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Memorial resgata história de terror de pessoas negras queimadas vivas, enforcadas, espancadas até a morte no sul dos EUA

Pessoas negras queimadas vivas, enforcadas, espancadas até a morte: memorial resgata história de terror no sul dos EUA –

A notícia sobre a inauguração do Memorial Nacional para e Paz na cidade de Montgomery, no estado do Alabama, EUA, não ocupou muito espaço na imprensa brasileira.

Por Douglas Belchior Do Negro Belchior no Portal Geledés

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Monumento do Memorial Nacional para na cidade de Montgomery, no estado do Alabama, EUA (Foto: Reproduzida/negro belchior)

Inspirada no memorial do Holocausto em Berlin, na Alemanha e no memorial do Apartheid, em Johanesburgo, África do Sul, este monumento em às vítimas do terror racial promovida por supremacistas brancos que enforcaram, queimaram vivos, afogaram e espancaram até a morte mais de 4400 pessoas negras no sul dos , é uma demonstração da força política da comunidade afro-americana. É também, para este Blog, a oportunidade de inaugurar a parceria com o Blog O lado B em NYC do nosso irmão Edson Cadette, negro brasileiro, jornalista e radicado em Nova York há mais de 20 anos. Em nossos diálogos de comparação sobre a questão racial no Brasil-EUA, transborda agonia ante a supremacia racial tupiniquim: O no Brasil é igual ou pior, talvez até mais violento do que foi e é nos EUA. Como é possível não discutirmos isso em alto nível? Onde estão nossos memoriais? Quando o terror racial no Brasil será pauta nacional? Seguimos nós aqui, em busca de respostas e em tentativas de ação.

Com vocês, Edson Cadette, sobre memórias que também são nossas:

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Por Edson Cadette do Blog LadoBNY – Correspondente em NY

Localizado no local de um antigo depósito onde os negros foram escravizados em Montgomery, Alabama, este museu narrativo usa mídia interativa, escultura, videografia e exposições para imergir os visitantes nas vistas e sons do tráfico doméstico de escravos, o terrorismo racial, o Jim Crow. Sul e o maior sistema prisional do mundo.Visuais convincentes e exposições ricas em dados fornecem uma oportunidade única para investigar a de injustiça racial dos EUA e seu legado – para criar conexões dinâmicas entre gerações de americanos impactados pela trágica história da desigualdade racial.

Mais de 4400 homens, e crianças afro-americanas foram enforcados, queimados vivos, abatidos, afogados e espancados até a morte por multidões brancas entre 1877 e 1950. Milhões de pessoas fugiram do sul como refugiados do terrorismo racial. Até antão, não havia nenhum marco conreto de reconhecimento às vítimas de linchamentos por terrorismo racial. Em um terreno de seis acres no topo de uma colina com vista para Montgomery, o memorial do linchamento nacional é um espaço sagrado para a narração da verdade e a reflexão sobre o racismo nos Estados Unidos e seu legado.

O “Memorial Nacional Para Justiça E Paz” (National Memorial For Peace And Justice) inaugurado no último dia 25 de abril na Montgomery, no Estado do Alabama, foi projetado para homenagear os afro-americanos linchados durante décadas por aqueles que defendiam a supremacia racial branca nos Estados Unidos. Poderíamos também chamá-lo de Memorial do Terror.

O Memorial é uma antiga demanda da comunidade afro-americana para forçar a América a reconhecer uma de suas piores atrocidades direcionada especificamente contra os negros particularmente nos estados do Sul.

Com o final do período conhecido como Reconstrução (1865-1877), chamado também de reunificação do país após a Guerra Civil (1861-1865), os Estados confederados criaram suas próprias constituições estaduais juntamente com barreiras legais para impedir o avanço sócio-econômico dos ex-escravos, tratando-os como cidadãos sem qualquer direito constitucional.

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Exposição interna ao Memorial

Este período de terror amparado em leis segregacionistas e racistas, colocadas em prática em todo sul do país, ficou conhecida como a era “Jim Crow”. Entre 1877 e 1950, uma campanha sórdida de terror apoiada pelo Estado, inflamou as relações entre negros e brancos acarretando nos linchamentos de mais de 4 mil pessoas.

A magnitude destas que em muitas vezes ocorreram por questões banais como, por exemplo, a morte de Park Banks apenas por carregar no seu bolso a foto de uma branca,  ou a morte de Mary Caleb Gadly, linchada depois de denunciar a morte do seu esposo. Grávida, ela foi pendurada de ponta cabeça. Teve seu corpo incendiado e cortado ao meio enquanto seu feto, ainda vivo, caia no chão.

Muitos destes linchamentos eram motivos de verdadeiros pic-nics com direito a fotos ao lado dos cadáveres pendurados. São notórias também as fotografias tiradas nos linchamentos sendo usadas como cartões postais enviados a amigos e familiares.

Estas mortes deixaram cicatrizes tão profundas na comunidade afro-americana que ainda hoje elas podem ser sentidas por todos aqueles conectados com os mortos.

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Estátuas representando pessoas acorrentadas

Segundo o advogado Bryan Stevenson, fundador da ONG “Iniciativa de Justiça Igualitária” (Equal Initiative Justice), e responsável por este importante Memorial, muitos dos nomes dos mortos que agora fazem parte do memorial jamais vieram a público antes.

Segundo reportagem publicada no periódico The New York Times, Bryan Stevenson e um grupo de advogados mergulharam de cabeça nas pequenas livrarias espalhadas pelos vários condados nos estados do Sul para documentarem os milhares de assassinatos. Segundo o grupo, foram catalogados mais de 4 mil linchamentos.

Baseado nos dois mais importantes memoriais do planeta, o memorial do Holocausto em Berlin, e o memorial do Apartheid em Johanesburgo, Bryan Stevenson decidiu por construir um memorial único onde o impacto seria ainda maior para dar uma ideia mais completa da dimensão do horror perpetrado. Além dos nomes das vítimas escritos nas madeiras penduradas no teto representando cada condado, o memorial colocou em pequenos jarros a onde os linchamentos ocorreram.

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Jarros a terra onde os linchamentos ocorreram

Segundo Bryan Stevenson, a ideia de construção do Memorial do Linchamento surgiu durante as décadas visitando as cortes no Alabama onde o sistema judiciário local ainda trata os cidadãos afro-americanos com crueldade e indiferença.

Há quase 30 anos a “Iniciativa de Justiça Igualitária” vem oferecendo serviços jurídicos para a população mais pobre dentro de um Estado ainda mergulhado em memórias, imagens e comemorações aos soldados confederados. O Estado do Alabama tem o maior número de sentenças per capta nos Estados Unidos. Maioria esmagadora dos condenados, sejam quais forem os motivos, são negros.“Não estou interessado em falar sobre a história porque eu quero punir os EUA”, disse o advogado Bryan. “Na verdade, quero libertar a América”.

O Memorial do Linchamento não é um museu normal. Foi criado com o propósito de mostrar que a escravidão não terminou com a emancipação dos escravos. A instituição continuou se transformando com o tráfico de escravos interno, com as décadas das leis segregacionistas, com os linchamentos, e por fim, nos dias atuais com a prisão em massa dos afro-americanos.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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