Mais de 80 organizações ecossociais do Cerrado e da Caatinga se encontraram em Brasília para troca de saberes e elaboração de estratégias socioambientais e políticas para os biomas.
“Precisávamos de um programa com ações locais e impactos globais”, Don Sawyer durante o II Encontro de Experiências e Aprendizados do PPP-ECOS.
Nos últimos cinco anos, foram mais de 100 projetos, 15.000 famílias beneficiadas, 8.500 comercializando produtos da biodiversidade e 3.000 adotando práticas sustentáveis de manejo do solo e da água. O II Encontro de Experiências e Aprendizados do PPP-ECOS no Cerrado e na Caatinga, realizado entre 8 e 10 de maio, em Brasília, trouxe avanços alcançados pelo programa e perspectivas sociais, políticas e ambientais para os próximos anos. O encontro foi organizado pelo ISPN em parceria ao PNUD e com recurso do Fundo do Meio Ambiente Mundial (GEF).
Os resultados, segundo Don Sawyer, não se limitaram às regiões trabalhadas. “Precisávamos de um programa com ações locais e impactos globais”, comentou o assessor sênior do ISPN.
A conservação da biodiversidade e a melhoria da qualidade de vida das populações que dependem dela impactam em uma agenda global no que diz respeito ao enfrentamento à pobreza, à conservação do meio ambiente e à valorização de saberes tradicionais essenciais para a manutenção de modos de vida sustentáveis.
“Essas iniciativas respeitam nossa história, nosso modo de ser e pensar e permitem o diálogo com o meio ambiente. É assim que trazemos contribuições para a sociedade, inclusive, porque nós que fornecemos alimentação saudável”. – Valéria Paye, coordenação da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB)
O primeiro dia de evento trouxe a retrospectiva das ações dos projetos entre 2012 e 2017 e apresentações criadas pelos próprios participantes: representantes de 85 organizações, do poder público federal, de povos e comunidades tradicionais e parceiros. Performances, danças e poesias traduziram experiências do Programa mostrando que a biodiversidade do Cerrado e da Caatinga pulsam no ritmo da cultura popular. Foi enaltecida a importância dos biomas para o equilíbrio ambiental com o grito: “Cerrado e Caatinga vivem!”.
Com rodas de diálogos e exposição de experiências em 17 estados do centro-oeste, nordeste e norte, o segundo dia do Encontro proporcionou troca de saberes e inspiração para novas estratégias. Beneficiamento de produtos extraídos de forma sustentável – como Licuri, mel, plantas e frutos – implementação de tecnologias de convivência com a seca e de sistemas agroecológicos entre outras iniciativas além de falarem sobre formas de geração de renda e impactos positivos para o ambiente, também apoiam lutas comunitárias históricas.
“O PPP-ECOS ajuda a salvar nosso território tradicional. Se não fosse o trabalho com a apicultura, não aguentaríamos a pressão. Os fazendeiros dizem que acabamos com a terra, mas esse trabalho prova que a conservamos.”- Rogério Silva, liderança pesqueira da comunidade de Caraíbas, no norte de Minas Gerais.
Além de contribuir na defesa dos territórios, muitas iniciativas colocam as mulheres no protagonismo, o que promove seu reconhecimento enquanto seres políticos, desconstruindo opressões históricas de gênero. Outros benefícios socioambientais e políticos foram compartilhados: a reorganização comunitária, o incentivo à conservação do solo e da água e o fortalecimento de identidades tradicionais e do aprendizado nas bases.
“Os movimentos sociais percebem o PPP-ECOS como algo que fortalece a educação no campo e isso é estratégico para o futuro, porque a educação é quem nos liberta para prosseguir atuando” – Guilherme Mamede, liderança jovem do Projeto Mutirão Agroflorestal em Mambaí/GO.
A articulação com coletivos de advogados/as populares foi um dos aprendizados estratégicos mencionados. O apoio jurídico garantiu direitos essenciais para o sucesso dos projetos, como a defesa do território e o acesso a Políticas, a exemplo do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). A comunicação popular também foi abordada. “É importante articular os veículos alternativos para denunciar o que acontece nas comunidades. Isso nos protege, inclusive, a nível internacional”, contou Edite Souza do Projeto Gerações Geraizeiras, da Bahia.
No último dia de evento, os participantes se organizaram em grupos por biomas e pensaram em estratégias de consolidação das ações e a continuidade do Programa nos próximos cinco anos. O fortalecimento das articulações em rede, diante das ofensivas vindas com os grandes empreendimentos nas disputas territoriais, teve destaque. Iniciativas como a Rede Cerrado foram vistas como estratégicas para o fortalecimento das bases comunitárias. Para Neto Santos, do Centro Mandacaru, no estado do Piauí, “é possível fortalecer nossas articulações e redes para nossas incidências políticas”.
A continuidade do PPP-ECOS (GEF- Small Grants Programme) mostrou-se central para que os avanços prossigam. Criar estratégias políticas nesse sentido fundamentaram os debates, enfatizando a necessidade do diálogo com sociedade, parceiros e poder público. Segundo o representante do Ministério do Meio Ambiente, Mauro Pires, o governo tem interesse em continuar o programa.
“Estamos totalmente empenhados, junto a parceiros, como ISPN, a dar continuidade ao PPP-ECOS. Olhando para trás, vejo como o programa apoiou a construção de políticas públicas. No ministério, o setor de extrativismo depende muito do que ele faz” – Mauro Pires, da Secretaria de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável do Ministério.
Após três dias de debates, troca de saberes e construção de estratégias, os/as participantes voltam com a missão de multiplicarem os conhecimentos. Fortalecidos para os novos desafios sociais, políticos e ambientais, a perspectiva é a continuidade do Programa por meio de estratégias como a educação de base, a incidência política e a articulação em rede.
Os projetos do PPP-ECOS valorizam, visibilizam e contribuem com a resistência das comunidades tradicionais. O grito dos povos fala sobre relações com a biodiversidade que trazem benefícios para uma lógica mundial que exige o respeito e o diálogo entre populações e meio ambiente para continuidade dos recursos no amanhã. Cerrado e Caatinga resistem e vivem para que ainda se possa respirar a sustentabilidade ambiental com equidade social.
“Essas comunidades detém ricos saberes ancestrais sobre a natureza. Precisamos resgatar esses conhecimentos para que elas continuem com um trabalho reconhecido a nível mundial. Elas são uma das soluções para o futuro: é necessária a parceria com povos tradicionais para proteger o meio ambiente” – Bráulio Dias, professor do departamento de ecologia da UNB.
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