A vingança de Atahualpa
A aldeia de Tambogrande dormia em leito de ouro. Havia ouro debaixo das casas, e ninguém sabia.
Por Eduardo Galeano
A boa-nova chegou junto com a ordem de despejo. O governo peruano tinha vendido a aldeia inteira para a empresa Manhattan Minerals Corporation.
Agora, vocês todos serão milionários, disseram a eles. Mas ninguém obedeceu.
No ano de 2002, num plebiscito do qual ninguém podia duvidar, os habitantes de Tambogrande decidiram continuar vivendo dos abacates, das mangas, das limas e das outras frutas da terra que tanto trabalho tinha dado conquistar do deserto.
Eles sabem muito bem que o ouro enlouquece as pessoas e amaldiçoa os lugares onde aparece e que não são água benta os resíduos que as mineradoras jogam nos rios.
E talvez também saibam que que a fome de ouro cresce enquanto se come ouro.
Em 1533, o conquistador Francisco Pizzarro mandou estrangular Atahualpa, rei do Peru, embora Atahualpa já tivesse entregado todo o ouro que ele exigia.
Eduardo Galeano – Escritor, em Os Filhos dos Dias. Editora L&PM, 2012. Foto: Getty Images via BBC.
Atahualpa, o último imperador do Império Inca, é uma figura histórica cercada de mistério e tragédia.
Sua captura e execução pelas mãos dos conquistadores espanhóis em 1533 marcaram o fim de uma das civilizações mais poderosas da América do Sul.
No entanto, a lenda da “Vingança de Atahualpa” mantém viva a memória de um líder que, mesmo em sua derrota, deixou um legado de resistência.
A história começa com a chegada dos espanhóis ao território inca. Liderados por Francisco Pizarro, os conquistadores rapidamente perceberam a riqueza e a complexidade do império.
Atahualpa, que acabara de sair vitorioso de uma guerra civil contra seu irmão Huascar, subestimou o poder dos estrangeiros e foi capturado durante o encontro em Cajamarca.
Em troca de sua liberdade, Atahualpa ofereceu um resgate em ouro e prata, suficiente para encher uma sala até o teto. Os espanhóis aceitaram o resgate, mas, traindo sua promessa, condenaram Atahualpa à morte.
A execução de Atahualpa marcou o início do fim do Império Inca, mas também deu origem à lenda de sua vingança.
Segundo a tradição oral, Atahualpa amaldiçoou os espanhóis antes de sua morte, prometendo que seu império jamais seria totalmente subjugado e que a terra inca iria se vingar dos invasores.
De fato, após a execução, os conquistadores enfrentaram resistência feroz das populações locais, e muitos sofreram nas mãos de doenças, revoltas e do próprio terreno inóspito dos Andes.
A vingança de Atahualpa, no entanto, vai além da resistência física. Ela se manifesta na preservação da cultura e da identidade dos povos andinos, que resistiram à assimilação e mantiveram vivas suas tradições.
Hoje, a língua quéchua, a música, as danças e os rituais incas continuam a ser praticados, representando um ato contínuo de resistência cultural contra a colonização.
Além disso, o ressurgimento do interesse pelas culturas indígenas e o reconhecimento dos direitos dos povos originários podem ser vistos como uma realização tardia da profecia de Atahualpa.
A “Vingança de Atahualpa” não é apenas uma lenda de punição contra os invasores, mas um símbolo da resistência e da resiliência de um povo que, apesar das adversidades, nunca abandonou sua identidade.
Ela nos lembra que a história dos vencidos muitas vezes perdura de maneiras inesperadas, através da cultura, da memória e da luta contínua por reconhecimento e justiça.