuais não deveria sair de suas malocas, o pajé começou, com sucesso, o ritual da ressurreição.
 
Tudo ia bem até que um índio que estava namorando desobedeceu ao aviso e se aproximou do pajé. Naquele momento, os troncos pararam de se mexer. Muito triste, o pajé disse que dali por diante os Kuarup serviriam apenas para reverenciar os espíritos dos mortos. Desde então, por tempos imemoriais, o ritual é celebrado para agradecer pela convivência nesta vida e liberar os mortos para viverem em outro .
 
A cerimônia começa na noite anterior, quando os troncos de madeira – um para cada pessoa encantada – são trazidos da e colocados em linha reta no centro da aldeia pelos homens. Começam, então, a serem recortados em forma humana, pintados com faixas amarelas e vermelhas, e ornamentados com os principais objetos do morto.
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Depois de preparar os Kuarup, os homens vão até as malocas e buscam as e as crianças. Em silêncio, as mulheres se aproximam dos “Kuarup” e, em voz baixa, quase sussurrando, expressam gratidão a seus mortos presenteando-os com braceletes, cocares e belas peças de plumagem.
Chegada a noite, os homens, com seus corpos pintados e ornamentados, fazem a belíssima dança do fogo. Carregando archotes de palha em fogo, os homens cantam canções míticas e dançam a passos cadenciados ao som dos maracás, até a chamada do pajé, que evoca Tupã, implorando pela ressurreição dos mortos.
A dança dos homens termina no momento em que a lua cheia alcança seu máximo esplendor. Os homens então se dispersam em pequenos grupos e só o pajé, acompanhado pelas mulheres, continua entoando cânticos até o dia amanhecer. O nascer do sol traz, nos cânticos do pajé, de volta à vida os encantados.
 
Começa, então, a dança da vida. Cada “atleta” da aldeia traz no ombro uma longa vara verdejante, significando a vida das últimas crianças que nasceram na comunidade. Em um grande círculo, formado ao redor dos “Kuarup”, os “atletas” reverenciam os espíritos, agradecem pelos nascimentos, e em seguida se dispersam e se juntam às suas famílias, ou clãs.
 
Terminada a homenagem às novas vidas, os clãs da aldeia e os grupos convidados começam uma luta parecida com uma luta que chamam  “Huka-Huka“, ou “Uka-Uka”. Depois, em procissão e em festa, levam os “Kuarup” até o rio e encerram a cerimônia entregando-os às águas, para que possam ser levados para a vida em outro mundo.
 
Assim se resumem os vários relatos do Kuarup, contados por indígenas e não indígenas.
 
KUARUP: FESTA INDÍGENA CELEBRA MEMÓRIA DOS MORTOS
Foto: Wikimedia Commons

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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