Varadouro: O Jornal das Selvas
Dois anos após o primeiro “empate” e a chegada da Contag ao Acre e três anos antes do assassinato de Wilson Pinheiro, precisamente em maio de 1977, dois repórteres de jornais nacionais no estado do Acre lançaram um periódico “alternativo”: “Varadouro, um jornal das selvas”. Esse jornal “nanico” circulou até 1982.
Por Nilo Diniz
A primeira reunião de sua equipe foi na Diocese da Igreja Católica, em Rio Branco, e os primeiros seis números do jornal foram editados graças a um empréstimo feito pelo bispo Dom Moacyr Grecchi. O jornal O Acre (número 1, de 27 de agosto de 1997), na abertura de uma longa entrevista com a equipe de redação do Varadouro, escreve:
Eles fizeram o que se poderia chamar de uma revolução. Na linguagem, no comportamento político, nos relacionamentos sociais, em tudo eles buscaram o avesso do que estava estabelecido. Na chegada do “progresso” defenderam os índios. No auge da pecuária gritaram em favor da floresta. No crescimento da urbanização falaram de seringueiros. No frenesi do capitalismo deram valor aos pobres. Em meio aos letrados assumiram a fala dos analfabetos.
Instalado um novo ambiente de conflito no seringal, esse pequeno jornal correspondia a uma das primeiras expressões intelectuais que procuravam tornar de conhecimento público os acontecimentos locais.
Embora integrasse uma fecunda safra nacional de imprensa “alternativa” ou “nanica”, o jornal Varadouro dos anos de 1970 surgia de forma diferente dos alternativos do Centro-Sul do país, com O Pasquim, Opinião, Movimento, Em Tempo, entre outros.
Enquanto muitos desses jornais alternativos do Sul, nesse mesmo período, trabalhavam com artigos e opinião, o Varadouro estampava principalmente reportagens.
A razão era simples, a mídia local – que a esse tempo só dispunham do jornal O Rio Branco – “não via razão” para noticiar o que estava acontecendo no interior do estado. Até mesmo o então governador do estado, Geraldo Mesquita, sensível às demandas sociais, “não acreditava que havia jagunços expulsando seringueiros nas florestas do Acre” (O Acre, 1997:9).
O tabloide praticamente instalou uma nova forma de fazer jornalismo no estado. Além da reportagem, o Varadouro investiu na organização da redação e na formação de uma nova geração de redatores, com um texto identificado com a cultura local e uma diagramação que resgatou o estilo próprio dos artistas plásticos locais.
Nilo S. Melo Diniz – Escritor, em “Chico Mendes: Um Grito no Ouvido do Mundo – como a imprensa cobriu a luta dos seringueiros”. Editora Appris, 2019.