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XINGU: desmatamento avança por madeira e carne

Por madeira e carne, desmatadores avançam sobre o Xingu

Isabel Harari

Mais de dez mil hectares de foram derrubados em julho na Bacia do Xingu. Pecuária extensiva e degradação ambiental são as principais causas

O avanço da pecuária e da retirada ilegal de madeira coloca em risco a integridade territorial da Bacia do Xingu, entre os estados do Pará e Mato Grosso. Durante o mês de julho foram desmatados mais de 10 mil hectares de floresta, preocupando indígenas, e seus parceiros.

Apesar da queda relativa em relação aos cinco meses anteriores – em que assistimos a um aumento exponencial do desmatamento, com um pico de 24 mil hectares desmatados em junho – , os números merecem atenção. Mais de 3 mil hectares de florestas foram destruídos no interior de Áreas Protegidas, entre e em razão de atividades ilegais.

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Madeira ilegal na estrada que liga Uruará ao porto Maribel, utilizada para escoamento de madeira retirada da TI Cachoeira |Juan Doblas-ISA

 

TI Cachoeira Seca em risco

Terra Indígena (TI) Cachoeira Seca do Iriri, de posse imemorial do povo Arara, viu aumentar em mais de seis vezes o desmatamento entre os meses de junho e julho, com 650 hectares. Desde janeiro foram desmatados 1.096 hectares no interior da área protegida, que tem o triste registro de ser a TI mais desmatada no país nos últimos anos.

A maior parte das áreas abertas se encontra nas proximidades da cidade de Uruará e são extensões de pastos já existentes. Para além da destruição da floresta para a pecuária, foram registradas grandes áreas degradadas para a extração ilegal de madeira nas proximidades da cidade de Uruará.

Segundo Juan Doblas, especialista em geoprocessamento do ISA, a relativa calma nos meses precedentes pode ser explicada por uma trégua dada pelos pecuaristas da região face ao avanço do cadastramento de ocupantes não indígenas. “Nesse contexto, a volta do desmatamento assinala uma ‘quebra’ dessa trégua e a possibilidade de novas invasões no território dos Arara”, aponta Doblas.

A desintrusão da área é uma condicionante da Usina Hidrelétrica (UHE) de Belo Monte que ainda não foi cumprida. Esse processo faz parte de um plano de vigilância e fiscalização que também deveria ter sido implementado antes da construção da usina, em 2009, mas ainda não saiu do papel. [Saiba mais]

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Invasões e de madeira na TI Cachoeira Seca colocam atividades produtivas, com castanha, em risco

 

Boi ilegal

O SIRAD X detectou um total de 15.134 ha de floresta derrubada em 2018 no interior da Área de Preservação Ambiental (APA) Triunfo do Xingu desde o início do ano – destes, 1.911 apenas em julho. Esse número coloca a APA na Unidade de Conservação mais desmatada na bacia do Xingu.

O desmatamento de grandes extensões de floresta em um curto período de mostra, segundo Doblas, “o poder e a capacidade de mobilização do setor agroindustrial na APA”. Por exemplo, neste ano, em uma única empreitada, foram desmatados 800 hectares de floresta. [Saiba mais].

São Félix do Xingu, um dos municípios que estão no perímetro da APA, possui o segundo maior rebanho bovino do e a área protegida constitui uma enorme reserva de recursos. O desmatamento acontece em sintonia com o aumento das exportações brasileiras de carne e o fortalecimento das grandes cadeias de frigoríficos. A implementação completa do chamado ‘TAC da Carne’, que pretende controlar a origem dos animais nos frigoríficos paraenses, é condição necessária para impedir a destruição das florestas na APA.

O TAC é um instrumento importante para inibir a comercialização de carne proveniente de propriedades rurais que desrespeitem a legislação ambiental e trabalhista. As últimas auditorias apontaram que, apesar do avanço no monitoramento ambiental nessa cadeia produtiva, 18% da movimentação de gado comercializado tem origem ilegal.

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Desmatamento na APA Triunfo do Xingu

Bruno Marianno, membro da Câmara Técnica da Auditoria (CTA) do TAC da Pecuária e Protocolo Verde dos Grãos, explica que as áreas produtoras ilegais dentro da APA devem ser embargadas e multadas e os frigoríficos que estabelecem relações de compra com elas devem sofrer sanções dos órgãos ambientais e MPF. “Adicionalmente, deve-se realizar auditorias independentes constantes e fornecer assistência técnica rural para a melhoria de índices de produtividade, favorecendo a recuperação de áreas já desmatadas e inibindo novos desmatamentos”, conta.

Há, segundo Marianno, três desafios para a implementação efetiva do TAC: monitoramento mais eficiente da origem do gado, regularização ambiental das áreas e ações punitivas àqueles produtores e frigoríficos que insistam em agir ilegalmente.

Velho garimpo, nova ameaça

Em julho foram detectados pequenos polígonos de desmatamento na Indígena Baú, no Pará. O padrão, pequenas aberturas ao longo do curso do rio, corresponde à exploração de minérios, prática ilegal que coloca em risco o território do povo Kayapó.

O monitoramento revelou que a área aberta coincide com um antigo garimpo chamado de “Coringa”. Segundo Rodrigo Balbueno, do Instituto Kabu, a área voltou a ser intensamente explorada em função do alto preço do ouro e da falta de ações mais definitivas para coibir a atividade ilegal.

Localizado na bacia do rio Curuá, o garimpo mineração aumenta a instabilidade em uma região já bastante tensionada. “A situação do garimpo Coringa causa bastante preocupação a todos que se preocupam com a condição de das comunidades indígenas e com a proteção de seus territórios”, alerta Balbueno.

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Garimpo Coringa é reaberto na TI Baú

ANOTE AÍ

Os dados foram detectados pelo Sirad X, o sistema de monitoramento de desmatamento do ISA. Os boletins são publicados mensalmente na Plataforma Rede Xingu +. Clique aqui para acessar a sexta edição.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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