Por Victor Peixoto/História Islâmica
A planta da cana-de-açúcar, que é nativa de um clima tropical, requer muita água e calor para crescer O cultivo da planta se espalhou por todo o mundo islâmico medieval via os novos métodos de irrigação artificial. A cana-de-açúcar foi cultivada extensivamente no sul da Europa medieval durante o período de domínio muçulmana na Sicília, começando por volta do século IX. Além da Sicília, Al-Andalus (no que atualmente é o sul da Espanha) foi um importante centro de produção de açúcar, começando no século X.
Lá, os diversos povos islamizados árabes, berberes, persas, andaluzes e egípcios começaram a criar novos usos para o açúcar, passando dos medicinais para o consumo humano através de doces, chás, sucos e outros alimentos que poderiam ter a substancia adicionada, produzindo um sabor mais potente que o mel, e tornando-se uma febre no Oriente islâmico.
Séculos mais tarde, após invasão do Levante pelos Cruzados em 1099, estes trouxeram consigo para a Europa o “sal doce dos árabes”, e foi a partir daí que o sakkar do sânscrito passou do árabe as-sukkar para os idiomas europeus como açúcar (português), sugar (inglês), azúcar (espanhol), zucker (alemão), sucre (francês) etc.. todos termos derivados do árabe.
No início do século XII, Veneza adquiriu algumas aldeias perto de Tiro e estabeleceu propriedades para produzir açúcar para exportação para a Europa, onde suplementou o mel como o único outro adoçante disponível. O cronista da cruzada Guilherme de Tiro, escrevendo no final do século XII, descreveu o açúcar como “um produto muito precioso, muito necessário para o uso e a saúde da humanidade“.
Foi a partir deste período que as primeiras moendas de açúcar começaram a se popularizar gradativamente em território controlado por europeus, fazendo uso das tecnologias de produção de refinamento dos muçulmanos. O primeiro registro de açúcar em inglês é do final do século XIII.
“Muitos feudos no Outremer levantavam dinheiro da indústria ou do comércio ao invés da agricultura, como na Europa Ocidental. Entre os mais ricos estavam feudos-monetários que incluíam engenhos de processamento de açúcar. Esta tecnologia foi copiada dos povos islâmicos no Oriente Médio mas, diferente dos seus vizinhos muçulmanos, a elite latina do Outremer frequentemente usava trabalho escravo para mover a pesadas prensas de pedra. Entre esses escravos estavam incluídas mulheres muçulmanas capturadas”. (NICOLLE, David. Knight of Outremer 1187 – 1344 AD. Sussex: Osprey Publishing, MAA 018, p. 58.)
O volume das importações aumentou nos últimos séculos medievais, conforme indicado pelas crescentes referências ao consumo de açúcar nos escritos ocidentais do final da Idade Média. Mas a cana-de-açúcar continuou sendo uma importação cara única da Ásia islâmica.
Seu preço por libra na Inglaterra dos séculos XIV e XV era quase tão alto quanto as especiarias importadas da distante Ásia tropical, como noz-moscada, gengibre, cravo e pimenta, que precisavam ser transportadas através do Oceano Índico naquela época.
A partir de meados do século XV, o açúcar começou a ser plantado nas novas posseções espanholas nas Canárias, e também começou a ser utilizada a mão de obra escrava africana para sua custosa produção, tanto nos territórios insulares como na própria Castela.
Com a descoberta das Américas em 1492, e a percepção de que o vegetal conseguiria ser plantado facilmente no solo tropical do Caribe e América do Sul, a febre do açúcar transformou-se na base econômica social do Novo Mundo por séculos, e foi o principal propulsor do tráfico negreiro transatlântico, que traria a mão de obra para a produção do açúcar, que em parte também eram muçulmana.
Capa: USP
Bibliografia:
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