Querida Mãe de Copas

Querida Mãe de Copas
 
Olho para trás, querida Mãe de Copas e, ao longe, contemplo por onde segui e vejo como teus pensamentos e presença comigo sempre estiveram. Afinal, mesmo em sua sana floral pela perfeição acaso em teu coração não cabe a simpatia pelo imperfeito?
 
Por Jairo Lima
(em Cartas para Alice)
 
Querida Mãe de Copas,
 
Eu nunca vi um diamante de verdade. Ou será que vi?
 
Acaso saberia que esse seria real? E de que isso me valeria?
 
As pessoas ao meu redor comentam: Você é um diamante bruto!
 
Quanta idiotice essa visão. Penso: “Não quero ser um diamante bruto, quero ser como a pluma, que leve flutua ao sabor da brisa”.
 
Afinal, de que me valeria a bruteza a ser lapidada? E quem me lapidaria? Por isso que simpatizo com a pluma, querida mãe, pois sem perder sua forma alcança com sua leveza o que a lapidação da bruteza da reluzente joia não conseguiria.
 
Fixo-me nessa percepção de maneira obsessiva, pensando em como todos ao meu redor se lapidam ou são lapidados, moldando-se a uma aparente perfeição, que não sobrevive a um olhar mais profundo sobre os grotões profundos que habitam cada ser…
 
Se de ti herdo a frieza e a profundidade da percepção sobre o que me rodeia, do tempo imparável recebo a certeza de que em algum ponto da estrada tortuosa que trilho, as encruzilhadas que encontrei serviram-me muito mais que os caminhos floridos e planos.
 
Olho para trás, querida Mãe de Copas e, ao longe, contemplo por onde segui e vejo como teus pensamentos e presença comigo sempre estiveram. Afinal, mesmo em sua sana floral pela perfeição acaso em teu coração não cabe a simpatia pelo imperfeito?
 
Estive em silêncio por muito tempo, eu sei. E as minguadas notícias que a vós repasso ainda não se sustentam em base forte. Mas, te digo que, em minha mente, as angústias e melancolias que, tal como cicatrizes que estão sempre à mostra, ainda são como fantasmas do espírito sopram em meus ouvidos suas doces e sedutoras palavras, instigando-me ao aconchego da solidão e do silêncio.
 
Se penso em fugir de tudo? Sempre. Mas, o que seria esse ‘tudo’ senão eu mesma? E assim seria vã minha fuga? É isso, florida mãe: assim como vejo a cada dia a Rainha da Noite reinar sobre o céu brilhante ao qual me perco em contemplação, também percebo que a mim cabe a decisão de ‘lapidar’ esse diamante bruto que é a realidade da qual me apercebo. Mas, o que seria esse diamante? Afinal, nunca vi um.
 
Mãe, pergunto: Você já contemplou a face suave e etérea da melancolia? Já ouviu o doce som de suas palavras? Mas, esse belo ser já não é tão senhor de mim quanto antes, apesar de me deixar levar, por vezes, por suas súplicas.
 
Mas, voltemos ao diamante: por acaso tens um? Fico pensando se sua beleza só é percebida por alguém o lapidou conforme sua percepção do belo, ou se dele emana alguma presença peculiar que instiga nosso ser a crer que de tal joia emana alguma beleza.
 
Acho muito ingênuo e supérfluo a comparação que muitos fazem entre pessoas e diamantes, assim como acho simplório as certezas que as movem, afinal, como descobri ao longo de minhas tortuosas trilhas, é inútil ter certeza.
 
Saudades, querida Mãe de Copas. Sentimento tortuoso e infantil que nos colam imagens difusas e coloridas “do que foi”, enquanto “eram”.
 
A ti um abraço carinhoso, e verdadeiros sentimentos sobre “o que foi”, e que certamente “ainda será”…
 
Lembranças, de sua sempre e imperfeita…
 
Alice
 
Duodi, mês de Prairial”
 
Jairo Lima – Indigenista, escritor e gestor do blog cronicasindigenistas
Alice: Imagem by Jairo Lima
 
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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