A Lua, segundo o povo Ashaninka
A Lua, chamada Kashiri, é personagem masculino. Alguns Ashaninka dizem que Kashiri é o pai do Sol, mas muitos nada sabem a respeito do parentesco entre os dois. A lua é o meio mais utilizado para marcar a passagem do tempo. Suas fases são interpretadas, por meio de cores e formas, como resultado de enfrentamentos corporais com o sol.
Por Manuela Carneiro da Cunha e Mauro Barbosa de Almeida
Watsiwãkataki Kahsiri – (lua cheia; literalmente, “a lua está firmada”). Luta corporal com o sol. O sangue começa a se espalhar.
Hatsimata Kashiri – (lua minguante; literalmente, “a lua está aprumada”). O sangue está se espalhando dentro do olho da lua. A lua está indo embora. Ela quase morre. A noite começa a ficar escura.
Iyotxetapaki Kashiri – (lua nova; literalmente, “a lua está cega”). Está pequena, está fraca, quase morrendo.
Henokitapaki Kashiri – (lua crescente; literalmente, “a lua está alta”). A lua está curada. Ela está ficando grande.
A chegada da lua nova é anunciada por pawo (bacurau, família Caprimulgidae). No primeiro dia da lua nova, quando ainda não é possível avistá-la, é ele quem anuncia, com seu canto, a chegada dela. Os eclipses lunares são chamados de itsiwakatsi Kashiri, “ a lua está se apagando”. São decorrentes de brigas entre a lua e o sol. A lua nunca vence o sol, sempre sai prejudicada.
A estrela inakawote só nasce na lua nova; quando ela é vista bem baixa, é sinal que vai sair a lua nova. Esposa da lua, é ela quem cuida dos mortos quando a lua sai do lugar.
Quando os mortos chegam, a lua toma-os nos braços como se fossem bebês e os entrega a inakawote; ela recebe e dá banho neles. Inakawote fica com raiva da lua por conta dos mortos que ela lhe traz para lavar.
A lua, por sua vez, também fica com raiva de inakawote, bate nela e vai procurar waariya, que é uma outra estrela. Quando vai procurar waariya, a lua muda de posição. Com a mudança de posição, vem a chuva, que são lágrimas de inakawote.
A lua fica um tempo ao lado de waariya, que depois desaparece, para reaparecer ao lado de inakawote. Quando os Ashaninka veem waariya muito pertinho da lua, jogam cinza para estragar o casamento de quem está pensando em casar.
Manuela Carneiro da Cunha – Antropóloga militante. Pesquisadora dedicada ao estudo da Amazônia, em Enciclopédia da Floresta – O Alto Juruá: Práticas e Conhecimentos das Populações, 2002.
Mauro Barbosa de Almeida – Antropólogo social e cientista político. Pesquisador dedicado ao estudo da Amazônia, em Enciclopédia da Floresta – O Alto Juruá: Práticas e Conhecimentos das Populações, 2002.