O papa e o amor

O papa e o amor

O papa e o amor

Com extrema lucidez, Marcia Bortone, fala sobre diferenças e aceitação do amor e acrescenta: “não está na hora de as pessoas, principalmente aquelas que se dizem cristãs, reverem seus parâmetros? Em meio a uma terrível moralista e doentia no , encabeçada por falsos cristãos e falsos pastores, vem um  papa maravilhoso nos dar boas novas!”

Hoje estava com minha madrinha de 90 anos quando ela falou, muito indignada, que o papa havia abençoado a união entre homossexuais. Ela, nos seus noventa anos de vida, tem dificuldade de compreender como um papa possa falar tal “heresia”.
Eu a entendo, embora não compactue com sua visão de mundo. Afinal, 90 anos vivendo sob um mesmo paradigma, não é fácil de aceitar posturas tão “cristãs”, como essa do nosso .

Era preciso que um papa, vindo pela primeira vez de um país não europeu, de um país 3º mundista como o
nosso, trouxesse lições de amor e de , lições de perdão e de compaixão tão intensas em um mundo tão
esfacelado.

Por isso não posso me calar, porque o que deveria ser motivo de alegria, amor e júbilo, para muitos cristãos é motivo de indignação.
Penso cá, com meus botões, não está na hora de as pessoas, principalmente aquelas que se dizem cristãs, reverem seus parâmetros? Em meio a uma terrível crise moralista e doentia no Brasil, encabeçada por falsos cristãos e falsos pastores, vem um  papa maravilhoso nos dar boas novas!

Quem sabe a pudesse ser reescrita e no lugar da dor, houvesse perdão e amor?
Quem sabe as pessoas, os falsos moralistas, repensassem seus valores e incluíssem o verdadeiro amor, aquele que Cristo nos ensinou quando, ao ver uma adúltera que estava para ser apedrejada, disse àquela plateia – ávida pela vingança – que atirasse a primeira pedra aquele que não tivesse pecado.

Como seria maravilhoso que a , a , a arte, enfim, voltassem a ocupar os espaços perdidos em nossa vida e que essa arte, com toda a sua capacidade de nos tornar seres humanos melhores, nos levasse a ver na figura de Jesus aquilo que há de mais sagrado e verdadeiro: a capacidade de amarmos uns aos outros, sermos menos algozes e mais amorosos, menos preconceituosos e mais felizes, menos vingativos e mais irmanados.

Quem sabe esse terrível ano de 2020 nos traga uma lição de vida, justamente quando sentimos, como nunca antes, nossa própria vida tão frágil e tão fugaz…

Que em 2021 o amor de Cristo volte a nos irmanar e que possamos redescobrir a insuspeitada e universal alegria de sermos todos humanos outra vez.

Marcia E. Bortone
Dezembro de 2020.

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Marcia Elizabeth Bortone – Professora aposentada da UnB – Departamento Letras. Trabalha com a linha da Sociolinguística e é Membro Efetivo da Alaneg/RIDE – Academia de Letras e Artes do Goiano. Reside atualmente em São Lourenço – MG.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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