UM GOLPE CONTRA O POVO BRASILEIRO

UM GOLPE CONTRA O POVO BRASILEIRO

UM GOLPE CONTRA O POVO BRASILEIRO

Em 01/04/1964, há exatos 60 anos, o Brasil virou de ponta-cabeça. Um golpe militar, gestado na caserna, com o apoio e conivência do empresariado brasileiro, da imprensa nacional e de órgãos de inteligência dos Estados Unidos, depôs o presidente João Goulart, eleito democraticamente e, conforme pesquisas do Ibope à época, respaldado por 70% do povo brasileiro. 

O golpe que, por longos 21 anos, implodiu a democracia e instalou no Brasil um sangrento regime de terror e ódio, capaz de produzir e deixar para as gerações de agora e futuras um terrível saldo de milhares de banimentos, prisões, torturas, mortes e “desaparecimentos” políticos, não aconteceu por obra do acaso. 

Desde o final da Era Vargas, encerrada com o suicídio de Getúlio em 1954, às insurreições contra Juscelino Kubitschek, às pressões contra Jânio Quadros e às conspirações ostensivas que terminaram por derrubar Jango, o Brasil sempre viveu momentos de tensão e medo, ante a possibilidade iminente do rompimento do Estado Democrático de Direito, pela tomada do poder por um golpe militar. 

Esse é um pesadelo que parece sempre querer voltar. Em 2014, contestaram o processo eleitoral. Em 2016, depuseram Dilma, empossaram um traidor, desmantelaram a democracia. Em 2018, sem crime e sem provas, prenderam Lula, elegeram um genocida golpista, desmontaram os avanços sociais dos governos do PT, deixaram o povo morrer de Covid-19, voltaram o Brasil pro Mapa da Fome. 

E, de novo, em 08/01/2023, o Brasil passa pelo trauma de mais uma intentona golpista. Não venceram, é certo. Não houve rebelião militar, é certo. Mas também é certo que acampamentos golpistas, montados à luz do dia nos portões das bases militares do Exército brasileiro, serviram de aparelho para a escalada terrorista que vandalizou os prédios dos Três Poderes no 8 de janeiro.

Em poucas horas, em plena tarde de domingo, uma turba ensandecida de vândalos, clamando por intervenção militar, depredou vidros e obras de arte no Palácio do Planalto, no Congresso Nacional e no Supremo Tribunal Federal. 

Hoje já se sabe que a intentona de golpe foi articulada pelo próprio ex-presidente da República, de dentro dos palácios de governo, com o apoio de militares graúdos das Forças Armadas da República Federativa do Brasil. Das listas de pessoas presas – financiadoras, executoras e mandantes – além dos/as chamados/as “bagrinhos/as” ou “patriotas raiz”, constam expressivos nomes vinculados ao capital financeiro e à elite política brasileira. 

Os mesmos segmentos conservadores que, em 1964, derrubaram um presidente da República, por defender um projeto progressista de Nação, centrado em Reformas de Base – agrária, urbana, eleitoral, educacional, fiscal, bancária e administrativa – os mesmos que tentaram golpear a democracia em 1945, 1954, 1955 e 1961, parecem seguir à espreita de uma oportunidade para, usando da boa fé do povo, tentar barrar – a qualquer custo – as poucas conquistas sociais e econômicas da maioria pobre e excluída do povo brasileiro. 

Não, nós já não podemos permitir que um novo golpe aconteça, que um outro regime repressivo venha a ancorar a face hedionda do poder em milhares de prisões arbitrárias, em centenas de cassações de direitos políticos, nos exílios, nas torturas, nos desaparecimentos, nas mortes de presos/as políticos/as. 

Ou que nossos/as estudantes tenham que arriscar suas vidas em passeatas reprimidas pela polícia contra a edição de Atos Institucionais como o AI-5, para legitimar um “golpe dentro do golpe”, dando ao regime instrumentos ainda mais poderosos de intimidação e repressão, fazendo do direito de prender, torturar, “suicidar”, matar e “desaparecer”, política de Estado.

“Desaparecer” também, porque, segundo a Comissão Nacional da Verdade (CNV), 210 lideranças da luta contra a ditadura continuam desaparecidas, depois de serem vistas pela última vez em espaços clandestinos, como a “Casa da Morte”, denunciada pela presa política Inês Etienne Romeu, que ficava em Petrópolis, no Rio de Janeiro. 

Não mais a repressão contra greves da classe trabalhadora, como a que levou à prisão de Lula e de outros/as dirigentes sindicais no ABC paulista e por todo o Brasil, no campo e na cidade, na segunda metade dos anos 1970. Não mais os atos terroristas como a bomba do Riocentro, em 1981, ou os ataques violentos a Brasília, depois da diplomação de Lula, em dezembro de 2023. Não mais um impeachment, como o que tirou Dilma da presidência em 2016. 

Não mais uma prisão do maior líder político do Brasil pós-redemocratização, como a que tirou Lula das eleições de 2018, fatos que levaram Brasil aos seis anos de calabouço, entre a posse do vice traíra em 2016 e a fuga do presidente “covardão” no final de 2022, até a chegada de Lula novamente ao poder, em 01/01/2023. 

Não mais uma anistia incompleta, como a de 1979 que, apesar de permitir “a volta do irmão do Henfil” para a luta política pela cidadania em solo brasileiro, deixou impunes assassinos e torturadores, militares e agentes de repressão, responsáveis pela dor pungente das “Marias e Clarices” que, como diz Amelinha Teles, presa política torturada nos porões da ditadura, “é uma ferida que sangra sempre, que nunca cicatriza”. Ditadura Nunca Mais!

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Foto: Poder 360/Reprodução

Fonte: Revista Extratos. Sindicato dos Bancários. Edição Especial, número 08, abril de 2024.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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