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LAGOLÂNDIA, O BUCÓLICO ARRAIAL DE SANTA DICA

LAGOLÂNDIA, O BUCÓLICO ARRAIAL DE SANTA DICA

Lagolândia, o bucólico arraial de Santa Dica

Não fosse por Benedita Cipriano Gomes, Lagolândia seria apenas mais um desses esquecidos arraiais do Brasil Colônia, perdido nos confins do Planalto Central…

Por Eduardo Pereira

Mas é na pracinha de Lagolândia, povoado com pouco mais de 500 almas, localizado a cerca de 43 km da sede da histórica cidade goiana de Pirenópolis, que repousam os restos mortais de Benedita, a rezadeira, a benzedeira, a mítica milagreira conhecida como Santa Dica de Goiás.

É ali que, com o respeito e a reverência da população local, porém sem pompas nem circunstâncias, o busto da notável Santa Dica compartilha o espaço com árvores frondosas, bancos onde moradores sem pressa se sentam a qualquer hora do dia, flores simples e singelas, e imagens de Nossa Senhora.

É também ali que, nos finais de semana, chegam dezenas de turistas para conhecer um pouco mais da história do povoado e da mulher que, no começo do século XX, ousou construir um embrião de sociedade socialista, marcada pela instituição do uso comum do solo, pela abolição do uso do dinheiro, pela organização de um exército e que, por fazer muitas curas, ficou conhecida como Santa Dica.

Nascida por ali mesmo, na Fazenda Mozondó, no ano de 1903, Benedita ganhou fama muito criança quando, segundo a lenda, com apenas sete anos faleceu e, depois de três dias sem ter sido enterrada porque seu corpo seguia suando frio, ressuscitou, passando o resto da vida a fazer milagres.

Essa história foi transformando Lagolândia em um centro de romarias para fervorosos roceiros que, com o tempo, chegaram a formar um exército de 15 mil protetores daquele povoado que os historiadores chamam de nova Canudos, em referência à terra de Antônio Conselheiro no sertão da Bahia, porque também em Lagolândia o carisma de Santa Dica criou uma comunidade igualitária, sem diferença de classes.

Tal como em Canudos, o Estado brasileiro decidiu perseguir a comunidade de Lagolândia que, além de um exército bem treinado, possuía, também, um inacreditável patrimônio político de 4 mil eleitores. Em 14 de outubro de 1925, a guarda do estado de Goiás atacou o povoado. Conta a lenda que as balas dos inimigos eram aparadas por anjos, deixando em pânico as forças do exército invasor.

Mesmo assim, acabaram por prender Dica, que ficou reclusa por seis meses na cidade de Goiás, à época capital do estado, de onde saiu pela pressão popular que fez o governo ceder. Depois disso, Dica acabou por influenciar a política goiana e nacional, elegeu seu marido, um jornalista carioca, prefeito de Pirenópolis, e mandou tropas para a Revolução Constitucionalista em São Paulo. Seus fiéis seguidores faziam o que ela queria e votavam em quem ela mandasse.

Dos áureos tempos messiânicos, em Lagolândia hoje resta apenas um conjunto de casas centenárias que aos poucos vão sendo compradas por pessoas de fora, que movimentam a vida e a economia local nos finais de semana. No resto do tempo, Lagolândia mantém os hábitos pacatos do início do século passado.

Com esse relativo progresso, o povoado que um dia chegou a ser município, mas que perdeu esse status pelo decréscimo populacional, ganhou até um pequeno prédio de três andares, com comércio no térreo, moradia no andar de cima, e quartos para alugar no último piso.

Hoje em Lagolândia tem escola e posto de saúde, mas, segundo os nativos, falta ocupação e emprego para a juventude, razão porque a maioria parte para estudar ou trabalhar em Pirenópolis, Goiânia, e outras cidades da região.

Os que ficam optam por uma vida simples, sem assaltos, sem crimes (o último assassinato ocorreu há mais de uma década), preparando com calma a festa do doce, recebendo poucas notícias da chamada vida civilizada e mantendo muitas das tradições de Dica, como o cuidado com a Praça Benedita Cipriano Gomes, que fica sob a responsabilidade da Associação Feminina de Lagolândia, também criada por Santa Dica.

A FESTA DO DOCE

A Festa Doce, criada por Santa Dica em homenagem ao Divino Pai Eterno, a São Benedito e a Nossa Senhora do Rosário, santos de sua devoção, continua acontecendo em Lagolândia na 3ª semana do mês de julho de cada ano.

Durante os três dias de festejos, um imperador, um rei e uma rainha, escolhidos um ano antes, acolhem os peregrinos para três dias de festejos com alvoradas, novenas, cantorias e doces, muitos doces.

Compete ao trio –  imperador, rei e rainha –, organizar toda a festa, desde a escolha das frutas até a produção dos doces e a coordenação dos eventos. Segundo os organizadores, nos últimos anos a Festa do Doce foi palco para o consumo de mais de sete mil quilos de doces

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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